Ir para CabeçalhoIr para MenuIr para conteúdo principalIr para Rodapé Jornalismo Por 01/04/2005
O que faz uma escola ser bem-sucedida? Como uma escola estadual do interior de Santa Catarina conseguiu dobrar de um ano para o outro a jornada de todos os alunos de2ª, 3ª e 4ª sériescom sucesso? Qual a receita de uma escola particular criada há 40 anos na capital de São Paulo para permanecer atual a ponto de ser considerada um centro de referência? Embora atuando em regiões diferentes e seguindo modelos educacionais distintos, ambas atribuem os bons resultados à mesma razão: a
proposta pedagógica, construída coletivamente e concretizada num bom planejamento. A proposta pedagógica é a identidade da escola: estabelece as diretrizes básicas e a linha de ensino e de atuação na comunidade. Ela formaliza um compromisso assumido por professores, funcionários, representantes de pais e alunos e líderes comunitários em torno do mesmo projeto educacional. O planejamento é o plano de ação que, em um determinado período, vai levar a escola a atingir suas metas. Do planejamento,
depois, sairão os planos de aula, adaptados ao cotidiano em classe. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de 1996 diz que a proposta pedagógica é um documento de referência. Por meio dela, a comunidade escolar exerce sua autonomia financeira, administrativa e pedagógica.Também chamada de projeto pedagógico, projeto político-pedagógico ou projeto educativo, a proposta pedagógica pode ser comparada ao que o
educador espanhol Manuel Álvarez chama de "uma pequena Constituição". Nem por isso ela deve ser encarada como um conjunto de normas rígidas. Elaborar esse documento é uma oportunidade para a escola escolher o currículo e organizar o espaço e o tempo de acordo com as necessidades de ensino. Além da LDB, a proposta pedagógica deve considerar as orientações contidas nas diretrizes curriculares elaboradas pelo Conselho Nacional da Educação e nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). Para Álvarez,
o ideal é que o documento seja o resultado de reflexão coletiva. E como chegar ao consenso? "Proporcionando espaços para que cada uma das partes exponha seus objetivos e interesses com base nos princípios educativos com os quais todos concordam", diz o educador. Esse esforço conjunto harmoniza as diferenças entre os grupos que compõem a escola. Um dos desafios para chegar a bom termo nessa elaboração, observa o educador francês Bernard Charlot, é manter a coerência entre a teoria e a prática.
"De que vale um discurso pedagógico do tipo construtivista e práticas que o contradizem?", questiona Charlot. Manter a proposta pedagógica e o planejamento escolar atualizados é a recomendação feita pela educadora Madalena Freire, de São Paulo. "Tanto a proposta como o planejamento são processuais e devem correr em paralelo com a construção do conhecimento", diz ela. Isso impede que os dois documentos se transformem em instrumentos engavetados, só revistos no fim do ano. Essa burocratização leva
muitos professores a considerar ambos como desnecessários e inviáveis. "O planejamento serve como roteiro para os professores, permitindo aplicar no dia-a-dia a linha de pensamento e ação da proposta pedagógica", afirma Ilza Martins Sant'Anna, professora da Faculdade Porto-Alegrense de Educação, Ciências e Letras. O que não significa determinar uma forma única de planejar todas as disciplinas: a avaliação dos erros e acertos é que vai permitir a melhor escolha. Para planejar, observa Madalena, é
importante cada professor dominar o conteúdo de sua matéria - mas isso de nada valerá se ele não escutar os alunos e não valorizar o que já conhecem. O professor deve sempre se perguntar: o que meus alunos já sabem? O que ainda não conhecem? O que, como e quando ensinar? Onde ensinar? Com base nas respostas, ele propõe atividades que façam sentido para os estudantes daquela comunidade. Se for uma aula de literatura, por exemplo, lembre-se de que os alunos de uma escola da periferia não têm o
