Quais são os 3 tipos de substratos energéticos que mantém as células ativas em repouso e movimento?

Os glicídios ou carboidratos são as biomoléculas orgânicas mais abundantes na natureza, encontrando-se principalmente na forma de polissacarídeos, como o amido e a celulose nas plantas e o glicogênio, nos animais. Os glicídios constituem uma importante fonte energética para os animais, além de fazer parte da estrutura da parede das células vegetais e bacterianas.

Estruturalmente os glicídios são poli-hidroxialdeídos ou poli-hidroxicetonas e o nome de carboidratos se deve ao conceito originado de sua fórmula empírica, Cn(H2O)n, a partir da qual foram classificados inicialmente como hidratos de carbono, embora existam glicídios que não obedecem bem a esta fórmula, assim como outros que contêm elementos diferentes de C, H e O (por exemplo N, S, P). Dependendo do número de subunidades contidas na sua estrutura, os glicídios se classificam em:

  •  Monossacarídeos ou açúcares simples, como a glicose ou a frutose
  •  Oligossacarídeos, que contém umas poucas subunidades de monossacarídeos unidas entre si mediante ligações glicosídicas; dentre os mais abundantes estão os dissacarídeos, que contém duas subunidades de monossacarídeos, como a sacarose e a lactose; os oligossacarídeos, com mais de 3 subunidades costumam estar associados a outras biomoléculas, especialmente com lipídios, formando glicolipídios e com proteínas, formando glicoproteínas
  •  Polissacarídeos, que contém centenas de monossacarídeos unidos por ligações glicosídicas, podendo ser lineares como a celulose ou ramificados como o amido e o glicogênio.

Metabolismo dos glicídios

Os glicídios, especialmente a glicose, são os principais combustíveis utilizados pelo organismo para realizar os diferentes trabalhos biológicos. A forma de extrair energia da glicose é através de sua oxidação em várias etapas. A energia livre que 1 mol de glicose gera a partir de sua completa oxidação até CO2 e H2O é de 2.840 kJ. A glicose deve estar sempre disponível para todas as células e por isso se encontra solúvel no sangue mantendo níveis dentro de intervalos sempre estáveis, que variam conforme a espécie. Dentro de cada espécie ocorrem variações da glicemia principalmente em função da dieta, da idade e das condições fisiológicas.

Níveis de glicose sanguínea em várias espécies

Espécie Glicemia (mg/dL)
Bovinos 45-75
Equinos 75-115
Ovinos 50-80
Caprinos 50-75
Suínos 85-150
Caninos 65-118
Felinos 70-110

Os glicídios não somente servem como fontes de energia para a célula; também funcionam como precursores de metabólitos intermediários essenciais, tais como aminoácidos, nucleotídeos e coenzimas. Alguns compostos derivados dos monossacarídeos que têm importância metabólica são os seguintes:

  •  Derivados aminoglicosídicos que fazem parte de oligossacarídeos de membranas
  •  Derivados ácidos no C1 (ácidos aldônicos) ou no C6 (ácidos urônicos), compostos úteis na detoxificação de moléculas exógenas e na metabolização de substâncias endógenas, graças a suas propriedades de solubilização no sangue, o que facilita a excreção renal
  •  Derivados fosfatados; a presença destes grupos fosfato, que se encontram dissociados e, portanto, com carga negativa, impedem a passagem da molécula através das membranas plasmáticas
  •  Ácido siálico, derivado ácido da N‑acetilmanosamina, importante monossacarídeo de 9 carbonos que faz parte de glicoproteínas e de glicolipídios.

Glicogênio

O glicogênio é um homopolissacarídeo composto por centenas de unidades de glicose, servindo como o principal reservatório deste monossacarídeo. A glicose se armazena na forma de glicogênio, principalmente no fígado e no músculo. Os animais monogástricos têm maiores quantidades de glicogênio hepático do que os ruminantes; por exemplo, o glicogênio no cão pode ser 6-8% do peso do fígado, enquanto que na vaca o valor é de 1-3%. O fígado dos animais jovens contém mais glicogênio que o dos adultos; por exemplo, o leitão recém-nascido tem 15% e o porco adulto 4%. O glicogênio é mais abundante no fígado, onde pode ser armazenado em até 8% do peso do órgão e no músculo esquelético, onde chega a 1% do peso da massa muscular. Devido a sua estrutura, o glicogênio está organizado em forma helicoidal. Esta forma de armazenagem da glicose nas células evita grandes mudanças na osmolaridade intracelular, que aconteceriam caso a glicose estivesse livre e não como glicogênio em forma insolúvel dentro dos grânulos citoplasmáticos.

O glicogênio pode ser degradado enzimaticamente para a obtenção de glicose, no processo conhecido como glicogenólise, para que a glicose possa entrar nas rotas oxidativas visando a obtenção direta de energia. A glicogenólise possui controle endócrino, no qual intervêm as enzimas glicogênio-fosforilase, a1,6-glicosidase e fosfoglicomutase. A enzima glicogênio-fosforilase catalisa a seguinte reação:

(glicose)n + Pi –> (glicose)n-1 + glicose-1-fosfato

Nesta reação ocorre quebra da união glicosídica com introdução de uma molécula de fosfato sem intervenção de ATP (fosforólise). A fosforilase atua no glicogênio sobre os extremos não redutores das unidades de glicose rompendo as ligações alfa1-4 até encontrar pontos de ramificação com ligações alfa1-6 onde a enzima não pode atuar. Dessa forma, os produtos finais da ação da fosforilase são unidades de glicose-1-fosfato mais frações de dextrina limite. Sobre as frações de dextrina limite atua a enzima alfa1,6-glicosidase ou enzima desramificante, a qual rompe as ligações glicosídicas alfa1-6. A glicose-1-fosfato liberada pela ação da fosforilase não pode entrar no metabolismo ainda devendo antes ser transformada em glicose-6-fosfato por ação da enzima fosfoglicomutase.

A fosforilase é uma enzima alostérica ou regulatória que aparece em duas formas: uma ativa chamada fosforilase a que possui 4 subunidades idênticas unidas e fosforiladas nos resíduos de serina (peso molecular 380 kd) e outra inativa chamada fosforilase b, separada em 2 pares de subunidades defosforiladas. A fosforilase como enzima alostérica tem metabólitos reguladores que a fosforilam (ativam) ou a defosforilam (inativam). Estas ações são realizadas por duas enzimas diferentes: a fosforilase-quinase (fosforila) e a fosforilase-fosfatase (defosforila). Por sua vez, a enzima ativadora fosforilase-quinase é regulada pela adrenalina, hormônio da medula adrenal e pelo glucagon, hormônio do pâncreas. Esses hormônios atuam sobre o fígado e o músculo, órgãos onde se encontra armazenado o glicogênio. Por outro lado, a insulina estimula a ação da enzima inativadora, a fosforilase-fosfatase, ao mesmo tempo que desestimula a enzima ativadora, a fosforilase-quinase. Portanto, a glicogenólise é estimulada pela adrenalina e o glucagon e é inibida pela insulina. No fígado, o glicogênio constitui a única reserva para manter a glicemia. No músculo, o glicogênio usa-se como reserva energética exclusivamente para a contração muscular. O fígado é o único órgão que pode “exportar” glicose livre para o sangue, já que possui glicose-6-fosfatase, enzima que catalisa a seguinte reação:

glicose-6-fosfato → glicose + Pi

A síntese de glicogênio ou glicogênese é o processo metabólico conducente à formação de glicogênio a partir da glicose excedente. Este processo se realiza no citosol das células de todos os tecidos, embora tenha maior importância nas células do fígado e do tecido muscular esquelético. A glicose que entra na formação de glicogênio como glicose-6-fosfato é convertida em glicose-1-fosfato pela enzima fosfoglicomutase, para posteriormente ser convertida no composto ativo UDP-glicose conforme as seguintes reações:

glicose-6-fosfato → glicose-1-fosfato

UTP (uridina trifosfato) + glicose-1-fosfato → UDP-glicose + PPi

A segunda reação é catalisada pela enzima UDP-glicose pirofosforilase e atua como ponto de controle da glicogênese. A rápida hidrólise que sofre o pirofosfato (PPi) permite a sua desaparição (PPi –> 2Pi) favorecendo a reação para a direita. O substrato para a biossíntese de glicogênio é a UDP-glicose. Os monossacarídeos unidos a uridina-nucleotídeos estão “marcados” para participar em reações de síntese e não de degradação. A UDP-glicose também é intermediária na formação de galactose para a formação de lactose. A UDP-glicose se incorpora ao glicogênio em uma reação catalisada pela enzima glicogênio sintetase:

UDP-glicose + (glicose)n –> (glicose)n+1 + UDP

A glicogênio sintetase é uma enzima alostérica controlada por hormônios, sendo estimulada pela insulina e inibida pelo glucagon. Possui 4 subunidades e tem um peso molecular de 360 kd. Ela não pode realizar uniões alfa1-6 para obter as ramificações do glicogênio. Neste tipo de ligações participa a enzima ramificante. O efeito biológico das ramificações é tornar o glicogênio mais solúvel e aumentar o número de ligações não redutoras, deixando-o mais reativo à ação das enzimas de degradação e de síntese.

