Quais são as diferenças entre as vilas operárias e os conjuntos habitacionais

Durante a República Velha, de princípios liberais, o Estado não interviu de maneira direta na questão da habitação operária, esta postura também foi mantida em várias outras questões. Havia sim, um discurso recheado de ideias abstratas, no entanto, planos efetivos para resolver os problemas não foram elaborados ou adotados. Deixou-se espaço para que a iniciativa privada atuasse neste campo, construindo, alugando e gerenciado as casas da maneira que julgasse conveniente (os alugueis eram excessivos, a qualidade era muito baixa, faltava moradia). Ou seja, o Estado permitiu que fosse utilizado o capital privado para resolver um problema social, e nestas circunstâncias o lucro era a grande motivação .

Dentre as diversas formas de morar, os cortiços eram as que mais preocupavam as autoridades da época. Por serem densamente povoados, serem úmidos (eram construídos em terrenos baratos, e muitas vezes alagadiços), serem pouco iluminados (muitos não tinham janelas) e sujos (as latrinas, de uso comum, eram construídas sobre fossas rasas e mal cheirosas), foram considerados locais propícios à proliferação de doenças e epidemias, e rapidamente se tornaram um problema na cidade, pois poderiam por em risco a saúde do restante da população. As elites não os queriam por perto.

Para tentar reverter estes problemas, ainda no final do século XIX, houve um movimento, do qual participaram médicos, higienistas e engenheiros, para que fossem criados serviços sanitários e leis, nos mesmos moldes existentes na Europa. Mesmo predominando os princípios liberais, o Estado foi induzido a atuar de maneira mais forte nas questões relativas à habitação proletária.

Atuação dos Serviços Sanitários

Em São Paulo foi criada a Diretoria de Higiene, que possuía laboratórios, hospitais e desinfectório; sua atuação efetiva se dava através das delegacias sanitárias, onde eram lotados inspetores, fiscais, desinfectores, delegados e policiais sanitários. Esta diretoria possuía, entre outras atribuições, as seguintes: estudar as questões relativas à saúde pública do Estado; realizar o saneamento de localidades e habitações; se incumbir da polícia sanitária, que, de maneira direta ou indireta, poderia influir na saúde de cidades, vilas ou povoações. Cabia aos delegados de higiene realizar inspeções nos prédios da cidade, e caso julgassem necessário, indicar modificações ou interdições nas edificações consideradas insalubridades, portanto sem condições de habitabilidade.

Com todo o aparato e poder que os agentes sanitários tinham na época, e no intuito de não deixar que surtos epidêmicos se propagassem em toda a cidade, as casas eram invadidas, os morados, tivessem eles doentes ou não, eram removidos, móveis e demais objetos eram desinfetados. Também, nos casos mais extremos, casebres foram demolidos e queimados .

Ao condenar o cortiço como forma de moradia, e associá-lo à imagem de degradação e ameaça pública, tornou-se necessário apresentar a moradia ideal, para a parcela mais pobre da sociedade. Médicos, higienistas e engenheiros sugeriram casas “planejadas e higiênicas” que deveriam ser adotadas como forma de habitação .

Neste contexto, em 1893, foi constituída uma comissão que deveria inspecionar as habitações operárias e os cortiços existentes na região da Santa Ifigênia . Evitar a proliferação de uma epidemia na cidade, uma vez que aquela região era densamente povoada e as habitações (muitas delas irregulares) não possuíam condições de higiene, foi a justificativa dada pelo diretor do Setor de Saneamento do Estado, engenheiro Theodoro Sampaio, para tal empreitada. No relatório final da comissão, além de serem relatadas as condições encontradas naquelas habitações, foram apresentadas medidas a serem tomadas para solucionar os problemas detectados.