mesmo contato com livros que os de uma escola de classe média. Você precisa valorizar o saber do grupo e, após cada atividade, refletir sobre sua prática. Em vez de atribuir aos alunos incapacidade de aprender, o ideal é que você analise as próprias inadequações ao ensinar. Geralmente feito no início do ano ou do semestre para abranger todo o período, o planejamento pede acompanhamento constante, na opinião de Madalena. O trabalho
deve ser reavaliado em reuniões quinzenais com a participação de toda equipe e sob a liderança do coordenador. Uma primeira avaliação geral pode ser feita no final do primeiro bimestre para corrigir desvios e lançar bases para o resto do período. Nesse momento, os professores checam se os conteúdos são fundamentais para o aprendizado; se há articulação entre os segmentos (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio); se as reuniões pedagógicas estão sendo bem aproveitadas e se o planejamento
favorece o envolvimento da família e da comunidade na escola. Veja, abaixo, as experiências de duas escolas bem-sucedidas. "Achamos importante substituir uma proposta de gabinete por outra que tivesse mais a cara da escola" Marilú Maldaner Ghiozi, diretora da Escola de Educação Básica Frei Nicodemos, em Lages (SC). Foto: Sandro Bohneberger
Escola Frei Nicodemos"Uma das vantagens do planejamento coletivo é a maior integração do trabalho dos docentes; o difícil é fazer uma idéia obter a aprovação da maioria"A Escola Estadual de Educação Básica Frei Nicodemos, em Lages (SC), foi aberta para receber filhos de trabalhadores que vivem num conjunto habitacional e em casas precárias que surgiram nos arredores. Mesmo com classes superlotadas,
era preciso oferecer educação de qualidade para combater a repetência e a evasão. Inglês, Informática e DançaA próxima tarefa era planejar o ano letivo com base no questionário respondido pelos pais. Eles queriam que a escola oferecesse ensino mais amplo - como língua estrangeira - já que não podiam pagar cursos extras. Por isso e pela baixa escolaridade da comunidade, a escola foi uma das escolhidas pelo governo para a implantação do projeto Escola Pública Integral (EPI). Decidiu-se em reuniões que a experiência começaria com classes de 2a, 3a e 4a séries. Enquanto eram realizadas obras para adaptar o prédio, a equipe pedagógica participava das reuniões de planejamento, conta a professora da 4a série, Rosires Duarte Chaves. Todos os professores levaram sugestões de projetos e decidiram como integrar o currículo às atividades extras. De comum acordo com os pais, foram escolhidas para compor o período integral aulas de Inglês, Informática e Dança. A escola ganhou laboratório de Ciências, brinquedoteca e salas para estudo orientado em Matemática e Língua Portuguesa. Em reuniões periódicas, novas sugestões apareceram para melhorar ou alterar as anteriormente aprovadas. Assim, ficou decidido que as atividades extras seriam alternadas com as curriculares e que o professor de classe deveria assumir todas as matérias do currículo básico, só deixando as novas atividades por conta de especialistas. As reuniões trimestrais passaram a ser quinzenais. "Nossa proposta pedagógica e nossa escola são uma só coisa; mas até ela ser formalizada demorou" Sylvia Gouvêa, diretora da Escola Nova Lourenço Castanho, em São Paulo. Foto: Gustavo Lourenção
Escola Lourenço Castanho"Planejar em equipe permite pensar mais sobre conteúdos, objetivos e procedimentos; as decisões são mais demoradas, mas o debate é proveitoso"A Escola Nova Lourenço Castanho, fundada em 1964 sob a inspiração de escolas experimentais da época, fica num bairro paulistano de classe média. No início, a filosofia da escola não estava no papel. "Tudo era muito informal", conta a diretora Sylvia Gouvêa. As sócias acreditam que educar é preocupar-se com a personalidade do aluno e suas necessidades, buscando o ensino comprometido com aspectos sociais. A Lourenço Castanho trouxe profissionais de outras áreas para dar palestras com o objetivo de se manter atualizada e para ajudar a equipe a entender melhor o público. Currículo integradoAs diretrizes do ensino são dadas pelo colegiado de cinco diretores pedagógicos. Eles acompanham o andamento em cada área