A enzima glicogênio sintetase requer de um primer de glicogênio para incorporar a UDP-glicose. A produção desse primer é realizada por uma proteína chamada glicogenina (peso molecular 37 kd) que atua ela própria como se fosse um primer ao qual se une a primeira glicose, atuando simultaneamente como enzima de sua própria reação, ou seja, é substrato e ao mesmo tempo enzima da mesma reação. Depois, a glicogênio sintetase se une à glicogenina para formar um complexo sobre o qual vão se unindo outras glicoses sobre a primeira até ter um número suficiente (>7), momento em que a glicogênio sintetase se libera do complexo.

A síntese e a degradação do glicogênio são processos que estão reciprocamente regulados pela ação hormonal: a insulina estimula a síntese, enquanto que a adrenalina e o glucagon estimulam a degradação. Os hormônios regulam a atividade das enzimas controladoras dos processos mediante modificações covalentes.

A enzima glicogênio sintetase existe em duas formas dependendo de seu estado de fosforilação: a forma ativa defosforilada chamada glicogênio sintetase a e a forma inativa fosforilada chamada glicogênio sintetase b. A fosforilação (inativação) da sintetase é realizada por uma proteína-quinase e a defosforilação (ativação) por uma fosfoproteína-fosfatase. As ações da proteína-quinase e da fosfoproteína-fosfatase são reguladas pela ação hormonal: a insulina atua estimulando a defosforilação da enzima glicogênio sintetase, tornando-a ativa e favorecendo a síntese de glicogênio.

O receptor da insulina é uma proteína-quinase que se autofosforila e que contém duas cadeias alfa idênticas que sobressaem no exterior da membrana plasmática, as quais são o sítio de união da insulina, e duas cadeias beta do lado citosólico da membrana com capacidade fosforilante. A proteína-quinase autofosforilada por ação da insulina fica ativada para fosforilar outras proteínas que vão causar os efeitos intracelulares da insulina, alterando a atividade de uma ou mais enzimas. A degradação do glicogênio é regulada por uma enzima também sensível à ação hormonal, a fosforilase, de forma inversa à regulação que ocorre na enzima glicogênio sintetase. Assim, a fosforilase deve estar fosforilada para estar ativa, isto é, para catalisar a degradação do glicogênio. A fosforilação da fosforilase é realizada por uma proteína-quinase dependente de AMP cíclico (cAMP). O cAMP é produzido a partir de ATP por ação da enzima adenilciclase, presente na membrana plasmática. Esta enzima de membrana é ativada pela interação da adrenalina ou do glucagon com seu respectivo receptor membranal. O cAMP ativa as proteína-quinases para que estas fosforilem a fosforilase-quinase. Esta, por sua vez, fosforila a fosforilase, tornando-a ativa.

Condições metabólicas e hormonais em síntese ou degradação de glicogênio

Evento Síntese Degradação
Estado muscular Repouso Contração
Estado hepático Glicogênese Glicogenólise
Condição metabólica ­↑ ATP; ­ ↑ glicose-6-fosfato ↓ ATP; ↓ glicose-6-fosfato
Efeito hormonal ↓ cAMP; ↓ gliconeogênese ­↑ cAMP; ­ ↑gliconeogênese

Metabolismo da glicose

A importância da glicose no metabolismo está relacionada com as seguintes funções:

  1. É a fonte de energia para todas as células, em especial para o tecido nervoso, os eritrócitos, a medula renal, os testículos e os tecidos embrionários
  2. É a fonte de glicerol-3-fosfato para a biossíntese de triglicerídeos no tecido adiposo
  3. Mantém a adequada concentração dos intermediários do ciclo de Krebs
  4. É a fonte de energia para a contração do músculo esquelético em condições aeróbicas e anaeróbicas
  5. É o precursor da lactose na glândula mamária
  6. É a única fonte de energia para o feto na gestação
  7. É a fonte de ácido ascórbico na maioria dos mamíferos
  8. Atua na metabolização dos produtos finais do metabolismo e dos tóxicos.

Para cumprir parte dessas funções, a glicose pode ser oxidada mediante várias vias possíveis: a rota mais comum é a oxidação via glicólise, para produzir piruvato sob condições aeróbicas ou lactato sob condições anaeróbicas; também pode seguir uma oxidação alternativa via pentoses-fosfato ou via ácido ascórbico. Sob condições de balanço energético positivo, a glicose é armazenada em forma de glicogênio.

Glicólise

A glicólise foi a primeira via metabólica a ser elucidada. Os trabalhos iniciaram-se com Büchner em 1897 com a descoberta da fermentação alcoólica da glicose pelas leveduras e terminaram com a total elucidação da via por Lipmann e Kalckar em 1941. Em alguns tecidos dos mamíferos como eritrócitos, cérebro, medula renal e espermatozoides, a glicose é a única fonte de energia. Outros tecidos podem usar alternativamente outros combustíveis, tais como os corpos cetônicos ou os ácidos graxos. A glicose fornece energia às células através da rota oxidativa da glicólise, constituindo a mais importante via catabólica da glicose.

A glicólise pode ser aeróbica ou anaeróbica, dependendo da disponibilidade de oxigênio nas células. Nos animais superiores ocorre geralmente glicólise aeróbica. Entretanto, existem algumas células nos animais com capacidade para realizar glicólise anaeróbica, como são os eritrócitos, as células do músculo estriado, a retina e o cérebro. A glicólise se realiza no citosol e seu produto final é o piruvato, sob condições aeróbicas, ou o lactato, sob condições anaeróbicas.

Até piruvato, a glicólise aeróbica consta de dez reações. Pode-se considerar que a via está composta por duas fases: (a) fase preparatória, onde a glicose é fosforilada e convertida em seu isômero frutose terminando com a quebra desta molécula para formar duas trioses-fosfato, e (b) fase oxidativa, onde se produz ATP mediante o aproveitamento da energia de oxidação para fosforilar ADP.

Quais são os 3 tipos de substratos energéticos que mantém as células ativas em repouso e movimento?
Fase preparatória da glicólise
Quais são os 3 tipos de substratos energéticos que mantém as células ativas em repouso e movimento?
Fase oxidativa da glicólise

Fosforilação da glicose

Para ingressar em qualquer via metabólica a glicose deve ser fosforilada no interior da célula. A reação é catalisada em todas as células pela enzima hexoquinase e constitui a primeira reação da via da glicólise. O fígado, que recebe via portal a maioria dos substratos absorvidos no intestino, possui um mecanismo especial para poder absorver glicose em grandes quantidades durante o período pós-prandial, mediante a enzima glicoquinase. As enzimas hexoquinase e glicoquinase catalisam a mesma reação:

glicose + ATP –>  glicose-6-fosfato + ADP

As duas enzimas requerem do cátion Mg2+ como cofator. A hexoquinase predomina em todas as células menos nos hepatócitos e tem especificidade relativa, isto é, pode fosforilar qualquer hexose, enquanto que a glicoquinase é exclusiva do fígado e tem como único substrato a glicose. Os ruminantes, que absorvem quantidades mínimas de glicose por via intestinal, não possuem a glicoquinase.

A diferença entre a hexoquinase e a glicoquinase está determinada fundamentalmente por suas características cinéticas: (a) a constante de Michaelis (Km) da hexoquinase é 100 vezes menor do que a Km da glicoquinase (0,1 e 10 mM, respectivamente); (b) a hexoquinase é inibida pelo produto da reação (glicose-6-fosfato), enquanto que a glicoquinase não sofre inibição pelo produto. Estas características fazem com que a hexoquinase não atue em concentrações de glicose superiores a l mM, enquanto a glicoquinase somente é saturada com concentrações de glicose maiores de 12 mM. A concentração média de glicose no sangue periférico está entre 4 a 5 mM; a concentração de glicose no sangue portal em estado pós-prandial pode ser até duas vezes maior. A hexoquinase é uma das enzimas regulatórias da via glicolítica, sendo inibida por seu produto, a glicose-6-fosfato, que atua como modulador negativo.