No relatório também foram sugeridas habitações e vilas operárias que deveriam ser adotadas a partir de então. Foram propostas três soluções para serem adotadas em novas moradias operárias : a primeira delas era a mais simples de todas e, conforme sugerido, poderia ser adotada nas áreas centrais da cidade, uma vez que era um “cortiço urbano”; a segunda solução apresentada foi considerada a “mais elevada”, por ser composta de casas com 1 e 2 pavimentos (com grande quantidade de cômodos), e por adotar padrão de qualidade melhor, eram as mais caras (deviam ser destinadas aos operários mais qualificados e com melhores salários); e a última opção, por ser considerada a mais higiênica, era para ser adotada em vilas operárias, afastadas da região central.

O “cortiço urbano” era configurado da seguinte maneira: uma única edificação com 6 unidades habitacionais unifamiliares, cada uma delas com: sala, quarto, cozinha, banheiro e área individual.

As casas apresentadas para as vilas operárias também eram residências unifamiliares, porém, isoladas, possuíam área coberta de 54 m2 e área livre para dependências, com pelo menos, 27 m2; eram compostas por: sala, sala de jantar (varanda), 2 quartos, cozinha e banheiro. No descritivo do projeto havia uma indicação de que esta habitação alojaria “folgadamente” 6 pessoas.

No relatório havia uma sugestão de que as vilas operárias fossem construídas num raio de 10 a 15 km ao redor da cidade, para tanto o Estado deveria investir nos meios de transporte existentes, ou seja, aumentar o número de linhas de trem, desvios e horários, de modo a garantir transporte dos habitantes e o abastecimento regular das vilas.

O primeiro tipo de moradia proposto, denominado “cortiço urbano”, correspondia às expectativas do que seria a “casinha mínima”, almejada pela produção rentista, e com poucas adaptações, a planta sugerida pela comissão, foi amplamente adotada no início do século XX, nas vilas operárias construídas em São Paulo. No entanto, a solução que efetivamente foi proposta para as vilas operárias, não chegou a ser adotada pela produção rentista, a explicação seria um retorno financeiro menor do que se estava acostumado, pois a implantação indicada não permitia um bom aproveitamento dos materiais que seriam utilizados, e do terreno (as casas eram totalmente isoladas) .

Legislação

Foram aprovadas diversas leis com teor sanitário, algumas delas com caráter autoritário e até mesmo arbitrário. Como a quantidade de documentos elaborados no período foi grande, para facilitar a compreensão, neste trabalho foram separadas apenas algumas, as mais relevantes, e, então, estas foram divididas em três grupos: proibição aos cortiços, incentivos à construção de moradias operárias e características das moradias.

A proibição de construção de cortiços, assim como a determinação de que os existentes fossem removidos (tal responsabilidade era de cada munícipio do estado) fazia parte do escopo do Código Sanitário do Estado de São Paulo, de 1894. Como era de responsabilidade municipal, diversas leis foram aprovadas tanto para coibir a construção de novos cortiços, quanto para legalizar o fechamento e remoção daqueles existentes.

Sendo o tipo de construção mais barata, com alto grau de adensamento populacional, o cortiço era a moradia que possuía os menores alugueis. Os trabalhadores recebiam salários muito baixos, o que inviabilizava grandes gastos mensais, e no intuito de reduzir ao máximo seu custo de reprodução, moravam em qualquer lugar, e para muitos deles o cômodo alugado (cortiço) era considerado a forma mais adequada de moradia .

Por este motivo, tais edificações eram essenciais na cidade para a “reprodução da força de trabalho a baixos custos”, e não poderiam ser extintos na razão indicada pelas leis, ou boa parte da população de trabalhadores ficaria desabrigada .

Estava institucionalizado um embate entre a realidade do proletariado e o anseio de resolver um problema, sem que estratégias ou ações efetivas fossem criadas com este intuito, apenas através da legislação.

