Como ficou a situação da burguesia depois da implantação da monarquia parlamentar em inglês?

Com os Descobrimentos, Portugal e Espanha eram os Estados mais poderosos da Europa, enriquecidos pelo comércio de produtos coloniais e munidos de fortes exércitos e frotas que detinham a hegemonia dos mares. A ascensão dos Países Baixos, após a sua revolução burguesa no decurso do século XVI, permitiu que a Holanda ameaçasse a supremacia ibérica e se transformasse na mais rica e influente potência comercial. Na Holanda, foram largamente desenvolvidas as manufaturas, e a nível do comércio externo passou a tomar conta da quase totalidade do comércio à escala mundial, ganhando o nome de "senhora dos mares". Era como que a dignificação do estatuto de um grupo dinâmico designado, muitas vezes, pelas outras nações como "os carroceiros do mar".
Contudo, em meados do século XVII a supremacia holandesa foi destronada pela Inglaterra e os "cães do mar" vieram substituir os "senhores do mar". A responsável por esta troca de posições era a próspera burguesia inglesa, enriquecida pelas armas, pela pirataria e pelo tráfico negreiro. Nesta época, verificou-se um grande desenvolvimento dos setores industrial e agrícola na Inglaterra, fomentado por uma burguesia empreendedora, cuja atuação era travada pelo sistema corporativo e pelo poder da monarquia. A implementação de programas de desenvolvimento da indústria encontrava algumas restrições nos grémios de raiz medieval, protegidos pela coroa, mas no Sul do território desenvolviam-se as manufaturas produtoras de tecidos de lã, que empregavam muitos operários e exigiam muita matéria-prima, o que desencadeou a expansão da criação de gado lanífero.
No setor agrícola, o Sudeste da Inglaterra conhecia transformações; além dos camponeses censitários, havia um novo grupo de agricultores, os yeomen, proprietários independentes que passaram a grandes latifundiários. Estes usavam nas suas terras mão de obra assalariada, para rentabilizar a sua terra, e apostavam na criação de gado e na produção de cereais, que vendiam nos mercados das cidades. Foram estes homens dinâmicos que se introduziram nos esquemas e circuitos económicos ingleses, e que passaram a compor a nova burguesia, muito relacionada com o antigo grupo mercantil e que, para além das suas atividades tradicionais, também se envolveu no desenvolvimento manufatureiro.
No Sul viviam também pobres camponeses, em cottages - daí o seu nome cottagers -, que muitas vezes trabalhavam como jornaleiros para os yeomen. Os senhores herdeiros da tradição feudal viviam nas áreas menos desenvolvidas do Norte e do Oeste da Inglaterra, onde criavam gado e se dedicavam aos trabalhos agrícolas, segundo os velhos métodos.
Muitos camponeses viram-se desapropriados das suas terras (um dos efeitos do primeiro movimento das "enclosures") e engrossaram as fileiras de vagabundos e indigentes, que muito preocupavam as autoridades, altamente repressoras para com estes pobres. Outros grupos descontentes com a sua situação eram os cottagers, que queriam também ser proprietários, e os yeomen, que pretendiam a redução das taxas a pagar e o fim dos abusos perpetrados pelos latifundiários, a quem acusavam de entravar o desenvolvimento.
Em 1603, a dinastia Tudor deu lugar à dinastia Stuart. Jaime Stuart da Escócia assumiu o poder na Inglaterra e passou a governar sem o Parlamento, facto que se viria a repetir com o seu sucessor, Carlos I. O rei impunha impostos à população, um exemplo seguido pela Igreja, que por sua vez sobrecarregava os camponeses com o pagamento da dízima e rendas rústicas. Saliente-se que tudo isto era feito à revelia do Parlamento, que até então deveria ser obrigatoriamente consultado em situações deste género.
Carlos I chegou mesmo a dissolver o Parlamento por um prazo de onze anos, e tentou restabelecer o poder absoluto, situação que viria a provocar o descontentamento da burguesia, da nova nobreza e das massas populares.