A partir da glicose-fosfato a rota da glicólise segue a seguinte sequência:

glicose-6-fosfato → frutose-6-fosfato

enzima: fosfoglicose isomerase / cofator: Mg2+

frutose-6-fosfato + ATP → frutose-1,6-difosfato + ADP

enzima: fosfofrutoquinase-1 (alostérica)

(ponto mais importante de controle da rota glicolítica)

frutose-1,6-difosfato –> gliceraldeído-3-fosfato + di-hidroxiacetona-fosfato

enzima: frutose-difosfato aldolase

di-hidroxiacetona-fosfato –> gliceraldeído-3-fosfato

enzima: triose-fosfato isomerase

gliceraldeído-3-fosfato + NAD+ + Pi → 1,3-difosfoglicerato + NADH + H+

enzima: gliceraldeído-3-fosfato desidrogenase

1,3-difosfoglicerato + ADP → 3-fosfoglicerato + ATP

enzima: fosfoglicerato quinase  / cofator: Mg2+

3-fosfoglicerato → 2-fosfoglicerato

enzima: fosfoglicerato mutase / cofator: Mg2+

2-fosfoglicerato → fosfoenolpiruvato (PEP) + H2O

enzima: enolase / cofator: Mg2+ (ou Mn2+)

PEP + ADP → piruvato + ATP

enzima: piruvato quinase / cofatores: K+ e Mg2+ (ou Mn2+)

Até aqui, para cada mol de glicose são produzidos 4 ATP e gastos 2 ATP na primeira fase da glicólise. O balanço energético da glicólise até o piruvato é positivo, pois obtém-se 2 ATP e 2 coenzimas reduzidas (NADH), além de 2 piruvatos, que podem produzir mais energia mediante sua total oxidação no ciclo de Krebs. A reação global da glicólise resume-se assim:

glicose + 2 NAD+ + 2 ADP + 2 Pi → 2 piruvato + 2 NADH + 2 H+ + 2 ATP + 2 H2O

Controle da glicólise

Quando ocorre glicólise anaeróbica, o gasto de glicose é muito maior do que quando ocorre glicólise aeróbica, devido a que na primeira a produção de energia é muito menor (2 ATP) do que na segunda, considerando a oxidação total da glicose até CO2 e H2O (38 ATP). Este fato denomina-se “efeito Pasteur” e ocorre porque o fluxo de glicose para a glicólise está regulado pelos níveis de ATP, que atuam como moduladores sobre a atividade de algumas enzimas alostéricas, especialmente a fosfofrutoquinase-1 (PFK-1) e a piruvato quinase. Produzindo menos ATP, a glicólise anaeróbica “puxa” mais glicose para que ocorra glicólise. A glicose-6-fosfato pode ir para outras vias secundárias de oxidação e a enzima PFK-1 é a que direciona a glicose para a rota glicolítica. A PFK-1 é uma enzima alostérica que é inibida pelo ATP, o qual se une ao sítio alostérico da enzima, diminuindo sua afinidade pela frutose-6-fosfato, seu substrato natural. O ADP e o AMP podem reverter a inibição causada pelo ATP, o que os torna moduladores estimulatórios da PFK-1.

O citrato, primeiro metabólito intermediário do ciclo de Krebs, incrementa o efeito inibitório do ATP sobre a PFK-1, pois sua presença é um sinal de que as necessidades de energia da célula estão cobertas. Contudo, o regulador alostérico mais significativo da PFK-1 é a frutose-2,6-difosfato, metabólito que ativa fortemente à enzima. Este metabólito é produzido pela enzima PFK-2 a partir de frutose-6-fosfato (mesmo substrato da PFK-1). Assim, quando os níveis de frutose-6-fosfato aumentam, a via glicolítica aumenta sua velocidade devido à ação da frutose-2,6-difosfato. Este metabólito também inibe à enzima frutose-1,6-difosfatase, que participa na gliconeogênese, evitando que ocorra este processo biossintético quando está ocorrendo a glicólise. A frutose-2,6-difosfato é defosforilada pela enzima frutose-difosfatase-2 (FBP-2), que está regulada pelo hormônio glucagon via cAMP. Este hormônio estimula a gliconeogênese; portanto, quando diminui o nível de frutose-2,6-difosfato, inibe-se a glicólise e estimula-se a gliconeogênese. A piruvato quinase, segunda enzima regulatória da glicólise, é inibida por altos níveis de ATP em forma alostérica, diminuindo a afinidade da enzima por seu substrato (PEP). Também é inibida por acetil-CoA e por ácidos graxos de cadeia longa, os quais constituem os combustíveis do ciclo de Krebs.

Destino do piruvato

O produto final da glicólise, o piruvato, pode seguir uma das seguintes rotas: (1) em células aeróbicas, sofrer oxidação/descarboxilação nas mitocôndrias para produzir acetil-coenzima A (acetil-CoA), metabólito que posteriormente é oxidado no ciclo de Krebs para produção de ATP; (2) em células sob condições anaeróbicas ou em certas células do organismo, o piruvato sofre redução para produzir lactato, utilizando o NADH produzido na fase oxidativa; esta reação ocorre obrigatoriamente nos eritrócitos, células que embora tenham meio aeróbico, carecem de mitocôndrias; também ocorre eventualmente no músculo esquelético durante o exercício prolongado e em outros tecidos como a retina, ou em condições anormalmente hipóxicas; (3) em certas condições metabólicas, o piruvato pode servir de precursor de outros compostos, como aminoácidos e glicose.

Sob condições aeróbicas, o piruvato se oxida e descarboxila na mitocôndria para dar acetil-CoA, que pode oxidar-se completamente no ciclo de Krebs até CO2 e H2O a fim de produzir energia (ATP). A reação de descarboxilação/oxidação do piruvato é indispensável para que este ciclo ocorra. A enzima que catalisa esta reação é a piruvato desidrogenase, um complexo com peso molecular total de 7.000 kd, composto por 3 enzimas e 5 coenzimas. A reação ocorre em cinco etapas, mas globalmente pode-se escrever assim:

piruvato + NAD+ + CoA → acetil-CoA + NADH + H+ + CO2

A enzima piruvato desidrogenase é alostérica e tem como moduladores positivos o ADP e o Ca2+ e como modulador negativo o ATP. As três enzimas do complexo são: piruvato desidrogenase (E1), di-hidrolipoil transacetilase (E2) e di-hidrolipoil desidrogenase (E3), esta última uma flavoproteína. As cinco coenzimas são: tiamina-pirofosfato (TPP), NAD, FAD, coenzima A (CoA) e lipoil-lisina.

Em condições anaeróbicas ou em células sem mitocôndrias (eritrócitos), o piruvato é reduzido a lactato a fim de gastar o NADH produzido na fase oxidativa, para que a rota não se detenha por acumulação desta coenzima reduzida, que não pode reoxidar-se sob condições anaeróbicas. A reação é a seguinte:

piruvato + NADH + H+ → lactato + NAD+

A enzima que catalisa esta reação, a lactato desidrogenase (LDH), existe em cinco formas isoenzimáticas que têm o mesmo peso molecular e estão formadas por 4 subunidades de 33,5 kd cada uma. As subunidades têm duas formas possíveis: forma H, predominante no músculo cardíaco e forma M, predominante no músculo esquelético. Assim, as 5 isoenzimas podem ser: M4, M3H, M2H2, MH3 ou H4. Cada uma delas está diferenciada pela velocidade de reação e pela Km. As isoenzimas com predominância da forma M têm menor valor de Km e maior velocidade de reação, enquanto que as que têm predominância da forma H têm maior valor de Km e menor velocidade de reação.

Os níveis sanguíneos de LDH podem estar aumentados anormalmente em casos de lesão hepática ou muscular cardíaca. Casos de lesões específicas podem ser identificados mediante a caracterização das formas isoenzimáticas da LDH por eletroforese.

A acumulação de lactato na circulação conduz a uma acidose láctica, quando os níveis são superiores a 5 mM. Níveis normais geralmente não superam 1,2 mM. Isto pode ocorrer em excessivo exercício muscular, em condições de baixa oxigenação por falhas circulatórias ou pulmonares ou na indigestão ácida dos ruminantes. O lactato não pode ser utilizado pelas células sob condições anaeróbicas e, portanto, deve sair para o sangue e ir para o fígado, único órgão capaz de utilizá-lo, seja para oxidá-lo completamente até CO2 e H2O para produção de energia, seja para utilizá-lo como precursor de glicose na rota da gliconeogênese. A glicose nova produzida no fígado pode retornar ao músculo para ser utilizada como combustível. Essa reciclagem do lactato se conhece como o ciclo de Cori.