O outro grupo de leis a ser discutido, diz respeito aos incentivos à construção de moradias operárias. Como o poder pública buscava atrair o capital para a construção de casas operárias, no geral, concediam áreas e isentavam impostos, taxas e pagamentos de emolumentos, desde que as casas fossem construídas em determinadas localidades (afastadas do área central da cidade) e de acordo com os padrões e códigos vigentes. Em contrapartida o aluguel deveria ser “modesto”, e caso houvesse interesse do inquilino, a aquisição do imóvel deveria ser facilitada.

Dentre todas estas de leis de incentivo, neste trabalho, é dada atenção maior a duas: no. 315, de 1897, no. 498, de 1900. A primeira delas por apresentar, detalhadamente, uma proposta de vila operária e, a segunda, por ter sido uma lei criada com prescrições específicas para garantir condições mínimas de higiene nas casas operárias .

A lei no. 315 autorizava a contração de Guilherme M. Rudge a construir duas mil casas, de quatro tipos, com o intuito de formar vilas operárias. Para tanto, haveria uma concessão de área de 500.000 m², isenção de impostos e taxas; o governo se comprometia à construir as derivações necessárias para água e esgoto, além de interceder junto à companhia de trens e bondes, para conseguir passagens mais baratas para os moradores. Mesmo com todas as regalias oferecidas, estas casas nunca foram construídas, pois no ano seguinte, a parte da lei que concedia os terrenos municipais foi revogada, deixando de ser atrativa para o empresário .

Dos quatro tipos de casas, citados na lei, três deles seriam destinados à moradia; o outro tipo não era para o uso do proletariado, mas sim para comércio, farmácia ou médicos, não podendo exceder 10 % do total das edificações.

Quanto às moradias, deveriam seguir as seguintes indicações: para o primeiro tipo, área mínima de 30 m2, com três cômodos (um deles seria a cozinha), área cimentada e latrina; para o segundo tipo, área mínima de 37,5 m2, com quatro cômodos (dois quartos, sala e cozinha), área cimentada e latrina; e para o terceiro tipo, área mínima de 45 m2, com cinco cômodos (três quartos, sala e cozinha), área cimentada e latrina.

É interessante observar que, para o primeiro tipo de casas, o único cômodo que tinha um destino especificado era a cozinha, ou seja, os dois outros deveriam ser utilizados como dormitórios. A diferença entre os três tipos de moradias era a quantidade de quartos, as vilas teriam habitações que poderiam comportar famílias de diferentes tamanhos ou necessidades. Percebe-se que a área mínima especificada, para cada um dos quartos, era de 7,5 m2, e a área útil de cada unidade habitacional era muito pequena.

Embora o foco principal da lei no. 498 tenha sido apresentar prescrições higiênicas para a casa operária, também oferecia incentivos diretos para a construção daquelas edificações que estivessem em conformidade com a legislação, ficando isentas dos impostos municipais. Tal benefício também seria concedido às empresas que fossem constituídas para tal finalidade.

Esta lei, se analisada no tocante ao seu objetivo maior, era rígida por definir regras e medidas exatas para a casa operária, mas, ao analisá-la no todo, era um tanto permissiva, uma vez que possuía um artigo que desobrigava o empreendedor a apresentar a planta do projeto para a obtenção da licença de construção. Bastava protocolar um requerimento com a localização da construção, o número e dimensões dos compartimentos da casa, com o uso previsto de cada um deles. Depois que a obra estivesse terminada, a casa só poderia ser habitada após uma vistoria, sua aprovação ficava sujeita à fiscalização.

Este artigo pode ter sido incluído na lei apenas para simplificar o processo de aprovação dos projetos, uma vez que as casas costumavam ser padronizadas, além disso, com esta medida, havia uma redução de custos e aumento da margem de lucro do empreendedor .

Mas, este tipo de regra, muitas vezes, leva a relações viciosas, afinal não há uma planta da casa junto ao processo de aprovação, para eventuais conferências, há apenas a narração das duas partes envolvidas: empreendedor e fiscal.

