Qual o recurso cabível da decisão que não recebe o aditamento da denúncia?

Qual o recurso cabível da decisão que não recebe o aditamento da denúncia?

Imagine que você esteja sendo acusado de um fato ocorrido no dia X. Você recebe o mandado de citação sobre a acusação relativa a esse fato. Prontamente se dirige ao seu advogado de confiança e vocês elaboram uma estratégia de defesa em relação a esse fato, indicando testemunhas e pedindo demais provas.

Anos depois, a audiência é designada e você comparece, em conjunto com o seu advogado, prontos para seguirem a estratégia defensiva elaborada. Contudo, logo após a vítima ser ouvida, o Ministério Público, que é a instituição que te acusa no processo, pede a palavra para alterar a acusação, dizendo que, na verdade, o fato ocorreu em outra data, cerca de 1 (um) ano após a data anteriormente mencionada, alegando ter havido “equívoco”.

Diante disso, parece-lhe justo que o Juiz siga com o processo da forma que está, sem possibilitar ao seu advogado um prazo para que você e ele elaborem uma nova estratégia de defesa, com base nessa nova data, podendo indicar novas testemunhas de defesa, se necessário, e até mesmo ouvindo novamente a vítima?

Pois é. Creio que você concorda comigo. A resposta é negativa. Não é justo. Atento a essa possibilidade, o legislador estabeleceu o seguinte no art. 384 do Código de Processo Penal:

Art. 384.  Encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica do fato, em conseqüência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação, o Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se a termo o aditamento, quando feito oralmente.

(…) § 2o  Ouvido o defensor do acusado no prazo de 5 (cinco) dias e admitido o aditamento, o juiz, a requerimento de qualquer das partes, designará dia e hora para continuação da audiência, com inquirição de testemunhas, novo interrogatório do acusado, realização de debates e julgamento.

(…) § 4o  Havendo aditamento, cada parte poderá arrolar até 3 (três) testemunhas, no prazo de 5 (cinco) dias, ficando o juiz, na sentença, adstrito aos termos do aditamento.  

Código de Processo Penal

A solução para o problema é clara: se o Ministério Público apresentar aditamento à denúncia, o Juiz deve conceder à defesa o prazo de 5 (cinco) dias para se manifestar e, só após isso, deve decidir se vai ou não aceitar o aditamento. Se aceitar o aditamento, o Juiz, então, deve abrir novo prazo de 5 (cinco) dias para que cada parte, Ministério Público e defesa, arrolem testemunhas.

É o que se extrai da literalidade da lei, a meu ver.

Contudo, em caso recente, aconteceu exatamente a situação hipotética descrita no exemplo que mencionei. Após a oitiva da vítima, o MP pediu o aditamento. O Juiz ouviu a defesa, exercida por mim, e pedi prazo para apresentar novas razões diante da nova data apontada pelo MP, bem como também para eventualmente arrolar novas testemunhas. Em audiência, o Juiz negou o meu pedido. Estamos indo para alegações finais, onde estou levantando a nulidade da decisão do Juiz que recebeu o aditamento, pelos motivos expostos e também por alguns outros.

Você pode conferir a minha manifestação oral em audiência no vídeo abaixo:


Link deste post no meu site:

👨🏻‍💼 Advogado, professor e autor de artigos jurídicos.

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que inexiste violação dos princípios da ampla defesa e do devido processo legal quando o aditamento da denúncia não acarreta modificação substancial da acusação nem agrava a imputação.

A decisão teve como relator o ministro João Otávio de Noronha:

Ementa

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. DENÚNCIA. REQUISITOS DO ART. 41 DO CPP ATENDIDOS COM RELAÇÃO AO PRIMEIRO RECORRENTE. CRIME OMISSIVO IMPRÓPRIO ATRIBUÍDO À CORRÉ (SEGUNDA RECORRENTE). IMPUTAÇÃO GENÉRICA. INÉPCIA DA DENÚNCIA. NULIDADE DO PROCESSO POR AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO ACUSADO APÓS ADITAMENTO DA PEÇA ACUSATÓRIA. PREJUÍZO NÃO VERIFICADO. INEXISTÊNCIA DE ALTERAÇÃO SUBSTANCIAL. PAS DE NULLITÉ SANS GRIEF. ADITAMENTO LIMITADO À INCLUSÃO DA CORRÉ NO PROCESSO. NULIDADE AFASTADA. 1. A propositura de ação penal exige a presença de indícios mínimos e suficientes de autoria e materialidade. A certeza será eventualmente comprovada durante a instrução probatória, prevalecendo, na fase de oferecimento da denúncia, o princípio do in dubio pro societate. 2. A denúncia deverá conter a exposição do fato criminoso com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado e a classificação do crime, sob pena de ser considerada inepta por impedir o exercício da ampla defesa do réu. 3. O trancamento prematuro da ação penal pela via estreita do habeas corpus é medida cabível nos casos em que a denúncia se mostrar inepta, não atendendo ao que dispõe o art. 41 do Código de Processo Penal. 4. O reconhecimento de nulidade no processo penal exige a comprovação do efetivo prejuízo suportado pelo réu, não servindo a tanto simples questionamentos sobre a ausência de determinada formalidade na sua execução. Aplicação do princípio pas de nullité sans grief, previsto no art. 563 do CPP. 5. Inexiste violação dos princípios da ampla defesa e do devido processo legal quando o aditamento da denúncia não acarreta modificação substancial da acusação nem agrava a imputação. 6. Recurso ordinário em habeas corpus parcialmente provido. (RHC 95.818/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUINTA TURMA, julgado em 05/10/2021, DJe 08/10/2021)

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Qual o recurso cabível da decisão que não recebeu a denúncia?

I - que não receber a denúncia ou a queixa; decisão que não recebe ou que rejeita a denúncia cabe recurso em sentido estrito”. Nesse sentido, seguem julgados do Supremo Tribunal Federal: EMENTA: AÇÃO PENAL.

É cabível interpor recurso em sentido estrito da decisão de recebimento da denúncia?

4. Da decisão que recebe a denúncia ou confirma o seu recebimento, após a análise da defesa apresentada pelo réu, não cabe o recurso em sentido estrito diante da ausência de previsão expressa no art. 581 do CPP .

Qual o prazo concedido ao Ministério Público para o aditamento da denúncia bem como para a defesa se manifestar?

2o O prazo para o aditamento da queixa será de 3 dias, contado da data em que o órgão do Ministério Público receber os autos, e, se este não se pronunciar dentro do tríduo, entender-se-á que não tem o que aditar, prosseguindo-se nos demais termos do processo.

Qual o recurso cabível contra a decisão que no procedimento comum ordinário rejeita a denúncia e a queixa?

581, I, do Código de Processo Penal. Assim, contra decisão que rejeita a denúncia ou queixa, cabe recurso em sentido estrito.