Revista: Caribeña de Ciencias SocialesISSN: 2254-7630ASSOCIAÇÕES QUILOMBOLAS E RESISTÊNCIA À AGROINDÚSTRIA DO DENDÊ NA AMAZÔNIA PARAENSE Show
Autores e infomación del artículoLissandra Cordeiro Ribeiro* Heribert Schmitz** Universidade Federal do Pará. Brasil
Resumo O artigo teve como objetivo analisar a resistência de associações quilombolas à agroindústria do dendê no município de Concórdia do Pará. As políticas goveridntais ligadas à produção sustentável de agrocombustível concretizaram-se no âmbito do Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB), criado no ano de 2005, e incentivaram a instalação de várias empresas produtoras de dendê no Nordeste Paraense. Devido às profundas mudanças causadas nos primeiros anos de expansão da dendeicultura, surgiram vários conflitos sociais nessa região e se desenvolveu uma forte resistência, especialmente das associações quilombolas, tendo como objetos de discordância a entrada da dendeicultura nas comunidades. O referencial teórico baseia-se no tema da resistência e a metodologia de pesquisa foi qualitativa com observação participante e entrevistas semi-estruturadas com os principais representantes das associações. Os resultados indicam que as associações desenvolveram ações de resistência envolvendo as mídias regional e nacional, pressionando políticos e órgãos goveridntais e pela mobilização nas comunidades quilombolas por meio de reuniões com os camponeses, discutindo com eles os riscos e problemas advindos da agroindústria, e que conseguiram alcançar, parcialmente, alguns dos seus objetivos relacionados à compra de terras, à situação dos assalariados na dendeicultura, à suspeita de poluição de igarapés e à integração por contrato de agricultores familiares à agroindústria. Palavras-Chave: Comunidades quilombolas, Dendeicultura, Resistência, Agroindústria, Amazônia Paraense. Resumen El artículo tuvo como objetivo analizar la resistencia de asociaciones quilombolas a la agroindustria del dendê en el municipio de Concordia do Pará. Las políticas guberidntales ligadas a la producción sustentable de agrocombustible se concretaron en el ámbito del Programa Nacional de Producción y Uso de Biodiesel (PNPB), creado en el año 2005, e incentivaron la instalación de varias empresas productoras de palma aceitera en el Nordeste Paraense. Debido a los profundos cambios causados en los primeros años de expansión de la palma aceitera, surgieron varios conflictos sociales en esa región y se desarrolló una fuerte resistencia, especialmente de las asociaciones quilombolas, teniendo como objetos de desacuerdo la entrada de la dendicultura en las comunidades. El referencial teórico se basa en el tema de la resistencia y la metodología de investigación fue cualitativa con observación participante y entrevistas semiestructuradas con los principales representantes de las asociaciones. Los resultados indican que las asociaciones desarrollaron acciones de resistencia involucrando a los medios regional y nacional, presionando a políticos y organismos guberidntales y por la movilización en las comunidades quilombolas a través de reuniones con los campesinos, discutiendo con ellos los riesgos y problemas provenientes de la agroindustria, y que lograron en parte, algunos de sus objetivos relacionados con la compra de tierras, la situación de los asalariados en la dendicultura, la sospechosa de contaminación de igarapés y la integración por contrato de agricultores familiares a la agroindustria. Palabras clave: Comunidades quilombolas, la cultura de palma, Resistencia, Agronegocio, Amazon Paraense. Abstract The objective of this article is to analyze the resistance of quilombola associations to the oil palm industry in the municipality of Concórdia do Pará. Government policies related to sustainable agrofuel production were implemented within the framework of the National Program for the Production and Use of Biodiesel (PNPB), created in 2005, and encouraged the installation of several companies producing palm oil in the Northeast of Para. Due to the profound changes caused in the first years of the expansion of the oil palm cultivation, several social conflicts arose in this region and a strong resistance was developed, especially by the quilombolas associations, having as objects of disagreement the entrance of the palm oil cultivation in the communities. The theoretical framework is based on the theme of resistance and the research methodology was qualitative with participant observation and semi-structured interviews with the main representatives of the associations. The results indicate that the associations developed resistance actions involving the regional and national media, lobbying politicians and government agencies and mobilizing in the quilombola communities through meetings with the peasants, discussing with them the risks and problems arising from the agroindustry, and that succeeded achieve some of its objectives related to the purchase of land, the situation of the wage earners in the oil palm cultivation, the suspicion of pollution of streams and the contract farming of the peasants. Keywords: Oil palm cultivation. Quilombola communities. Resistence, Agribusiness, Amazon Paraense. Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato: Lissandra Cordeiro Ribeiro y Heribert Schmitz (2018): “Associações quilombolas e resistência à agroindústria do dendê na amazônia paraense”, Revista Caribeña de Ciencias Sociales (mayo 2018). En línea:
As agroindústrias, ou Agronegócio como é popularmente conhecido derivado do termo Agrobusiness tomam papel fundamental na produção do bio-diesel. Na Amazônia, a oleaginosa introduzida na região para produção de bio-diesel é o dendezeiro (Elaeis guineenses), palmeira de origem africana. Nesta região, o avanço da agroindústria por meio da compra e venda de terras tem ameaçado os territórios tradicionalmente ocupados por
comunidades quilombolas. Essa disputa tem gerado conflitos variados, sejam eles agrários, ambientais ou sociais, o que coloca a questão dos direitos quilombolas em debate e propicia a mobilização das organizações e movimentos sociais que os representam. A nova estratégia do discurso dos movimentos sociais no campo, ao designar os sujeitos da ação, não aparece atrelada à conotação política que em décadas passadas estava associada principalmente ao termo “camponês”. Politiza-se aqueles termos e denominações de uso local. Seu uso cotidiano e difuso coaduna com a politização das realidades localizadas, isto é, os agentes sociais se erigem em sujeitos da ação ao adotarem como designação coletiva as denominações pelas quais se autodefinem e são representados na vida cotidiana (ALMEIDA, 2008: 80). As considerações de Almeida acima permitem compreender, que no século XXI, uma das estratégias das sociedades camponesas para não perderem a autonomia em seus territórios e garantirem sua reprodução social é a retomada política de elementos que caracterizam uma identidade, reivindicando junto ao Estado políticas públicas específicas. 2- ASSOCIAÇÃO QUILOMBOLA E A LÓGICA DA AÇÃO COLETIVA
A discussão sobre as práticas de cooperação entre os indivíduos, especificamente na formação de grupos coletivos, postulou-se como uma alternativa eficaz à formulação da "tragédia dos bens comuns" suscitada por Hardin (1968). Para ele, a exaustão dos recursos naturais se dá pela forma como cada indivíduo age pensando em ganho próprio, essa racionalidade individual sobreposta ao bem comum provocaria uma perda para todos. Ainda que todos os indivíduos num grupo sejam racionais e egoístas, mão é o facto de todos se beneficiarem da concretização do objetivo do grupo que o leva a agir de forma a atingir esse objetivo. Na verdade, os indivíduos não agem com vista aos seus objetivos comuns ou com vista aos interesses dos grupos, a não ser que o número de indivíduos seja muito pequeno ou que haja coerção ou qualquer outro estratagema especial que os leve a agir com vista a esse interesse comum (OLSON, 1998: p.2). Para viabilizá-la, “[...] a ação coletiva necessita de elementos estruturantes, que permitam aos participantes engajar-se [...]” (SCHMITZ et al., 2017, p. 203, como também Lüchmann (2014: 165) destaca no caso do associativismo de organizações não goveridntais, “[...] sindicatos, partidos políticos, igrejas, associações de natureza diversa”. A autora enfatiza: O associativismo é um elemento importante na medida em que desloca as atribuições dos problemas e condições do plano pessoal para o coletivo [...]. Assim, em associação, as pessoas desenvolvem sentidos e percepções da vida social que transcendem a dimensão individual e pessoal (LÜCHMANN, 2014: 165). Fernandes (2005) parte dos conceitos de território e espaço para pensar os movimentos sociais, chamados por ele de movimentos socioterritoriais e movimentos socioespaciais. O autor não está interessado na definição, formas de organização ou relações sociais que caracterizam um movimento social, mas sim como eles produzem espaços e territórios. Esclarece, portanto que, Os movimentos socioterritoriais tem o território não só como trunfo, mas este é essencial para sua existência. Os movimentos camponeses, os indígenas, as empresas, os sindicatos e os estados podem se construir em movimentos socioterritoriais e socioespaciais. Por que criam relações