Como podemos conceber e imaginar a identidade a diferença é o pertencimento após a diáspora?

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Como podemos conceber e imaginar a identidade a diferença é o pertencimento após a diáspora?

Emeb Basiliano Do Carmo De Jesus

  • Como podemos conceber e imaginar a identidade a diferença é o pertencimento após a diáspora?
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como Benjamin, o colecionador, as descreve)
ao mesmo tempo em que esquadrinhamos a constelacSo
cheia de tensao que se estende diante de n6s, buscando a
linguagem, o estilo, que vai dominar o movimento e dar-Ihe
forma. Talvez seja mais uma questao de buscar estar em casa
aqui, no unico momento e contexto que temos...6
Que luz, entao, a experiencia da diaspora lanca sobre as
questoes da idencidade cultural no Caribe? Ja que esta e uma
questao conceitual e epistemologica, alem de empirica,_o
que a experiencia da diaspora causa a nossos modelos de
identidade cultural? Como podemos conceber ou imaginar a
identidade, a diferenca e o pertencimento, apos a diaspora?
Ja que "a identidade cultural" carrega consigo tantos tragos
de unidade essencial, unicidade primordial, indivisibilidade e
mesmice, como devemos "pensar" as identidades inscritas nas
relacoes de poder, construidas pela diferenca, e disjuntura?
Essencialmente, presume-se que a identidade cultural .seja,
fixada no nascimento, seja parte da natureza, impressa atraves
do parentesco e da linhagem dos genes, seja constitutiva de
nosso eu mais interior. E impermeave! a algo tao "mundano",
secular e superficial quanto uma mudanga temporaria de
nosso local de residencia. A pobreza, o subdesenvolvimento,
a falta de oportunidades — os legados do Imperio em toda
parte — podem forgar as pessoas a migrar, o que causa o
espalhamento — a dispersao. Mas cada disseminacao carrega
consigo a promessa do retorno redentor.
'Essa interpretacao potente do conceito de diaspora e a
mais familiar entre os povos do Caribe. Tornou-se parte do
nosso recem-construido senso coletivo do eu, profundamente
inscrita como subtexto em nossas historias nacionalistas.
E modelada na historia moderna do povo judeu (de onde o
termo "diaspora" se derivou), cujo destine no Holocausto
— um dos poucos episodios historico-mundiais comparaveis
em barbaric com a escravidao moderna — e bem conhecido.
Mais significante, entretanto, para os caribenhos 6 a versao
da hist6ria no Velho Testamento. La encontramos o analogo,
crucial para a nossa historia, do "povo escolhido", violenta-
mente levado a escravidao no "Egito"; de seu "sofrimento"
nas maos da "Babilonia"; da lideranca de Moises, seguida
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pelo Grande Exodo — "o movimento do Povo de Jah"
que os livrou do cativeiro, e do retorno a Terra Prometida.
Esta € a wr-origem daquela grande narrativa de liberta^ao
esperanca e redencao do Novo Mundo, repetida continua-
mente ao longo da escravidao — o Exodo e o Freedom Ride.1
Ela tem fornecido sua metafora dominante a todos os dis-
cursos libertadores negros do Novo Mundo. Muitos creem
que essa narrativa do Velho Testamento seja muito mais
potente para o imaginario popular dos povos negros do Novo
Mundo do que a assim chamada estoria do Natal. (De fato,
naquela mesma semana em que esta palestra foi proferida
no campus Cave Hill da UWI, o jornal Barbados Advocate
— antecipando as comemoracoes da independencia — atri-
buiu os tftulos honorarios de "Moises" e "Aarao" aos "pais
fundadores" da independencia de Barbados, Errol Barrow e
Cameron Tudor!)
Nessa metafora, a historia — que se abre a liberdade por
ser contingent^ — e representada como teleologica e reden-
tora: circula de volta a restauracao de seu momento origi-
nario, cura toda ruptura, repara cada fenda atraves desse
retorno. Essa esperanca foi condensada, para o povo cari-
benho, em uma espe"cie de mito fundador. Pelos padroes
usuais, trata-se de uma grande visao. Seu poder — mesmo
no mundo moderno — de remover montanhas jamais deve
ser subestimado.
Trata-se, e claro, de uma concepcao fechada de "tribo",
diaspora e patria. Possuir uma identidade cultural nesse
sentido e estar primordialmente em contato com um nucleo
imutavel e atemporal, ligando ao passado o future e o
presente numa linha ininterrupta. Esse cordao umbilical e o
que chamamos de "tradicao", cujo teste e o de sua fidelidade
as origens, sua presenca consciente diante de si mesma, sua
"autenticidade". E, claro, um mito — com todo o potencial
real dos nossos mitos dominantes de moldar nossos imagi-
narios, influenciar nossas a^oes, conferir significado as
nossas vidas e dar sentido a nossa historia.
Os mitos fundadores sao, por definicao, transistoricos: nao
apenas estao fora da historia, mas sao fundamentalmente
aistoricos. Sao anacronicos e tem a estrutura de uma dupla
inscric.ao. Seu poder redentor encontra-se no futuro, que
