A economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza

A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, Rio+20, se realizará entre os dias 13 e 22 de junho de 2012 na cidade do Rio de Janeiro. São objetivos dessa conferência: a renovação do compromisso político com o desenvolvimento sustentável através da avalição do progresso feito nos últimos anos, e das lacunas na implementação das decisões tomadas nos principais encontros sobre Desenvolvimento Sustentável, e a discussão de assuntos novos e emergentes.

De acordo com a Assembleia Geral das Nações Unidas, a Rio+20 terá dois temas principais: a economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza, e a estrutura institucional para o desenvolvimento sustentável.

Como vimos, os termos “desenvolvimento sustentável” e “economia verde” serão amplamente discutidos durante a Rio+20, mas você sabe o que esses termos querem dizer?

Definimos como desenvolvimento sustentável o tipo de desenvolvimento capaz de suprir as necessidades da geração atual sem comprometer a capacidade de atender às necessidades das futuras gerações. É um tipo de desenvolvimento que não esgota os recursos para o futuro, e que dá à geração atual a possibilidade de se desenvolver sem agredir o meio ambiente, dando às gerações futuras a chance de existir e viver bem de acordo com as suas necessidades. O desenvolvimento sustentável somente será alcançado quando houver planejamento e a consciência de que os recursos naturais são finitos, ou seja, que esses recursos acabam.

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Já o termo economia verde permite inúmeras interpretações e o seu conceito ainda não é consensual. A ideia central desse termo é que o conjunto de processos produtivos da sociedade e as transações deles decorrentes contribuam cada vez mais para o desenvolvimento sustentável, tanto nos aspectos sociais quanto ambientais. A economia verde propõe que, além das tecnologias produtivas e sociais, sejam criados meios pelos quais fatores essenciais ligados à sustentabilidade socioambiental, hoje ignorada nas decisões econômicas, passem a ser considerados. No Brasil e em outros países, por exemplo, trabalha-se a “economia verde inclusiva” na forma de programas para promover a conservação ou recuperação ambiental, apoio a segmentos da população cuja renda se origina da reciclagem de resíduos sólidos, entre outros programas.

Na Rio+20 haverá um espaço montado para apresentar aos visitantes as principais iniciativas dos Governos sobre o desenvolvimento sustentável. Essa grande área, localizada em frente ao Riocentro e chamada de Parque dos Atletas, abrigará exposições de países estrangeiros, de organizações internacionais e do Governo brasileiro, com destaque para o Pavilhão Brasil, onde serão apresentados programas e projetos para a promoção do desenvolvimento sustentável.


Por Paula Louredo
Graduada em Biologia

A economia verde no contexto da erradicação da pobreza e o papel da governança para o desenvolvimento sustentável é o tema da próxima audiência pública da Comissão Mista Permanente Sobre Mudanças Climáticas (CMMC), que ocorrerá na quarta-feira (30).

Para debater o assunto, foram convidados Eduardo Viola, professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB); Peter Herman May, professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); Eliezar Martins Diniz, Professor da Faculdade de Economia e Administração Universidade de São Paulo (USP); e um representante do Ministério das Relações Exteriores.

A reunião ocorrerá na sala 9, da ala Alexandre Costa, a partir das 14h.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

ARTIGO ARTICLE

Saúde e economia verde: desafios para o desenvolvimento sustentável e erradicação da pobreza

Health and the green economy: challenges for sustainable development and the eradication of poverty

Edmundo GalloI; Andréia Faraoni Freitas SettiII; Danielly de Paiva MagalhãesII; Jorge Mesquita Huet MachadoIII; Daniel Forsin BussIV; Francisco de Abreu Franco NettoV; Paulo Marchiori BussII

IEscola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, Fiocruz. Av. Brasil 4.365, Manguinhos. 21040-360 Rio de Janeiro RJ.