Via das pentoses-fosfato

A principal rota de oxidação da glicose é a glicólise, mas existem rotas alternativas ou secundárias que produzem metabólitos intermediários necessários para a célula. A via das pentoses-fosfato, também conhecida como rota do fosfogliconato, é uma rota alternativa de oxidação da glicose; se realiza também no citosol e tem como finalidades metabólicas as seguintes:

  •  Gerar potencial de redução extra-mitocondrial na forma de NADPH, coenzima necessária para a biossíntese redutiva de várias biomoléculas, em especial ácidos graxos, colesterol e hormônios esteróides, principalmente no fígado, glândula mamária e córtex adrenal. No eritrócito, o NADPH participa da redução do peróxido de hidrogênio que se forma devido à presença de oxigênio
  •  Gerar ribose-5-fosfato, necessária para a biossíntese dos ácidos nucleicos
  •  Metabolizar mossacarídeos de 4, 5 e 7 carbonos que ingressam ao metabolismo procedentes de substratos alimentícios, para que possam entrar à via glicolítica.

A rota do fosfogliconato é bastante ativa no eritrócito, onde tem como objetivo prevenir a oxidação dos ácidos graxos insaturados da membrana plasmática, situação devida à intensa interação da membrana com moléculas de O2, e para manter o estado reduzido (estado ferroso Fe2+) do átomo de ferro da hemoglobina. Estas reduções estão garantidas pela produção de NADPH na via das pentoses-fosfato. A coenzima NADPH é necessária para a ação da enzima glutationredutase, que reduz o glutation oxidado na seguinte reação:

G-S-S-G (glutation oxidado) + NADPH + H+  → 2 GSH (glutation reduzido) + NADP+

O glutation é um tripeptídeo (g-Glu-Cys-Gly) que impede a oxidação dos ácidos graxos da membrana, causada pelo aumento nos níveis de H2O2, a expensas de sua própria oxidação. Esta oxidação do glutation é catalisada pela enzima glutation-peroxidase, tendo como cofator o selênio:

2 GSH (glutation reduzido) + H2O2 → G-S-S-G (glutation oxidado) + 2 H2O

A via das pentoses-fosfato pode visualizar-se como a oxidação de três moléculas de glicose (3×6 = 18C) cujos produtos finais são três moléculas de CO2 (3×1 = 3C) e três moléculas de pentoses (3×5 = 15C). Estas últimas podem se transformar para regenerar duas moléculas de glicose (2×6 = 12C) mais uma molécula de gliceraldeído (1×3 = 3C), que pode entrar na rota glicolítica. A via das pentoses-fosfato está composta das seguintes reações enzimáticas:

glicose-6-fosfato + NADP+ → 6-fosfogliconolactona (ácido glicônico)+ NADPH + H+

enzima: glicose-6-fosfato desidrogenase/ cofator: Mg2+

6-fosfogliconolactona + H2O → 6-fosfogliconato

enzima: lactonase / cofator: Mg2+

6-fosfogliconato + NADP+ –> ribulose-5-fosfato + CO2 + NADPH + H+

enzima: 6-fosfogliconato desidrogenase / cofator: Mg2+

ribulose-5-fosfato → ribose-5-fosfato

enzima: ribose-5-fosfato isomerase

Sob algumas condições metabólicas, a rota pode terminar aqui, pois estão preenchidos os objetivos metabólicos de produzir NADPH e ribose.

Em outras circunstâncias metabólicas, quando são baixas as necessidades de ribose ou de NADPH, a rota pode prosseguir para uma segunda fase constituída por transformações reversíveis entre aldoses e cetoses:

ribulose-5-fosfato → xilulose-5-fosfato

enzima: ribulose‑5‑fosfato‑3‑epimerase

xilulose-5-fosfato + ribose-5-fosfato → sedoheptulose-7-fosfato + gliceraldeído-3-fosfato

enzima: transcetolase/ coenzima: tiamina-pirofosfato (TPP) / cofator: Mg2+

sedoheptulose-7-fosfato + gliceraldeído-3-fosfato → frutose-6-fosfato + eritrose-4-fosfato

enzima: transaldolase

eritrose-4-fosfato + xilulose-5-fosfato → frutose-6-fosfato + gliceraldeído-3-fosfato

enzima: transcetolase

Os produtos da última reação são metabólitos intermediários da rota da glicólise, onde podem entrar para serem metabolizados.

Quais são os 3 tipos de substratos energéticos que mantém as células ativas em repouso e movimento?
Via das pentoses-fosfato

Rota do glicuronato (síntese de ácido ascórbico)

A glicose pode oxidar-se por outra via secundária que conduz à formação de glicuronato e, eventualmente, a ácido L-ascórbico ou vitamina C. O glicuronato é um importante composto que participa na detoxificação e excreção de substâncias orgânicas forâneas. Esta via inicia-se com a glicose-1-fosfato, que é ativada mediante a união do nucleotídeo uridina-difosfato:

glicose-1-fosfato + UTP → UDP-glicose + PPi

enzima: glicose-1-fosfato uridil transferase / cofator: Mg2+

UDP-glicose + 2 NAD+ + H2O → UDP-glicuronato + 2 NADH + 3H+

enzima: UDP-glicose desidrogenase

O glicuronato pode atuar como agente detoxificante no catabolismo, pois ele pode conjugar-se com diferentes metabólitos a fim de facilitar a excreção da substância mediante o aumento de sua polaridade e, portanto, de sua solubilidade. Uma outra alternativa é atuar como molécula precursora do ácido L-ascórbico (vitamina C). Os primatas, as cobaias e alguns peixes e aves, carecem da gliconolactona oxidase, uma das enzimas da síntese do ácido L‑ascórbico, e dependem da dieta para suprir suas necessidades de vitamina C.

Ciclo de Krebs

Entre os processos oxidativos das moléculas orgânicas destinados à obtenção de energia nas células, existem aqueles que correspondem à oxidação total, onde tem lugar o consumo final do O2 no organismo; tais processos são conhecidos como “respiração celular”. Nesses processos, o acetil-CoA proveniente da oxidação dos glicídios, dos ácidos graxos e de alguns aminoácidos, entra no ciclo de Krebs para sua oxidação total até CO2 e H2O. Esta via metabólica foi proposta por Hans Krebs em 1937. Outros nomes que recebe a via são: ciclo dos ácidos tricarboxílicos e ciclo do ácido cítrico.

A energia obtida a partir da oxidação do acetil-CoA é conservada na forma de coenzimas reduzidas, NADH e FADH2, as que em processos sequenciais cedem seus elétrons a várias moléculas receptoras na chamada cadeia respiratória, para reduzir o O2 e produzir energia e H2O metabólica. Nos processos de óxido-reduções consecutivas realizadas na cadeia respiratória se libera energia que é aproveitada em um processo acoplado chamado fosforilação oxidativa, em que se produz ATP. Assim, o ciclo de Krebs, junto com a cadeia respiratória e a fosforilação oxidativa, formam parte da respiração celular onde se produz a maior parte do ATP do organismo.

No ciclo de Krebs ocorrem 8 reações enzimáticas. Os compostos intermediários do ciclo devem estar em concentrações adequadas para que o ciclo possa ocorrer. Na primeira reação do ciclo, o oxalacetato (OAA) se condensa com o acetil-CoA para formar ácido cítrico. O OAA constitui um dos principais compostos limitantes da velocidade com que o ciclo se realiza. Todos os compostos intermediários podem eventualmente sair do ciclo e servir como precursores de outras moléculas em determinadas condições metabólicas. Das 8 reações do ciclo, 4 são oxidações que conduzem à formação de coenzimas reduzidas. Em cada volta do ciclo, pode virtualmente considerar-se que o acetil-CoA é oxidado até 2 CO2 e 1 H2O, produzindo-se também 3 NADH e 1 FADH2, além de 1 GTP (equivalente a 1 ATP). O ciclo de Krebs é realizado por um complexo multienzimático localizado na matriz mitocondrial e na membrana mitocondrial interna, tendo as seguintes reações:

acetil-CoA + oxalacetato + H2O → citrato + CoA-SH

enzima: citrato sintetase (enzima alostérica)

citrato → isocitrato

enzima: aconitase

isocitrato + NAD+(NADP+) → a-cetoglutarato + CO2 + NADH (NADPH) + H+

enzima: isocitrato desidrogenase (enzima alostérica) / cofator: Mg2+

alfa-cetoglutarato + NAD+ + CoA → succinil-CoA + CO2 + NADH + H+

enzima: complexo alfa-cetoglutarato desidrogenase /

coenzimas: TPP, FAD, NAD, CoA, ácido lipóico

succinil-CoA + GDP + Pi → succinato + GTP + CoA

enzima: succinil tioquinase

succinato + FAD → fumarato + FADH2

enzima: succinato desidrogenase / coenzima: FAD

fumarato + H2O → L-malato

enzima: fumarase

malato + NAD+ → oxalacetato + NADH + H+

enzima: malato desidrogenase

Quais são os 3 tipos de substratos energéticos que mantém as células ativas em repouso e movimento?
Ciclo de Krebs