Também foi permissiva ao reduzir o ao pé direito das habitações operárias para três metros . Esta redução é uma medida que contrariava a Código Sanitário em vigor, com ela, mais uma vez, os construtores eram favorecidos, pois o custo das construções das moradias operárias foi diminuído.

No tocante às especificações das edificações destinadas a qualquer tipo de moradia, muitas leis foram aprovadas naquele período. As características e exigências mínimas exclusivas para a moradia operária estavam presentes desde a publicação dos primeiros padrões municipais em 1886, (Código de Posturas do Município de São Paulo e o Padrão Municipal - com vigência a partir de 1889, respectivamente). Estes documentos apresentavam exigências diferentes para as habitações proletárias, em um capítulo específico: “Cortiços, Casas de Operários e Cubículos”.

Nas diversas leis publicadas na cidade de São Paulo, as exigências para a moradia operária interviam no desenho e nas características internas da habitação, como, por exemplo, necessidade de iluminação e ventilação naturais, áreas mínimas e recuo frontal. Tais itens não faziam parte das recomendações para as construções, ou reconstruções, das demais habitações. E, normalmente, os requisitos mínimos (áreas dos cômodos, número de cômodos, altura das edificações, entre outros), para as casas operárias, eram inferiores aos prescritos às outras habitações; estes requisitos contribuíram para que as condições da casa operária fossem mais precárias do que as encontradas nas demais.

Novamente, as restrições, destinadas às classes operárias, foram elaboradas na tentativa de evitar epidemias e propagação de doenças, que eram comuns na época, mas tratavam estas questões de forma paternalista, e até mesmo preconceituosa . Embora parte dessas exigências fosse inovadora, positiva e benéfica , quanto à qualidade de vida dos moradores, outra parte contribuiu para a diferenciação das casas por classe social. Faz-se tal afirmação uma vez que, de acordo com o uso da habitação, eram explicitados: a especificação de diferentes materiais, os tipos de acabamento, o desenho e a configuração.

A lei municipal no. 498 (1900), já citada, foi a primeira a tratar apenas da casa operária, no seu escopo apresentava um programa, contendo regras específicas a serem adotados. Entre outros, para as casas, eram definidos: no mínimo três compartimentos (contando com a cozinha); 10 m2 como área mínima para cada um dos compartimentos ; necessidade de porta ou janela, em todos os compartimentos, com abertura para o exterior; existência de uma latrina em cada casa; poderiam ser construídas em conjunto, ou seja, sem recuo lateral. Estes tipos de moradia só poderiam ser edificadas fora do perímetro urbano, estabelecido no escopo desta lei. Na verdade, esta determinação não era uma novidade, o Código Sanitário (1894) já apresentava a indicação de que vilas operárias só poderiam ser construídas em áreas periféricas. Esta foi mais uma tentativa de afastar a população mais pobre dos locais de moradia das elites, sempre com o discurso de salvaguardar a saúde de toda a população.

O termo “casa operária” foi substituído por “casa popular”, no Código de Obras Arthur Saboya (1929), esta substituição não significou uma alteração na postura adotada até então, o mesmo programa era reapresentado, só que em novo formato. A saber, este código perdurou por décadas.

No âmbito estadual, os três Códigos Sanitários do Estado de São Paulo, que estiveram em vigência ao longo do período, datam de: 1894, 1911 e 1918.

O Código Sanitário de 1894 foi muito importante, seja por ter sido o primeiro documento estadual que trazia preceitos básicos e procedimentos a serem adotados em diversos tipos de estabelecimentos e locais, públicos ou não (habitações, diversos tipos de comércio, hospitais, cemitérios, sanitários públicos e lavanderias públicas, entre outros); seja por definir o padrão e as características das construções no estado de São Paulo. Foi o mais completo deles, tendo sido inspirado na legislação francesa, foi resultado da atuação dos médicos e higienistas que trabalhavam junto ao Estado. Seu texto era destinado aos fiscais e técnicos, para subsidiar aprovações e fiscalizações de antigas edificações que necessitavam se adequar aos preceitos higiênicos, em voga naquela época .