IICentro de Relações Internacionais em Saúde, Fiocruz

IIIPrograma de Promoção da Saúde Ambiente e Trabalho, Diretoria Regional de Brasília, Fiocruz

IVLaboratório de Avaliação e Promoção da Saúde Ambiental. Instituto Oswaldo Cruz, Fiocruz

VVice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde, Fiocruz

RESUMO

Em um cenário onde os serviços ecossistêmicos vão sendo perdidos e há graves iniquidades sociais é necessário um novo modelo de crescimento capaz de promover o desenvolvimento social com a redução da pegada ecológica. A 'economia verde' é um dos modelos propostos. Este trabalho analisa os impactos ambientais, sociais e individuais da economia marrom na saúde humana e aborda as contribuições da economia verde para a promoção da equidade e saúde. Assume que o desenvolvimento econômico e a sustentabilidade ambiental não são incompatíveis e contribuem para o combate à pobreza. A transição para uma economia sustentável depende de decisões políticas e vai além do desenvolvimento de tecnologias, devendo implantar um novo modo de produção, consumo e organização social que promova a justiça socioambiental, incentivando a participação social e as formas democráticas de governança para definir uma agenda concreta de implementação de objetivos para o desenvolvimento sustentável e de mecanismos capazes de implementá-los em todos os níveis.

Palavras-chave: complexo produtivo da saúde, desenvolvimento sustentável, capitalismo, economia marrom, Rio+20, justiça socioambiental

ABSTRACT

In a scenario where ecosystemic services are being eroded and there is high social inequity, a new model of development is necessary, namely one capable of promoting social development with a reduction of its ecological footprint. The 'Green Economy' model is one of the proposed models. This paper seeks to analyze the environmental, social and individual impacts on human health in the context of a 'brown economy', and discusses the contributions of a green economy on the promotion of equity and health. The assumption is that economic development and environmental sustainability are not incompatible and both contribute to the eradication of poverty. The transition to a sustainable economy depends on political decisions, and transcends technological developments. Above all, it should instigate new models of production, consumption and social organization, which promote socio-environmental justice, encouraging social participation and democratic forms of governance to define a solid agenda for the implementation of sustainable development and mechanisms to implement them at all levels.

Keywords: productive implementation of health, sustainable development, capitalism, brown economy, Rio+20, socio-environmental justice

Introdução

A década de 1970, sobretudo a partir da crise do petróleo em 1973 e da consequente onda inflacionária que a acompanhou, foi marcada como um período de transição do modelo econômico centrado no Estado de Bem-estar Social para um modelo de Estado neoliberal, que privilegiou o equilíbrio fiscal e monetário dos países, reduzindo sistemas de proteção social e atribuindo ao mercado a possibilidade de realização das necessidades sociais em detrimento do papel dos estados nacionais.

Como consequência deste modelo e de suas políticas, houve uma piora sensível nas condições de vida das populações, especialmente nos países mais pobres e em desenvolvimento, mas também impactando os países centrais. Esse período se estendeu até o final da década de 1990 quando começaram a ser retomados mecanismos de regulamentação econômica e proteção social.

Neste contexto, a agenda dos organismos internacionais, da década de 2000 voltou-se para o social, gerando um "ciclo social"1,2 representado por diversas conferências da ONU, especialmente a Conferência de Direitos Humanos de 1993, a Conferência Mundial sobre Mulheres de 1995, a Conferência Internacional sobre o Financiamento ao Desenvolvimento de 2002, a Conferência de Durban de 2002 e mais recentemente a Conferência Mundial de Determinantes Sociais da Saúde, em 2011.

Essa agenda permitiu que a saúde tivesse papel proeminente, o que se refletiu na definição dos ODM. Dos oito objetivos, três são especificamente da área da saúde, e os outros cinco diretamente relacionados a ela.

O conceito de sustentabilidade entrou em cena principalmente a partir do Relatório Meadows, conhecido como Relatório do Clube de Roma3, que identificou como principais ameaças à sobrevivência do planeta a industrialização acelerada, o rápido crescimento demográfico, a escassez de alimentos, o esgotamento de recursos não renováveis e a deterioração do meio ambiente.

Ainda que criticado, o relatório é pioneiro em identificar desafios importantes neste campo, influenciando de maneira decisiva o debate na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano (Estocolmo, 1972), que reuniu a comunidade internacional para discutir o meio ambiente global e as necessidades de desenvolvimento e que produziu um documento que sinalizava a necessidade de se criar um processo de gestão planetária dos problemas ambientais que culminou, logo após, na criação do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA).