sociais para tratarem diretamente de seus interesses e assim produzem seus próprios espaços e territórios. As organizações não goveridntais se constituem apenas como movimentos socioespaciais. Estas são agencias de mediação, uma vez que as Ongs são sempre representações da reivindicação, de espaços e ou de territórios. Não são sujeitos reivindicando um território. Não existem a partir de um território. São sujeitos reivindicando espaços, são entidades de apoio ou contrárias aos movimentos socioterritoriais e socioespaciais, são agencias intermediárias, que produzem espaços políticos e se especializam (FERNANDES, 2005: 31). Os movimentos socioespaciais, não possuem território definido, é o caso de entidades intermediadoras, como as Ongs que defendem por
exemplo, o território indígena ou quilombola, esses sim possuem territórios definidos e que podem se caracterizar como movimentos socioterritoriais (FERNANDES, 2005). Podemos pensar o movimento das associações quilombolas como socioterritoriais, pois partem do território não só como meio de reivindicação, mas também de asseguramento de direitos. Scott (2013) desenvolveu uma abordagem sobre a resistência não institucionalizada, não aberta, a chamada resistência cotidiana. É um estratégia que comunidades tradicionais, como as quilombolas, utilizam para proteger os seus territórios e garantir as suas condições de vida, sem estar vinculadas a ações formais de
associações ou sindicatos. Contudo, esses grupos desenvolvem também formas de resistências abertas desempenhadas pela ação coletiva. Ambas as formas podem acontecer juntas no mesmo processo ou separadas. Se a primeira não necessita de ação formal ou institucionalizada, a segunda se define por uma resistência “[...] organizada, sistemática e cooperativa” (SCOTT, 2002: 25). A gente andava nas comunidade explicando e alertando o pessoal, por que eles chegaram entrando, comprando terra adoidado aí, eles vinham enganavam os pobrezinhos, querendo pagar 15 mil num lote, quem nunca nem viu 5 mil né? Vendo 15, aí venderam, foram morar naquelas favelinhas de Bujaru e indo trabalhar como peão na [empresa]. Outra coisa, o trabalho muito pesado lá, no início, que era pra cavar aqueles buraco fundo pra muda de dendê teve muita gente que não aguentou, outra coisa foi o desmatamento, o pessoal disse que acharam muita caça morta, né? Veado, tatu, por que eles io desmatando onde esses animais iam se refugiar? (S. B., líder da Arquinec, 2016). É possível perceber a partir do depoimento acima que a chegada da agroindústria provocou novos
arranjos na região. Muitos moradores das áreas rurais venderam suas terras aos representantes da empresa e posteriormente, vieram a trabalhar como assalariados na agroindústria. Nahum e Santos (2014) entendem o assalariamento e o sistema de integração3 de agricultores familiares junto às empresas como um processo de descampesinização, ou seja, a criação de um campo
sem camponeses, seja pelo fato do trabalho na roça4 ser comprometido, seja pela integração à lógica capitalista. Eles invadiram bastante onde eles percebiam que dava pra comprar, que a família não aceitava a associação como uma forma de organização protetora, eles compraram as terras, entraram até no que puderam, mas o que restou a gente ta aí resistindo pra continuar. A falta de titulação é um grande problema, se ta titulada, tá definida pelo Governo Federal, se tá só certificada a gente encontra uma brecha podemos dizer assim, qualquer pessoa que queira entrar aqui que não seja da comunidade, entra com facilidade (E.B., líder da Arquic, 2015). A titulação e a manutenção das terras com títulos quilombolas continua sendo principal reivindicação dessas comunidades na Amazônia. No segundo Encontro Estadual de Quilombos no Pará, em 2008, identificou-se problemas enfrentados pelos participantes como: falta de titulação, falta de documentação necessária para o processo de regularização, falta de ação e morosidade dos órgãos
fundiários e ambientais, falta de antropólogos, excesso de burocracia (SANTANA, 2010). A associação tem brigado muito por isso, em defender a terra, defender seu espaço o seu único local como meio de sobrevivência e fomos até a gerencia da [empresa] que tava com essa estratégia de agricultura familiar, de enganar as nossas famílias e nós batemos o pé. Com uma coordenação formada aqui, chegamos lá e dissemos que nós não queríamos, se eles viessem pra cá, nós dissemos que nós íamos tomar nossas providencias da igualdade racial, através das leis federais, aparado pela Constituição de 1988, enquanto a isso até agora eles estão respeitando (E. B., líder da Arquic, 2015). É possível perceber que