Em 1911 e em 1917 o Serviço Sanitário do Estado de São Paulo foi reorganizado, e uma das consequências foi a revisão do Código Sanitário, por duas vezes. A atualização de 1911 apresentou modificações significativas em relação à versão anterior, no tocante às exigências de insolação e em questões higiênicas que visavam evitar umidades no interior das habitações. A versão do Código Sanitário, de 1918, trouxe inovações importantes relativas às novas características e necessidades daquela sociedade que surgira, numa São Paulo cada vez maior e mais “moderna”, passando a tratar de toda a sorte de programas de necessidades, vigorou até o final dos anos 40.

Sobre as Vilas - Os Resultados

Na primeira fase do capitalismo industrial, perdurou um grande conflito entre as empresas, que buscavam acumular capital, e os trabalhadores, que tentavam sobreviver com seus parcos ganhos. As empresas perceberam que, ao fornecer moradia para os trabalhadores, poderiam reduzir o preço da força de trabalho, aumentar a possibilidade de acumulação de capital e manter seus funcionários no emprego, a partir daí passaram a ser construídas as vilas operárias .

Os operários que moravam nas casas alugadas das fábricas, tinham seu problema de moradia resolvido, mas ficavam sujeitos a certas imposições da empresa. Como a disponibilidade de mão-de-obra era grande, devido à quantidade de imigrantes em São Paulo, era muito fácil demitir um trabalhador e colocar outro em seu lugar; a casa deveria ser prontamente devolvida .

No início, era muito difícil identificar, ou classificar, uma moradia e, para o poder público, a classificação era dependente da classe social do morador e de quem a gerenciava. Casinhas habitadas por trabalhadores pobres podiam ser classificadas como cortiços, pelos higienistas; porém se as mesmas soluções tipológicas fossem adotadas por empresas, para abrigar seus funcionários, passavam a ser o compreendidas como uma vila operária .

Esta confusão de classificação dos tipos de moradia se deu, também, quando os empresários começaram a ocupar áreas ociosas na parte interior de quarteirões, para a construção de conjuntos de cortiços (na época denominados casas operárias, por possuírem três ou quatro cômodos). Estes conjuntos eram conhecidos por vilas, e quando construídos por industriais (com o intuito de manter os empregados próximos às fábricas) foram chamados de vilas operárias .

Percebe-se que, na prática, nem sempre as vilas operárias representaram as premissas de uma moradia higiênica, que era o anseio de então. As posturas de caráter higienista foram transformadas em leis, mas isso não era, e na verdade nunca foi, garantia de que as normas fossem adotadas, obedecidas ou respeitadas. As habitações operárias, segregadas à periferia da cidade, longe da vista das elites foram, muitas vezes, construídas à revelia das normas, o empreendedor tinha como objetivo a maior rentabilidade possível em seu negócio.

Na primeira década do século XX, as vilas operárias já eram uma realidade na cidade, algumas delas com poucas casas, apenas para o operariado mais qualificado; outras foram construídas com diferentes tipos de habitação, algumas casas destinadas aos operários mais qualificados e as outras casas aos técnicos e engenheiros da empresa.

No geral, estas vilas foram obras de corpo técnico qualificado: engenheiros civis, engenheiros-arquitetos e mestres de obras, porém, nem sempre, estes profissionais eram identificados no projeto. Na construção das vilas percebe-se uma intenção de modularidade, além de terem sido realizadas as primeiras experiências de produção em série; foram utilizados sistemas estruturais e materiais de construção novos para a época, e as ornamentações, praticamente, foram abandonadas. No entanto, há relatos de que, dependendo da empresa, muitas das casas não eram sequer rebocadas, forradas ou assoalhadas .