Regulação do ciclo de Krebs

A regulação do ciclo de Krebs é bem complexa, tendo os seguintes pontos de controle:

  1. Complexo piruvato desidrogenase, cuja reação é responsável pela produção do acetil-CoA; este complexo enzimático é regulado alostérica e covalentemente. O controle alostérico ocorre por inibição exercida pelo ATP, pelos produtos da reação (acetil-CoA e NADH) e pelos ácidos graxos de cadeia longa; a estimulação é exercida pelo AMP e pelo NAD+; portanto, o complexo se inibe quando há oferta de combustíveis na célula e se ativa quando está em falta deles. O controle covalente, segundo nível de regulação do complexo, ocorre mediante fosforilação reversível por uma proteína quinase específica em resíduos de serina da enzima E1 que causa inativação do complexo enzimático. O complexo piruvato desidrogenase é ativado mediante defosforilação por uma fosfoproteína fosfatase específica. A fosforilação (inibição) do complexo ocorre a expensas do ATP, fato que é coerente com a regulação alostérica pois o ATP é modulador negativo do complexo.
  2. Enzima citrato sintetase e seus dois substratos, acetil-CoA e oxalacetato; o ATP inibe a enzima e o ADP reverte a inibição. O citrato, produto da reação, é um metabólito que pode sair para o citosol e funcionar como modulador alostérico negativo da glicólise, afetando a atividade da enzima PFK-1.
  3. Enzimas isocitrato desidrogenase e alfa-cetoglutarato desidrogenase; estas enzimas catalisam reações altamente exergônicas no ciclo de Krebs, estando comprometidas em reações de óxido-redução.
  4. A concentração dos metabólitos intermediários, a qual está em função das necessidades metabólicas do organismo e da disponibilidade de nutrientes.

Caráter anfibólico do ciclo de Krebs

O ciclo de Krebs atua no catabolismo oxidando o acetil-CoA, intermediário comum na oxidação de glicídios, aminoácidos e ácidos graxos, mas também pode atuar no fornecimento de precursores das vias anabólicas, a partir de seus metabólitos intermediários. Por ter rotas anabólicas que geram compostos para processos de biossíntese e ao mesmo tempo servir de rota oxidativa, catabólica, o ciclo de Krebs é uma via anfibólica.

Exemplos de reações anabólicas são as seguintes:

  • Metabólitos do ciclo de Krebs que servem como precursores de aminoácidos:

alfa-cetoglutarato + alanina → piruvato + glutamato

enzima: ALT (alanina aminotransferase)

alfa-cetoglutarato + aspartato → oxalacetato + glutamato

enzima: AST (aspartato aminotransferase)

  • Metabólitos do ciclo de Krebs que servem como precursores de acetil-CoA para a síntese de ácidos graxos:

citrato + CoA-SH + ATP → acetil-CoA + oxalacetato + ADP + Pi

enzima: citrato liase

  • Oxalacetato (OAA) que serve como precursor de glicose, nas reações da via da gliconeogênese.

 Reposição dos intermediários do ciclo de Krebs

Quando os intermediários do ciclo de Krebs estão em baixa concentração, podem ser repostos mediante reações anapleróticas ou de “recheio”, das quais são exemplo as seguintes:

(1) Reposição de OAA:

piruvato + CO2 + H2O + ATP → oxalacetato + ADP + Pi

enzima: piruvato carboxilase / cofatores: Mn2+ e biotina

PEP + CO2 + GDP → oxalacetato + GTP

enzima: PEP-carboxiquinase

(2) Reposição de malato:

piruvato + CO2 + NADPH + H+ → malato + NADP+

enzima: malato desidrogenase descarboxilante-NADP (enzima málica)

Balanço energético do ciclo de Krebs

Com relação à produção de energia no ciclo de Krebs, pode-se fazer um balanço energético considerando que para cada molécula de acetil-CoA que entra, obtêm-se como produtos finais 2 CO2, 3 NADH, 3 H+, 1 FADH2 e 1 GTP. O CO2 é eliminado na respiração e energeticamente não tem valor. As coenzimas reduzidas vão para a cadeia de transporte de elétrons para produzir energia em uma série de transferências eletrônicas e produzir finalmente ATP nas reações acopladas da fosforilação oxidativa. Nesses processos, por cada NADH é possível obter 3 ATP e por cada FADH2 obtêm-se 2 ATP. Assim, por cada molécula de acetil-CoA que se oxida no ciclo de Krebs, obtêm-se 12 ATP:

3 NADH x 3 ATP = 9 ATP   

1 FADH2 x 2 ATP = 2 ATP              

1 GTP = 1 ATP                     

Total = 12 ATP                      

Considerando a oxidação total de um mol de glicose, através da glicólise aeróbica, mais a oxidação do piruvato e a oxidação do acetil-CoA no ciclo de Krebs, a produção total de ATP que se obtém nos três processos a partir de um mol de glicose é a seguinte:

Glicólise aeróbica (1 glicose): 2 ATP + 2 NADPH (6 ATP) = 8 ATP

Oxidação do piruvato (2 piruvatos): 2 NADH = 6 ATP

Ciclo de Krebs (2 acetil‑CoA): 24 ATP

total = 38 ATP

Fazendo o balanço energético da oxidação total da glicose nas células obtém-se que a geração de 38 ATP consome: 38 x 30,5 kJ/mol = 1.160 kJ/mol. Considerando que a energia de combustão total da glicose liberada em um calorímetro é de 2.840 kJ/mol, significa que o processo de oxidação da glicose nas células representa uma eficiência de conservação da energia de 40% (1.160/2.840).

Cadeia respiratória

A fosforilação oxidativa é a síntese de ATP realizada na mitocôndria, graças à energia proveniente do transporte de elétrons entre moléculas receptoras e doadoras, em reações de óxido-redução. Tais elétrons, por sua vez, provêm dos processos oxidativos das vias catabólicas de glicídios, ácidos graxos e aminoácidos. Os processos de fosforilação oxidativa e transporte de elétrons ocorrem simultaneamente e de forma acoplada, isto é, o fluxo de elétrons “força” a fosforilação a ir junto. Esta constitui a fonte de ATP mais importante no organismo animal.

Existe outra forma de fosforilação do ADP que se realiza em outras vias no citosol ou na mitocôndria que, comparativamente com os processos anteriores, contribui com pouco ATP; essa forma de fosforilação utiliza a energia de hidrólise dos compostos fosfatados ou sulfatados de alta energia, isto é, aqueles em que a energia de hidrólise dos grupos fosfato ou sulfato é maior que a energia de hidrólise do ATP (>30 kJ/mol); os principais compostos são o 1,3-difosfoglicerato, o fosfoenol-piruvato e o succinil-CoA.

A cadeia respiratória (cadeia de transporte de elétrons + fosforilação oxidativa) envolve a redução do O2 a H2O, utilizando os elétrons doados por NADH e FADH2. É nesses processos onde se realiza a recepção final do oxigênio ou respiração celular. As enzimas da cadeia respiratória e da fosforilação oxidativa localizam-se na membrana interna da mitocôndria, que é impermeável a moléculas pequenas e à maioria dos íons, incluindo H+. As coenzimas reduzidas (NADH, NADPH, FMNH2 e FADH2) produzidas nos processos oxidativos do citosol e da mitocôndria (glicólise, oxidação do piruvato, ciclo de Krebs, oxidação dos ácidos graxos e oxidação dos aminoácidos) cedem os elétrons a uma série de compostos transportadores que se reduzem e se oxidam de forma sequencial, até entregar os elétrons a seu receptor final, o oxigênio. A maioria dos transportadores são proteínas integradas à membrana interna mitocondrial com grupos prostéticos capazes de receber e doar elétrons. Cada componente da cadeia recebe elétrons de um transportador precedente e os entrega ao transportador que lhe segue, numa série de reações com sequência específica.