Neste contexto, começaram a registar-se movimentações sociais profundas. A Revolução Inglesa surgiu para tentar ultrapassar os constrangimentos ao desenvolvimento económico e o abuso de poder de algumas instituições. O progresso da agricultura estava então a ser travado pelos latifundiários à moda antiga, protegidos pela autoridade régia e pela Igreja Anglicana, adversa à inovação. Também a indústria sofria de males idênticos. O sistema corporativo e os monopólios não deixavam a aplicação de um eficiente sistema capitalista; a burguesia por seu lado, deixou de deter um papel decisivo na orientação política da nação, a partir do momento em que foi desconvocado o Parlamento.
Esta revolução dita burguesa na Inglaterra poder-se-á dividir em três momentos distintos: a primeira fase foi a da preparação da revolução de 1640, data em que foi convocado o Parlamento, até 1642, quando rebentou a guerra civil; o segundo período corresponde à guerra civil de 1642 a 1649, que culminou com a proclamação da República e com a execução do rei; o terceiro momento, o da revolução ocorrido entre 1649 e 1658, que compreende a República e o Protetorado, encerrando-se com a restauração do poder real.
Esta foi, assim, uma revolução burguesa, conduzindo este grupo ao poder, por via de uma aliança com setores da nobreza, para derrotar a velha aristocracia feudal e autocrática. Uma vez vencidos os senhores feudais, a burguesia assumiu o controlo do país, numa época propícia ao desenvolvimento do comércio, da indústria e da agricultura. Mas veja-se como tudo aconteceu.
No final de 1640, Carlos I convocou de novo o Parlamento, mas apenas com o intuito de obter apoios financeiros para a coroa. Contudo, esta instituição, em vez de apoiar o rei a acabar com a revolta da Escócia (a isso se destinava o apoio financeiro), opôs-se ao rei. Este exigiu que o ministro Strafford fosse preso e julgado, o que de facto veio a acontecer: o rei entregou-o à justiça, que o condenou à morte. A Câmara dos Comuns, entretanto, decretou que, caso o Parlamento não fosse convocado durante três anos, teria o direito de se reunir sem esperar convocatória régia; e o Parlamento por sua vez acordou a anulação de todos os monopólios concedidos pelo rei e decretou também que a Igreja Anglicana passaria a depender do Parlamento e que os Ministros responderiam apenas perante esta instituição.
Carlos I não aceitou esta situação e decidiu destruir o Parlamento. Foi até à Casa dos Comuns, com um grupo de homens armados, para decretar a prisão dos deputados que resistiam ao seu poder, mas estes estavam ausentes. Encontravam-se a salvo na city, protegidos pelas massas populares. Daí partiram, sob escolta, para o Parlamento, que entretanto debatia e aprovava o aumento dos seus poderes, enquanto o rei se retirava para o Norte do país.
Em agosto de 1642 o rei, tendo do seu lado os senhores feudais do Norte, do Oeste e do País de Gales, bem como a Igreja Anglicana, declarou guerra ao Parlamento dando assim início a uma guerra civil que se estenderá até 1649. O Parlamento viu-se forçado a reunir forças entre os seus apoiantes puritanos, da nova nobreza e da burguesia, do Leste e da região meridional da Inglaterra, seguidos por inúmeros membros do povo. Podemos resumir, assim, as forças em confronto: por um lado, o exército afeto ao rei, dito dos Cavaleiros, composto pela aristocracia rural, tradicional, anglicana ou mesmo católica; contra ela opunha-se o exército parlamentar dos chamados Cabeças Redondas, constituído por membros da burguesia, da média nobreza rural e das classes populares, puritanos e anglicanos, defensores das tradições que consagravam os direitos e liberdades dos ingleses.
Se de início as tropas leais ao rei eram as mais bem formadas, com a incorporação de destacamentos dos yeomen, de artesãos, operários e pequenos agricultores, nas forças parlamentares a situação inverteu-se. O primeiro destes destacamentos foi recrutado por Oliver Cromwell, um representante da nova nobreza, membro da Câmara dos Comuns, que exercia um forte poder de atração das atenções e impunha uma rígida disciplina entre os seus homens.