as associações desempenharam um tipo de resistência que Scott (2013) chama de resistência aberta ou declarada, quando a insatisfação de uma das partes é exposta no palco do poder. A Coordenação Estadual das Associações das Comunidades Remanescentes de Quilombo do Pará, a Malungu, tem se mantido decididamente contra o avanço de grandes empresas em áreas quilombolas, não somente da dendeicultura, mas também de fazendas e empresas mineradoras. Um dos representantes da organização comenta os desafios enfrentados pelo movimento nos últimos anos, explicando que, A Malungu tem travado uma batalha muito grande. O Agronegócio chega com uma proposta maravilhosa, que gera emprego pra todo mundo e sem contar que o movimento social se articula e eles desarticulam, pegam na fragilidade do povo. Onde se planta o dendê, a raíz dele se une e não se planta mais nada, é horrível, é horrível. E as comunidades vão se arrebentando. Aí você ver o relato do povo na frente do superintendente do Incra e ele com aquele sorriso dizendo: Pessoal a gente não tem dinheiro, não tem dinheiro. Então a gente ver uma bancada ruralista muito forte, o corte de orçamento, a morosidade do governo federal, o descaso dos nossos representantes na Câmara Federal e Senadores, o descaso da nossa presidenta, né? Então, a gente não tem isso realmente. A nosso proposta do movimento social é radicalizar mesmo, totalmente, pra vê se a gente consegue alguma coisa (H. M., membro da Malungu, no Simpósio Regional realizado no 6 de maio de 2016). Diante desses adversários poderosos, a Malungu e as associações locais desenvolveram várias formas de resistência aberta, como envolver as mídias regional e nacional e pressionar políticos (vereadores, deputados) e órgãos do governo estadual. A resistência ocorreu também pela mobilização nas comunidades quilombolas, discutindo com os camponeses os
riscos e problemas advindos com a agroindústria. Conseguiram alcançar, parcialmente, alguns dos seus objetivos. 4- CONSIDERAÇÕES FINAIS O setor agroindustrial no mundo, associado ao discurso sustentável de utilização de novas fontes enérgeticas ampliou a produção de agrocombustíveis. No Brasil, alguns programas do Governo Federal como o Programa Nacional do Álcool, na década de 1970, buscou intensificar a produção de álcool para a substituição da gasolina a partir da matéria prima da cana-de-açúcar. Como parte desta atividade econômica, as agroindústrias representadas pelas grandes usinas adquiriram maior
concentração de terras e aprofundaram a monocultura no País (SANTOS; SUZUKI, 2010). 5- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS HARDIN, G. The tragedy of the commons. Science 162:1244-8, 1968 IBGE. Concórdia do Pará. 2018. Disponível em: <https://cidades.ibge.gov.br/brasil/pa/concordia-do-para/panorama>.
Acesso em: 3 abr. 2018. SCHMITZ, H. (2013): Desenvolvimento sustentável da Amazônia, camponeses e uso da terra: a produção científica de
Thomas Hurtienne desde 1994. Novos Cadernos Naea, Belém, v. 16, n. 2, p. 341-357, jun. 2013. Disponível em: <http://www.periodicos.ufpa.br/index.php/ncn/article/view/1477>. Acesso em: 6 abr. 2018. DOI: http://dx.doi.org/10.5801/ncn.v16i2.1477. *Graduada em Geografia e Mestre pelo Programa de Pós- Graduação em Agriculturas Amazônicas-UFPA, Professora de Geografia na Faculdade Integrada Brasil Amazônia. Nota Importante a Leer: Qual a importância para as comunidades quilombolas?Elas simbolizam a resistência a diferentes formas de dominação. Essas comunidades mantêm forte ligação com sua história e trajetória, preservando costumes e cultura trazidos por seus antepassados.
Qual a importância das comunidades remanescentes de quilombos e quilombolas para o nosso país?As comunidades quilombolas além de contar a história, mantêm tradições seculares como, por exemplo, o congado e rosário. Além das religiões de matriz africana. “Os quilombos fazem parte da manutenção da nossa história e da cultura brasileira.
Quais são as principais atividades realizadas pelos quilombolas?O funcionamento dos quilombos considerava a tradição dos escravos fugidos que neles habitavam. Nessas comunidades, se realizavam atividades diversas como agricultura, extrativismo, criação de animais, exploração de minério e atividades mercantis. Nesses locais, os negros tratavam de reviver suas tradições africanas.
Que atividades a maioria das comunidades quilombolas práticas para sobreviver?Extrativismo, artesanato, produção cultural, turismo de base comunitária e a venda de produtos feitos a partir de matérias primas produzidas pela comunidade também contribuem para complementar a renda.
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