Na cidade de São Paulo, algumas destas vilas resistiram ao longo do tempo, mas foram completamente descaracterizadas. Reformas internas e externas, mudando a disposição de cômodos ou incluindo outros, com a adoção de novos materiais, principalmente no acabamento das fachadas, tornaram difícil a localização ou identificação das mesmas.

No presente trabalho são mostradas duas vilas (Vila Boyes e Vila Cerealina), ambas construídas nos anos 20, do século passado.

Com o passar do tempo, as vilas operárias deixaram de ser atrativas e foram gradualmente abandonadas pela produção rentista. Um dos motivos foi a sanção da lei do inquilinato, que modificou as relações entre proprietário e inquilino, no caso, patrão e empregado; o inquilino passou a ter direito de permanecer em sua casa, mesmo se estivesse desempregado.

BLAY, Eva Alterman. Eu não tenho onde morar: vilas operárias na cidade de São Paulo. São Paulo: Nobel, 1985, p. 88.

BONDUKI, Nabil. Origens da habitação social no Brasil: arquitetura moderna, lei do inquilinato e difusão da casa própria. 4ª. ed. São Paulo: Estação Liberdade, 2004. p. 31.

CARPINTÉRO, Marisa Varanda Teixeira. A construção de um sonho: os engenheiros-arquitetos e a formulação política habitacional no Brasil (São Paulo – 1917/1940). Campinas: Editora da UNICAMP, 1997. p. 60.

CORDEIRO, Simone Lucena (Org.). Os cortiços de Santa Ifigênia: sanitarismo e urbanização. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo / Arquivo Público do Estado de São Paulo, 2010, p. 11-13.

Todas as informações foram obtidas no fac-sílime do “Relatorio da Commissão de exame e inspecção das habitações operarias e cortiços no districto de Sta. Ephigenia”. (CORDEIRO, op. cit., p. 91-116.)

BONDUKI, op. cit., p. 58-59.

PEREIRA, Paulo César Xavier. Espaço, Técnica e Construção – A apropriação e produção do espaço: as implicações no desenvolvimento técnico da indústria da construção. O caso da produção de moradias na cidade de São Paulo. São Paulo: Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas – USP, 1984, p. 147.

BONDUKI, op. cit., p. 39.

Ainda no século XIX, as casas operárias possuíam, pelo menos três cômodos (sala, quarto e cozinha, sendo que a latrina ficava no quintal) e, devido a legislação, receberam incentivos para a sua construção. Para receber os incentivos, qualquer pessoa solicitava à Prefeitura licença para construir uma casa operária (que nada mais era do que uma pequena casa) para, em seguida alugá-la. O termo hoje corresponde à casa popular. (LEMOS, 1989, op. cit., p. 59-60.)

CAMPOS, Eudes. Casas e vilas operárias paulistanas. Informativo Arquivo Histórico Municipal, 4 (19): jul/ago.2008.

Desde 1893 (lei no. 38), na cidade de São Paulo, para a aprovação de qualquer construção era necessário anexar uma planta da edificação ao processo.

CAMPOS, op. cit.

A diminuição da altura dos pés direito, em habitações, foi gradual na cidade de São Paulo. Ao analisar a legislação, é possível traçar um histórico a respeito destas restrições. Em 1894 (Código Sanitário), cada pavimento deveria ter, pelo menos, 4 m de altura, nas habitações, com até três pavimentos; a partir do quarto pavimento a altura dos andares poderia ser reduzida, mas deveria ser preservada a cubagem mínima de 14 m3 para cada habitante. Em 1900 (lei no. 498), a altura mínima dos pavimentos diminuiu para 3 m, apenas para as habitações operárias. Em 1911 (Código Sanitário), a altura mínima dos pés direitos, passou a ser 3,75 m, para qualquer aposento das habitações em geral. Em 1916 (ato no. 849) passaram a ser aceitos pés direitos mínimos de 3 m, nos “puxados”, desde que fossem construídos de forma independente dos pavimentos, recuados dos alinhamentos, e destinados apenas para cozinhas, despensas, latrinas ou banheiros. 1918 (Código Sanitário) passou-se a aceitar pés direitos mínimos de 3 m, para todos os aposentos de qualquer tipo de habitação. Em 1920 (Padrão Municipal), para os compartimentos de dormir foram mantidos os 3 m de pé direito, mas, para os compartimentos de permanência diurna os pés direitos mínimos foram reduzidos para 2,5 m, tais valores foram reiterados no Código de Obras Arthur Saboya.