Sequência da cadeia respiratória

A coenzima reduzida NADH é o primeiro composto da cadeia, pois ela concentra os elétrons de muitos substratos nos processos oxidativos celulares. O NADPH, que se produz em alguns processos, transfere os elétrons para o NAD+ para formar NADH numa reação catalisada pela enzima piridina-nucleotídeo transidrogenase:

NADPH + NAD+ –> NADP+ + NADH

Os elétrons (transportados como H) da NADH são recebidos pela ubiquinona ou coenzima Q (UQ), uma benzoquinona lipossolúvel presente em todos os animais, cujo grupo quinona pode oxidar-se ou reduzir-se. Como a ubiquinona é uma molécula pequena que pode se difundir facilmente através das membranas, é um eficiente transportador de elétrons entre os transportadores mais “fixos”. A ubiquinona oxidada pode aceitar um elétron e converter-se em uma semiquinona radical (UQH.) ou aceitar dois elétrons e formar a ubiquinona completamente reduzida ou ubiquinol (UQH2). A transferência de elétrons da NADH para a ubiquinona (complexo I) requer da enzima NADH desidrogenase, uma flavoproteína ferro-sulfurada que possui um grupo prostético de FMN (flavina-mononucleotídeo). O FMN recebe os elétrons da NADH e os transfere para os átomos de Fe-S, que os entregam finalmente à ubiquinona. A reação catalisada pela NADH desidrogenase é a seguinte:

NADH + H+ + UQ –> NAD+ + UQH2

As coenzimas flavínicas reduzidas (FADH2, FMNH2) produzidas em alguns processos de óxido-redução, transferem seus elétrons diretamente à ubiquinona, que somente aceita elétrons de grupos flavínicos. A enzima que transfere os elétrons desses grupos flavínicos para a ubiquinona é a succinato desidrogenase (complexo II), única enzima do ciclo de Krebs que se encontra integrada à membrana interna da mitocôndria. Esta enzima possui um grupo prostético FAD e 4 centros Fe-S.

Nas seguintes etapas da cadeia, a ubiquinona cede os elétrons a uma série de citocromos, proteínas integradas à membrana interna da mitocôndria, que transferem elétrons através dos seus grupos prostéticos de ferro-protoporfirina IX (grupo heme) que formam parte de suas estruturas, sendo similares aos núcleos prostéticos da hemoglobina. Existem três classes de citocromos (a, b, c) mas em todos eles o processo de óxido-redução se realiza por mudanças na valência do ferro do grupo heme:

Fe3+ + e–   –>  Fe2+

Os três tipos de citocromos diferenciam-se por seus espectros de absorção de luz na forma reduzida (Fe2+): a banda de absorção com maior comprimento de onda é de 600 nm nos citocromos a, de 560 nm nos citocromos b e de 550 nm nos citocromos c. A sequência de transferência dos elétrons nos citocromos na cadeia respiratória, é a seguinte:

b –> c1 –> c –> (a+a3)

A passagem dos elétrons desde a ubiquinona até o citocromo c conhece-se como complexo citocromo bc, ou ubiquinona-citocromo c oxidorredutase (complexo III), contendo os citocromos b562, b566, c1, uma proteína ferro-sulfurada e pelo menos 6 subunidades de outra proteína. As proteínas estão assimetricamente instaladas na membrana mitocondrial interna. A transferência de elétrons da ubiquinona para os citocromos deixa de ser em pares de H, passando a ser em elétrons simples.

Os prótons (H+) restantes são bombeados para o espaço intermembranal utilizando a energia da reação de óxido-redução e produzindo um gradiente de prótons ou bomba de prótons (potencial eletroquímico transmembranal). O núcleo de ferro dos citocromos não pode ligar o oxigênio, exceto o último citocromo da cadeia (citocromo a+a3), que constitui o receptor biológico do oxigênio no final da cadeia respiratória. Este citocromo recebe também o nome de citocromo oxidase (complexo IV) e consiste de uma proteína oligomérica de peso molecular de 200 kd, cujo núcleo contém, além do grupo heme, dois átomos de Cu+, responsáveis pela transferência dos elétrons para o O2. O complexo citocromo oxidase pode transportar grupos de 4 elétrons que vão reduzir o O2. O fluxo desses elétrons causa um movimento de prótons da matriz para o espaço intermembranal, contribuindo para o potencial eletroquímico de prótons:

4 e– + O2 + 4 H+ (da matriz) –> 2 H2O

A passagem dos prótons da matriz mitocondrial para o espaço intermembranal força o fluxo de mais elétrons na cadeia e, portanto, o bombeio de mais prótons para o espaço intermembranal. O íon cianeto (CN–) inibe a reoxidação da enzima citocromo oxidase, bloqueando a cadeia respiratória, causando anoxia tisular e morte rápida. O sulfeto de hidrogênio (H2S) exerce uma ação similar. A sequência total da transferência eletrônica desde o NADH até o O2, é a seguinte:

NADH → UQ → cit b → cit c1 → cit c → cit (aa3) → O2

Fosforilação oxidativa

Existem três pontos da cadeia respiratória em que se gera suficiente quantidade de energia livre para fosforilar um mol de ADP, ocorrendo também formação de gradiente de prótons: (1) entre o NADH e a ubiquinona (complexo I); (2) entre a ubiquinona e o citocromo c (complexo III); e (3) entre a citocromo oxidase e o oxigênio (complexo IV). Os substratos nos quais participam flavoenzimas para sua oxidação (complexo II) entregam os elétrons diretamente à ubiquinona sem produzir fosforilação, gerando no processo de transferência até o oxigênio somente dois ATP.

O complexo enzimático ATP sintetase localiza-se na membrana interna da mitocôndria e consta de duas partes denominadas fatores F1 e Fo. O subscrito 1 refere a que foi o primeiro fator descoberto por Racker na década de 1960; o subscrito o refere a que o fator é inibido pela oligomicina. O fator F1 consta de 6 subunidades maiores e de 3 subunidades menores, localizadas na periferia da membrana interna, de fronte para a matriz mitocondrial. A fração Fo está mais integrada à membrana do lado do espaço intermembranal; esta fração é a encarregada de transportar os prótons que estão fazendo gradiente eletroquímico do espaço intermembranal para o interior da matriz, transportador necessário pois a membrana interna é impermeável aos prótons. A fração Fo forma um canal através do qual fluem passivamente os prótons a favor do gradiente, o que gera uma força que garante a fosforilação do ADP na matriz da mitocôndria.

O modelo atualmente aceito para a fosforilação oxidativa é o do acoplamento quimiosmótico, introduzido por Mitchell em 1961. Esta teoria assinala que o acoplamento seria realizado por um estado intermediário de aumento de energia, obtido por um gradiente eletroquímico (diferença elétrica devida ao aumento de H+ e diferença química devida à diminuição do pH) que se produz pelo bombeio de íons de H+ através da membrana interna da mitocôndria para o espaço intermembranal. Os íons H+ provêm da cadeia respiratória quando a ubiquinona entrega os elétrons aos citocromos e deixa os H+ livres para serem bombeados. A energia para o bombeio provem das variações de energia livre nas etapas da cadeia respiratória. A matriz mitoncondrial torna-se alcalina em relação ao espaço intermembranal. O gradiente eletroquímico leva a um estado energizado que impulsiona a fosforilação do ADP com participação da enzima ATP sintetase F1Fo, na membrana interna mitocondrial:

ADP + Pi → ATP + H2O

Quais são os 3 tipos de substratos energéticos que mantém as células ativas em repouso e movimento?
Modelo da fosforilação oxidativa

Desacoplantes e inibidores da fosforilação oxidativa

Os agentes desacoplantes da fosforilação oxidativa são substâncias tóxicas que embora permitam o transporte de elétrons na cadeia respiratória, desacoplam a transmissão de energia da cadeia eletrônica para a fosforilação oxidativa, impedindo a formação de ATP. Os desacoplantes estimulam a atividade da cadeia respiratória e, portanto, o consumo de oxigênio. Exemplos desses agentes são o 2,4-dinitrofenol, o dicumarol e o CCCP (carbonilcianeto-m-clorofenil-hidrazona). Em geral, são substâncias lipossolúveis com grupos ácido e anel aromático, que podem entrar na matriz mitocondrial e impedem, mediante a dissociação de H+, a formação do gradiente eletroquímico.

Outro tipo de agentes desacoplantes são as substâncias ionôforas, como a valinomicina, que causam a degradação do estado de alta energia gerado no gradiente eletroquímico, pois permitem a passagem de cátions monovalentes como K+ através da membrana interna mitocondrial. Assim, a energia gerada pela cadeia respiratória deve ser gasta em bombear tais cátions de volta para o interior da matriz mitocondrial ao invés de facilitar a fosforilação. Esses agentes não detêm a cadeia respiratória e, portanto, não reduzem o consumo de oxigênio.