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ainda esta por vir. Mas funcionam atribuindo o que predizem
a sua descrigao do que ja aconteceu, do que era no principle.
Entretanto, a historia, como a flecha do Tempo, e sucessiva,
senao linear. A estrutura narrativa dos mitos e ciclica. Mas
dentro da historia, seu significado € frequentemente trans-
formado- E justamente essa concepcao exclusiva de patria que
levou os servios a se recusarem a compartilhar seu territdrio
— como tern feito ha seculos — com seus vizinhos muful-
manos na Bosnia e justificou a limpeza etnica em Kosovo.
E uma versao dessa concepcao da diaspora judia e de seu
anunciado "retorno" a Israel que constitui a origem da disputa
com seus vizinhos do Oriente Me'dio, pela qual o povo pales-
tino tem pago um prec.o tao alto, paradoxalmente, com sua
expulsao de uma terra que, afinal, tambem e sua.
Aqui entao situa-se o paradoxo. Agora nossos ma-les
comegam. Um povo nao pode viver sem esperanc.a. Mas
surge um problema quando interpretamos tao literalmente
as nossas metaforas. As questoes da identidade cultural na
diaspora nao podem ser "pensadas" dessa forma.8 Elas tem
provado ser tao inquietantes e desconcertantes para o povo
caribenho justamente porque, entre nos, a identidade e
irrevogavelmente uma questao historica. Nossas sociedades
sao compostas nao de um, mas de muitos povos. Suas
origens nao sao unicas, mas diversas. Aqueles aos quais
originalmente a terra pertencia, em geral, pereceram ha muito
tempo — dizimados pelo trabalho pesado e a doenga. A terra
nao pode ser "sagrada", pois fbi "violada" — nao vazia, mas
esvaziada. Todos que estao aqui pertenciam originalmente a
outro lugar. Longe de constituir uma continuidade com
os nossos passados, nossa relacjio com essa historia esta
marcada pelas rupturas mais aterradoras, violentas e
abruptas. Em vez de um pacto de associagao civil lenta-
mente desenvolvido, tao central ao discurso liberal da
modernidade ocidental, nossa "associac,ao civil" foi inaugu-
rada por um ato de vontade imperial. O que denominamos
Caribe renasceu de dentro da violencia e atraves dela. A via
para a nossa modernidade esta marcada pela conquista,
expropriate, genocidio, escravidao, pelo sistema de engenho
e pela longa tutela da dependencia 'colonial. Nao e de
surpreender que na famosa gravura de van der Straet que
mostra o encontro da Europa com a America (c. 1600),
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Americo Vespucio e a figura masculina dominante, cercado
pela insignia do poder, da ciencia, do conhecimento e da
religiao: e a "America" e, como sempre, alegorizada como
uma mulher, nua, numa rede, rodeada pelos emblemas de
uma — ainda nao violada — paisagem exotica.
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Nossos povos tem suas raizes nos — ou, mais precisa-
mente, podem tracar suas rotas a partir dos — quatro cantos
do globo, desde a Europa, Africa, Asia; foram forc.ados a se
juntar no quarto canto, na "cena primaria" do Novo Mundo.
Suas "rotas" sao tudo, menos "puras". A grande maioria
deles e de descendencia "africana" — mas, como teria dito
Shakespeare, "norte pelo noroeste".10 Sabemos que o termo
"Africa" e, em todo caso, uma construcao moderna, que se
refere a uma variedade de povos, tribos, culturas e linguas
cujo principal ponto de origem comum situava-se no trafico
de escravos. No Caribe, os indianos e chineses se juntaram
mais tarde a "Africa": o trabalho semi-escravo [indenture]
entra junto com a escravidao. A distinc.ao de nossa cultura
e manifestamente o resultado do maior entrelagamento e
fusao, na fornalha da sociedade colonial, de diferentes
elementos culturais africanos, asiaticos e europeus.
Esse resultado hibrido nao pode mais ser facilmente

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Quais são as três concepções de identidade defendidas por Stuart Hall?

Stuart Hall (2000), professor de sociologia da Open University e conhecido teórico dos Estudos Culturais, cita três concepções de identidade: a do sujeito do Iluminismo, a do sujeito sociológico e a do sujeito pós-moderno.

O que Stuart Hall entende por identidade cultural na Pós

Em seu livro A identidade cultural na pós-modernidade, publicado em 1992, Hall traça um panorama histórico ao redor da compreensão da identidade em diferentes momentos, demonstrando como as transformações sociais, advindas da modernidade, produzem profundos efeitos à maneira pela qual o indivíduo entende a si mesmo e é ...

O que é identidade Segundo Hall?

A identidade torna-se uma “celebração móvel”: formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam (Hall, 1987). É definida historicamente, e não biologicamente.

Qual é a teoria de Stuart Hall?

Conforme Hall (2002), se a linguagem atribui sentido, os significados só podem ser partilhados pelo acesso comum à linguagem, que funciona como sistema de representação. Desse modo, a representação através da linguagem é central para os processos pelos quais é produzido o significado.