“Esta minimização espacial tem suas origens em posturas legais, relacionando-as a uma classificação ‘oficial’ que se atribui a essas habitações populares. O termo ‘casas operárias’ participava do corpo de definições do código de obras da cidade de São Paulo até os anos 1960, enquanto vigoraram as atualizações do Código de Obras Arthur Saboya, de 1929.” (SEGAWA, Hugo. Prelúdio da metrópole: Arquitetura e urbanismo em São Paulo na passagem do século XIX ao XX. 2a. ed. São Paulo: Ateliê Editorial, 2004, p. 160)

“O Código de 1886, talvez por causa das preocupações dos técnicos da Câmara, estabelece regras não extensíveis à classe média. As casas operárias são tratadas separada e diferentemente, digamos com mais atenção, com mais pormenores, dando impressão de que a classe média ‘urbana’ não necessitasse de orientação ou atenção porque sabia agir sozinha.” (LEMOS, Carlos A. C. A república ensina a morar (melhor). São Paulo: Hucitec, 1999, p. 21.)

Várias recomendações são, hoje, consideradas benéficas, Lemos cita como exemplos: a necessidade de recuo frontal e aberturas para o exterior em todos os cômodos (para as elites ainda era permitido casa com alcovas). (LEMOS, 1999, op. cit., p. 21.)

Em 1916 (ato no. 849), estas indicações foram estendidas para todas as habitações, com as seguintes adaptações: 10 m2, apenas para as salas, os escritórios e os dormitórios; para as cozinhas, as copas, os banheiros ou as latrinas as áreas poderiam ser menores, mas nunca inferiores a 2,00 x 2,60 m.

LEMOS, 1999, op. cit., p.30.

BLAY, op. cit., p. 53.

Idem, op. cit., p. 98. A mesma autora conclui: “No conjunto da problemática da habitação operária, as vilas operárias foram entendidas como uma forma de isolar o operariado, desligando-o de suas lutas de classe.” (p. 150)

BONDUKI, op. cit., p. 25.

LEMOS, Carlos A. C. História da casa brasileira: A casa colonial, casas urbanas e rurais, a habitação burguesa. São Paulo: Contexto, 1989. p. 60.

BENCLOWICZ, Carla Milano. Prelúdio modernista: construindo a habitação operária em São Paulo. São Paulo: Faculdade de Arquitetura e Urbanismo – USP, 1989, p. 267-285.

Quais as diferença entre as vilas operárias e os conjuntos habitacionais?

Outra diferença importante é que os conjuntos habitacionais são construídos atualmente em regiões cada vez mais distantes dos grandes centros urbanos, sendo as vilas operárias, em comparação, mais próximas das área da cidade que concentravam e que ainda concentram empregos.

O que é uma vila operária?

A vila operária consiste em um conjunto de moradias criado por empresas e indústrias para alojar seus trabalhadores.

O que é um conjunto habitacional?

Entende-se como conjunto habitacional o empreendimento em que o parcelamento do imóvel urbano, com ou sem abertura de ruas, é feito para alienação de unidades habitacionais já edificadas pelo próprio empreendedor, conforme definição do Provimento 37/2013, da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo.

Como eram as moradias na Vila Operária?

As casas operárias foram construídas uma ao lado da outra; eram casas iguais, geminadas, ocupando o quarteirão inteiro e aproveitando os terrenos da fábrica. Prédios de mais de dois andares não existiam na vila.