Num combate entre as duas forças em 1645, perto de Naseby, Cromwell saiu vitorioso e o rei Carlos I foi derrotado e preso.
Durante o período de guerra, o Parlamento defendeu os interesses da burguesia e da nova nobreza, tentou submeter a Igreja e confiscou as terras dos mais destacados líderes fiéis ao rei. Na linha da defesa dos interesses das novas elites, o Parlamento destituiu todas as exceções decretadas pelo monarca sobre a propriedade das terras, satisfazendo as necessidades dos latifundiários. No entanto, estas medidas não contemplavam as reivindicações dos pequenos agricultores, que continuavam a pagar pesados impostos.
Quando estavam atendidas as exigências da nova nobreza e da burguesia, estes dois grupos sociais começaram a temer a força das massas populares descontentes, mas tendo também de lidar com os rumores de que membros da fação parlamentar se tinham passado para o lado contrário - o que motivou a expulsão desses partidários da monarquia - liderado ainda pelo exército, que, apesar de ter sido (por decreto) desmantelado, se mantinha ativo.
Em 1647, o exército ocupou a cidade de Londres e assumiu o poder. Entre os soldados circulava uma forte influência dos igualitários, chefiados por Liburne, que defendia uma república adepta do sufrágio universal. Nos conselhos dos soldados, os igualitários tinham muita força, mas Cromwell, apoiado pela nobreza e alta burguesia, proibiu tais conselhos. A 30 de janeiro de 1649, o rei Carlos I foi decapitado, sendo pouco depois destituída a Câmara Alta do Parlamento, ou Câmara de Lordes, ficando apenas a funcionar a Câmara Baixa, ou Câmara dos Comuns. Nascia o "Common Wealth" designação do novo estado inglês.
Depois da execução, o movimento popular ressurgiu. Cromwell foi impiedoso para com ele, uma atitude que foi louvada pelas classes mais distintas da nova sociedade. Nesta altura, apareceram os diggers (cavadores), extremistas igualitários que reclamavam a igualdade de direitos políticos e de riqueza. Todavia esta ameaça ao poder instituído foi controlada por Cromwell, que os dividiu e enfraqueceu. Este líder usou as massas populares, mas não respondeu às suas reivindicações de melhores condições de vida.
Por esta altura, a ilha da Irlanda revoltou-se contra a Inglaterra e Cromwell foi chamado a suster esta revolta. Em 1649, iniciou a reconquista da ilha: a tomada e pilhagem da Irlanda desviaram assim as atenções dos problemas internos. Após o controlo desta situação, a prioridade de Cromwell incidiu sobre o domínio dos mares disputado com os Países Baixos, a sua grande concorrente. Em 1651 o Parlamento inglês votou o Ato de Navegação, uma lei pela qual as mercadorias inglesas tinham de ser transportadas, obrigatoriamente, em barcos ingleses ou dos países de proveniência das mercadorias. Esta lei foi contestada pela Holanda, até ser vencida e obrigada a reconhecer esta lei britânica. Tratou-se da coroa de glória da proclamada República inglesa.
Uma parte considerável desta burguesia e nobreza, aterrorizada com a possibilidade de rebentarem revoltas populares, instaurou uma ditadura militar. Em 1653, Cromwell foi nomeado chefe do Governo e recebeu o título vitalício de Lorde Protetor. À sua morte em 1658, numa época de grande instabilidade, os seus antigos apoiantes preferiram restabelecer a monarquia. Os Stuart voltavam ao poder numa época que ficou conhecida como "Restoration" (Restauração), liderada por Carlos II. Este era casado com D. Catarina de Bragança, portuguesa, cujo dote foi a cedência de Tânger e Bombaim à Inglaterra, mais 2 milhões de cruzados em troca do apoio inglês nas guerras da Restauração em Portugal.