Os agentes inibidores da fosforilação oxidativa são tóxicos que não somente impedem a fosforilação como também detêm a cadeia respiratória, mediante a alteração dos seus compostos intermediários. Desta forma, não se pode consumir oxigênio, pois os elétrons nem chegam a seu destinatário final e também não se produz ATP, pois não se gera energia. Exemplos de agentes inibidores são a oligomicina, a rotenona, a actinomicina A, o cianeto, o ácido sulfídrico e o monóxido de carbono.

Regulação da fosforilação oxidativa

A velocidade com que o O2 se consome na respiração celular está em função da concentração de ADP e da relação ATP/ADP. Quando se gasta ATP nos processos biológicos que demandam energia, esta relação diminui porque aumenta a disponibilidade de ADP, fazendo com que se promova a síntese de ATP, isto é, aumenta a respiração celular para manter estável a relação, impedindo que ocorram grandes flutuações ainda sob situações de extrema demanda energética. Os níveis de ADP e ATP não somente controlam a velocidade da respiração celular, mas também as vias de produção de coenzimas reduzidas: glicólise, oxidação do piruvato e ciclo de Krebs, pois eles são moduladores alostéricos de várias enzimas dessas vias metabólicas.

Gliconeogênese

A gliconeogênese junto com a glicogenólise constituem as duas vias metabólicas mediante as quais o organismo pode manter a glicemia. A gliconeogênese inclui todas as vias metabólicas destinadas a sintetizar glicose a partir de piruvato, lactato, propionato, glicerol ou aminoácidos. É um processo realizado principalmente no fígado e no rim. Nos ruminantes, a gliconeogênese tem especial importância devido a que a fonte primária de glicose é o propionato, ácido graxo volátil, produto final da fermentação microbiana dos glicídios no rúmen.

Gliconeogênese a partir de piruvato

A conversão do piruvato em glicose é a via central da gliconeogênese. Esta via compartilha, em sentido inverso, sete das dez reações da glicólise. As três reações restantes (não comuns à glicólise) são irreversíveis devido a sua alta variação de energia livre. São elas:

  • Conversão de fosfoenolpiruvato (PEP) a piruvato
  • Conversão de frutose-6-fosfato a frutose-1,6-difosfato
  • Conversão de glicose a glicose-6-fosfato

Para que estas três reações ocorram em sentido inverso, ou seja no sentido da gliconeogênese, devem ser realizadas por enzimas diferentes às que agem na glicólise ou mediante diferentes vias. Estas três reações fazem com que as vias da gliconeogênese e da glicólise sejam irreversíveis na célula, sendo reguladas independentemente por enzimas específicas próprias para cada rota. O sentido inverso das anteriores reações é conseguido nas células mediante os seguintes mecanismos:

(1) Conversão de piruvato a PEP: ocorre mediante um by-pass (desvio) através da mitocôndria. O piruvato entra na mitocôndria onde é convertido a oxalacetato (OAA), numa reação de carboxilação que consome ATP, catalisada pela enzima piruvato carboxilase, que requer de Mn2+ como cofator. Esta enzima é alostérica e estimulada pelo acetil-CoA:

piruvato + HCO3– + ATP → OAA + ADP + Pi + H+

O OAA deve converter-se em malato para poder passar para o citosol:

OAA + NADH + H+ <—> L-malato + NAD+

Esta reação interconversível é catalisada pela enzima malato desidrogenase, que usa NAD+ como coenzima e se encontra tanto na mitocôndria quanto no citosol. O malato no citosol sofre a reação inversa para regenerar OAA e NADH. Esta reação é necessária para extrair NADH da mitocôndria e levar para o citosol, onde esta coenzima reduzida é escassa, sendo necessária durante a gliconeogênese na etapa da redução de 1,3-difosfoglicerato a gliceraldeído-3-fosfato. O OAA no citosol pode ser descarboxilado a PEP por ação da enzima PEP carboxiquinase, com gasto de um GTP:

OAA + GTP → PEP + CO2 + GDP

(2) Conversão de frutose-1,6-difosfato a frutose-6-fosfato: é realizada pela frutose-1,6-difosfatase, enzima alostérica que é modulada positivamente pelo 3-fosfoglicerato e o citrato e negativamente pelo AMP:

frutose-1,6-difosfato + H2O → frutose-6-fosfato + Pi

(3) Conversão de glicose-6-fosfato a glicose livre: é realizada pela glicose-6-fosfatase, que se encontra unicamente no fígado, no rim e no epitélio intestinal; requer de Mg2+ como cofator:

glicose-6-fosfato + H2O → glicose + Pi

Como esta enzima não existe no cérebro e no músculo, esses tecidos não podem realizar gliconeogênese e dependem da glicose sanguínea como fonte de energia. A soma das reações desde o piruvato até a glicose é:

2 piruvato + 4 ATP + 2 GTP + 2 NADH + 4 H2O –> glicose + 4 ADP + 2 GDP + 6 Pi + 2 NAD+ + 2 H+

Gastam-se 6 grupos fosfato de alta energia: 2 ATP e 2 GTP na conversão de 2 piruvatos até 2 PEP; e mais 2 ATP na conversão de duas moléculas de 3‑fosfoglicerato a duas moléculas de 1,3‑difosfoglicerato. Também se gastam 2 coenzimas reduzidas NADH. Cabe lembrar que no inverso desta via (a glicólise) somente se produzem 2 ATP.

Gliconeogênese a partir de propionato

Embora esta rota ocorra tanto nos monogástricos quanto nos ruminantes, é de especial importância nestes últimos animais, pois é utilizada como a mais importante fonte de glicose. O propionato é absorvido no epitélio ruminal como produto final da fermentação microbiana dos glicídios, passando para o fígado onde ingressa na rota gliconeogênica. A rota do propionato até glicose passa por seu ingresso no ciclo de Krebs até dar OAA, precursor gliconeogênico que pode ser convertido em PEP. Inicialmente o propionato deve ativar-se a propionil-CoA, mediante a enzima propionil-CoA sintetase (Mg2+ como cofator) na seguinte reação:

propionato + CoA-SH + ATP → propionil-CoA + AMP + PPi

Depois, o propionil-CoA é carboxilado em D-metilmalonil-CoA por ação da enzima propionil-CoA carboxilase, enzima que requer da biotina como cofator. A reação consome outro ATP:

propionil-CoA + CO2 + ATP → D-metilmalonil-CoA + ADP + Pi

O produto da reação anterior é convertido em seu isômero L por uma racemase:

D-metilmalonil-CoA → L-metilmalonil-CoA

O L-metilmalonil-CoA é convertido em outro isômero, o succinil-CoA, intermediário do ciclo de Krebs:

L-metilmalonil-CoA → succinil-CoA

Esta reação é catalisada pela enzima L-metilmalonil-CoA mutase que requer da coenzima B12como cofator. Esta coenzima é sintetizada pelos microorganismos do rúmen, sendo requerido cobalto, mineral que pode ser limitante em certas circunstâncias, afetando então o metabolismo energético do animal. O succinil-CoA segue o ciclo de Krebs até dar malato, que sai para o citosol e é convertido em OAA, continuando a gliconeogênese da mesma forma que o processo a partir de piruvato.

Gliconeogênese a partir de glicerol

O glicerol se produz a partir da lipólise dos triglicerídeos no tecido adiposo, onde não se pode metabolizar. Deve sair para o sangue e chegar ao fígado onde pode ingressar à via glicolítica através da di-hidroxiacetona-fosfato. Antes, o glicerol sofre fosforilação pela enzima glicerol quinase, presente unicamente no fígado:

glicerol + ATP → glicerol-3-fosfato + ADP

O glicerol-3-fosfato é então oxidado pela enzima glicerol-3-fosfato desidrogenase para obter di-hidroxiacetona-fosfato, composto intermediário da via glicolítica/gliconeogênica:

glicerol-3-fosfato + NAD+ –> di-hidroxiacetona-fosfato + NADH + H+

Gliconeogênese a partir de lactato

O lactato se produz no eritrócito e no músculo esquelético como produto final da glicólise anaeróbica, mas não pode ser metabolizado nesses tecidos, devendo sair para o sangue e ingressar no fígado, onde é reoxidado a piruvato pela enzima lactato desidrogenase:

lactato + NAD+ → piruvato + NADH + H+

O piruvato entra na mitocôndria onde é convertido em OAA continuando a gliconeogênese.