e avaliam, junto com os professores, se o plano está cumprindo as metas gerais. A espinha dorsal do planejamento é atualizada com base nessas avaliações. Em História, por exemplo, os professores listam os conteúdos tendo como referência os PCN, o currículo estadual e os temas que estão em evidência na mídia."Cada um apresenta sua lista ao grupo", explica a professora de História da 6a série Lucila Vannucci Zwar. No ano passado, as turmas da 6a estudaram Império Romano, escravidão e religiões, entre outros tópicos. Como a escola trabalha com eixos temáticos, decidiu-se que a escravidão seria estudada também no Brasil Colônia e na atualidade. A cada passo, a equipe avalia se aquilo que está sendo ensinado está de acordo com os objetivos previstos na proposta pedagógica. O planejamento é constantemente revisto pela equipe. Os professores analisam o aproveitamento dos estudantes, o interesse por um conteúdo e se a aprendizagem provocou mudanças de comportamento (em relação a um preconceito, por exemplo). A cada semana os professores se reúnem, alternadamente, com todos os colegas da mesma série ou com os demais da sua disciplina. Tudo que ali acontece é registrado numa ata pelo coordenador pedagógico. A cada mês ou bimestre, há também uma reunião dos docentes da mesma área com o colegiado de diretores pedagógicos. Foi em uma dessas reuniões, lembra a diretora Sylvia, que se percebeu uma falha: em nenhuma série era dado um conteúdo específico sobre o estado de São Paulo, em que se situa a escola, o que logo foi corrigido. Características de uma boa proposta pedagógicaPara que o documento de sua escola seja eficaz, ele deve:- Ser resultado da discussão de toda a comunidade escolar. - Conter princípios pedagógicos que correspondam ao contexto e à prática da sala de aula dos professores. - Se adaptar sempre que houver mudanças no público, na realidade da comunidade e, com isso, nos objetivos do ensino. Características de um bom planejamentoPara que o planejamento contemple aprendizagens para todos, ele deve:- Operacionalizar os conteúdos fundamentais para a escola. - Garantir a articulação entre todos os segmentos escolares (desde a Educação Infantil até o Ensino Médio) e entre as áreas de conhecimento. - Prever tempo para formação docente e para reuniões pedagógicas. Quer saber mais? CONTATOS Escola Estadual de Educação Básica Frei Nicodemos, R. Canoinhas, s/n, 88505-240, Lages, SC, tel. (49) 222-5148 Escola Nova Lourenço Castanho, R. Lourenço Castanho, 273, 04507-110, São Paulo, SP, tel. (11)
3887-5781,www.lourencocastanho.com.br BIBLIOGRAFIA O Projeto Educativo da Escola, Manuel Álvarez (org.), 180 págs., Ed. Artmed, tel. 0800-7033444, 33 reais Avaliação e Planejamento, Madalena Freire, Ed. Espaço Pedagógico, tel. (11) 5505-1135, 12 reais continuar lendoVeja mais sobre:Em que ano começou a prática do conselho de classe no Brasil?Os Conselhos de Classe foram instituídos no Brasil em 1971 através da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional publicada naquele ano (Lei 5692/71) e ambos refletiam o autoritarismo característico da sociedade da época.
Porque o conselho de classe é importante?Esse conselho é responsável pelo processo coletivo de acompanhamento e avaliação do ensino – aprendizagem dos estudantes, possibilitando a inter-relação entre profissionais e alunos, entre turnos, entre séries e turmas, além de favorecer a integração e sequência dos conteúdos curriculares de cada série/classe.
Por que se afirma que a educação é uma ação ao mesmo tempo conservadora e inovadora?Para Bourdieu, a educação formal é reprodutora das contradições sociais e das desigualdades sociais e segue: “A educação é uma ação social ao mesmo tempo conservadora e inovadora: ela ajusta as gerações à ordem vigente e também dá subsídios para mudanças”.
Quais os critérios para a verificação do rendimento escolar?A LDB, ao se referir à verificação do rendimento escolar, determina que nós docentes observemos os critérios de avaliação contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais (Art. 24, V).
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