Gliconeogênese a partir de aminoácidos

Os aminoácidos podem ingressar à gliconeogênese através de intermediários do ciclo de Krebs ou através do piruvato. Os aminoácidos que podem ingressar por esta rota chamam-se aminoácidos glicogênicos e têm cinco possíveis sítios de entrada:

a) via piruvato: Ala, Ser, Cys, Gly, Trp

b) via a-cetoglutarato: Glu, Gln, Pro, Arg, His

c) via succinil-CoA: Val, Thr, Met, Ile

d) via fumarato: Phe, Tyr

e) via OAA: Asp, Asn

Desses aminoácidos, Trp, Ile, Phe e Tyr também podem terminar em acetil-CoA, dependendo da rota metabólica (aminoácidos cetogênicos). De todos os aminoácidos, somente Leu não pode dar glicose, sendo, portanto, um aminoácido cetogênico obrigatório. A síntese de glicose a partir de aminoácidos é a via metabólica mais importante e duradoura para manter a glicemia, cobrando especial importância nos animais carnívoros.

Regulação da gliconeogênese

A gliconeogênese e a glicólise estão reguladas de forma separada e recíproca. O principal ponto de controle tem a ver com as reações que envolvem o piruvato, em ambos os casos. Na glicólise, o complexo piruvato desidrogenase (piruvato –> acetil-CoA) e na gliconeogênese a enzima piruvato carboxilase (piruvato –> oxalacetato). A enzima piruvato carboxilase tem como ativador alostérico o acetil-CoA, de modo que a biossíntese de glicose é favorecida quando tem altos níveis de acetil-CoA. Por outro lado, quando as necessidades energéticas da célula estão satisfeitas (alto valor da relação ATP/ADP), ocorre uma diminuição da fosforilação oxidativa aumentando-se os níveis de NADH e inibindo-se o ciclo de Krebs; consequentemente, o acetil-CoA se acumula. Este inibe o complexo da piruvato desidrogenase para frear a glicólise acumulando-se piruvato, que estimula a enzima piruvato carboxilase para levar o piruvato no sentido da gliconeogênese.

Outro ponto de controle da gliconeogênese é sobre a enzima frutose-1,6-difosfatase (frutose-1,6-difosfato –> frutose-6-fosfato), que é inibida por AMP. A enzima que catalisa a reação inversa na glicólise (frutose-6-fosfato –> frutose-1,6-difosfato) é a fosfofrutoquinase-1 (PFK-1), que é estimulada por AMP e ADP e inibida por citrato e ATP. Quando há suficiente concentração de ATP e de citrato, ocorre aumento na concentração de acetil-CoA, favorecendo a gliconeogênese e a síntese de glicogênio, para converter a energia restante em glicose e armazená-la na forma de glicogênio.

A gliconeogênese pode ser regulada pelo glucagon, mediante a ativação da enzima frutose-2,6-difosfatase e a inibição da enzima fosfofrutoquinase-2 (PFK-2). O glucagon atua via cAMP, estimulando a ação de proteína-quinases que fosforilam (ativam) as anteriores enzimas. O efeito do glucagon conduz à diminuição da concentração da frutose-2,6-difosfato, metabólito que favorece a glicólise por ser modulador alostérico positivo da PFK-1, e que desfavorece a gliconeogênese por inibir alostericamente a frutose-1,6-difosfatase. Assim, diminuindo os níveis de frutose-2,6-difosfato pela ação do glucagon, favorece-se a gliconeogênese e inibe-se a glicólise.

Biossíntese de lactose

A lactose é um dissacarídeo de glicose e galactose com união alfa1-4 que se sintetiza exclusivamente na glândula mamária ativa. A síntese se realiza no aparelho de Golgi das células do epitélio mamário. As moléculas precursoras, glicose e galactose, provêem principalmente da glicose sanguínea ou de substâncias rapidamente conversíveis em glicose via gliconeogênese (propionato, piruvato, oxalacetato, aminoácidos). Metade da glicose que entra na glândula mamária vai para síntese de lactose e a outra metade vai para formar glicerol, necessária para a síntese dos triglicerídeos do leite.

A secreção de lactose induz secreção de água no alvéolo mamário, sendo, portanto, a síntese de lactose determinante na produção total de leite. A disponibilidade de glicose na glândula mamária, isto é a disponibilidade de glicose sanguínea, é um fator limitante para a produção de leite. A galactose necessária para a síntese de lactose pode provir da própria glicose ou também do glicerol. A síntese de galactose a partir de glicose compreende as seguintes 4 etapas:

1) glicose + ATP –> glicose-6-fosfato + ADP (enzima: hexoquinase)

2) glicose-6-fosfato –> glicose-1-fosfato (enzima: fosfoglicomutase)

3) glicose-1-fosfato + UTP –> UDP-glicose + PPi (enzima: UDP-glicose pirofosforilase)

4) UDP-glicose –> UDP-galactose (enzima: UDP-galactose 4-epimerase)

A enzima que sintetiza a lactose é um complexo chamado lactose sintetasecomposto de duas proteínas: (a) galactosil transferase, presente no aparelho de Golgi da célula epitelial mamária e de outros tecidos; quando atua em forma isolada esta enzima catalisa uniões entre UDP-galactose e N-acetilglicosamina; e (b) alfa-lactalbumina, presente em altas concentrações no leite. Sua presença exclusiva nas células mamárias faz com que a galactosil transferase possa transferir a UDP-galactose à glicose na seguinte reação:

UDP-galactose + glicose → lactose + UDP

O complexo lactose sintetase (galactosil transferase + alfa-lactalbumina) requer Mn2+ como cofator, apesar de que a concentração deste cátion na glândula mamária é baixa (50-100 µmoles/L). A síntese de alfa-lactalbumina é inibida pela progesterona durante a gestação na glândula mamária inativa, de forma que a galactosil transferase não pode formar lactose, mas contribui para a formação de oligossacarídeos de membrana.

Frutose como fonte de energia

A frutose, monossacarídeo abundante nas frutas, pode ser oxidada no processo conhecido como frutólise até lactato para produzir energia em certos tecidos. As reações da frutólise são as seguintes:

frutose + ATP → frutose-1-fosfato + ADP (enzima frutoquinase)

frutose-1-fosfato → gliceraldeído + di-hidroxiacetona-fosfato (enzima: aldolase)

di-hidroxiacetona-fosfato → via glicolítica → gliceraldeído-3-fosfato → gliconeogênese

A glicose pode produzir frutose para servir como fonte de energia exclusiva nos espermatozoides, célula que tem a frutose como fonte essencial de energia, necessária para sua movimentação, aparentemente para que outras células não possam usa-la como fonte de energia. As reações neste caso são as seguintes:

glicose + NADPH + H+ –> sorbitol + NADP+ (enzima: glicose redutase NADPH-dependente)

O sorbitol é um derivado álcool da glicose cujo grupo C-1 aldeído é reduzido a álcool (‑CHO –> ‑CH2OH)

sorbitol + NAD+ –> frutose + NADH + H+ (enzima: sorbitol desidrogenase)

Em alguns casos pode haver uma capacidade limitada para manejar altas quantidades de frutose. Nesses casos, a capacidade do fígado para fosforilar frutose excede a capacidade para romper a frutose-1-fosfato produzida, por limitação da enzima aldolase (frutose-1-P –> dihidroxiacetona-P + gliceraldeído-3-P), de forma que se acumula frutose-1-P, segurando grupos Pi e diminuindo a produção de ATP na mitocôndria, o que pode resultar em disfunção hepática. O uso de frutose, bem como de sorbitol e xilitol na nutrição parenteral como sucedâneos de glicose está, portanto, desaconselhado, em falha hepática.

Quais são os principais substratos energéticos?

Os principais substratos energéticos que são obtidos da dieta são carboidratos, pro- teínas e gorduras. Quando esses substratos energéticos são oxidados a CO2 e H2Onas células, é liberada energia pela transferência de elétrons para o O2.

Quais são os três sistemas energéticos que fornecem energia para nos movimentarmos?

Três sistemas energéticos fornecem ATP para o trabalho muscular: o sistema de fosfocreatina, o sistema glicolítico anaeróbio e o sistema oxidativo.

Quais os substratos são utilizados em cada um dos três sistemas energéticos?

O substrato energético utilizado durante o exercício dependerá do tipo, intensidade e duração da atividade física. Dependendo da modalidade esportiva em questão basicamente três sistemas de fornecimento de energia estarão atuando para o desenvolvimento do indivíduo: ATP-CP; Sistema Anaeróbio; Sistema Aeróbio.

Qual é o principal substrato energético utilizado para fornecer energia em repouso?

Os carboidratos e gorduras, quando combinados com o oxigênio das células, constituem os principais substratos de energia durante o repouso.