Era preciso redefinir o próprio conceito de desenvolvimento, tantas e tão complexas eram as questões envolvidas. A Comissão Mundial para o Meio Ambiente e Desenvolvimento, criada em 1987, produz então o relatório "Our Common Future" - Nosso Futuro Comum - mais conhecido como Relatório Brundtland, nele formulando o conceito 'clássico' de desenvolvimento sustentável: "Desenvolvimento que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das futuras gerações de atender às suas próprias", concebido como processo de transformação no qual a exploração dos recursos naturais, a direção dos investimentos, a orientação do desenvolvimento tecnológico e a mudança institucional devem se harmonizar e reforçar o potencial presente e futuro a fim de atender às necessidades e aspirações humanas4,5.

Os efeitos desse modelo de desenvolvimento refletiram-se no aquecimento global, no buraco na camada de ozônio, na poluição e na diminuição da quantidade de água potável, na desertificação, na contaminação do solo, na poluição do ar, na escassez de recursos naturais, na extinção de espécies, na perda da biodiversidade, entre outros, o que apontava para a insustentabilidade deste modelo, ameaçando a vida no planeta.

Buscando responder a esse quadro, houve um conjunto de iniciativas da ONU, como a Eco 92 - Cúpula da Terra, Johannesburg 2002 - Rio + 10, a Conferência Nacional de Saúde Ambiental, a 10ª Conferência Internacional de Saúde Urbana, e as diversas COP - Painel de Alto Nível da ONU para as Mudanças Climáticas. Esse processo consolidou a importância da agenda da sustentabilidade para a sobrevivência do planeta, o que hoje a coloca como agenda prioritária do ponto de vista global.

O The Lancet, em recente editorial6, discute essa transição de agendas, e concorda que, nesta década, o destaque será da agenda da sustentabilidade. Porém, longe de isto significar perda de espaço para a saúde, coloca para o setor o desafio de inserir-se em uma agenda intersetorial capaz de impulsionar o enfrentamento dos determinantes sociais da saúde, o que dialoga estreitamente com o desenvolvimento sustentável.

Para além disso, é necessário atualizar a agenda dos ODM, ainda incompleta, que representa o ciclo social e articulá-la aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODG), inserindo-se assim no ciclo da sustentabilidade, sendo um dos seus três pilares.

A agenda dos determinantes sociais da saúde, reafirmada recentemente na Conferência Mundial de Determinantes Sociais da Saúde, 2011, é a que permite um diálogo direto e imediato com a agenda da sustentabilidade, convergindo para a Rio + 20 onde se espera que haja a reafirmação de princípios e a definição de estratégias concretas para a sua implementação.

Nos vinte anos que se passaram desde a Eco 92, foi fundamental a institucionalização e o grau de consenso alcançado pelo desenvolvimento sustentável enquanto novo paradigma e princípio estruturante para o desenvolvimento, permitindo o avanço na criação de tecnologias, elaboração de indicadores e no envolvimento governamental, social e comunitário7.

Ainda que haja dimensões conceituais a serem esclarecidas, como o conceito de economia verde, o aspecto mais criticado é o da baixa implementação de medidas concretas capazes de enfrentar os principais desafios relacionadas à efetividade de políticas, pesquisas e outras estratégias que articulem os três pilares do desenvolvimento sustentável: desenvolvimento econômico, equidade social e proteção ambiental5,8-11.

A Rio+20 tem como Agendas centrais a Economia Verde e a Governança para o Desenvolvimento Sustentável3. Ainda que aparentemente sejam agendas consensuais, seus conceitos e sua implementação prática é controversa. Há desde posições que apontam para o "esverdeamento do capitalismo"12, até as que as identificam como o caminho para a transformação para um mundo mais solidário. Todas, entretanto, destacam a importância de que se aprofundem o debate sobre o conteúdo e as estratégias destas Agendas.

A saúde tem procurado intervir mais decisivamente nessas Agendas, desenvolvendo a teoria da determinação social da saúde e seus desdobramentos. Três áreas da saúde voltaram-se, de modo mais especifico, para a compreensão e a ação sobre as interfaces entre meio ambiente, desenvolvimento sustentável (produção) e saúde: promoção da saúde, saúde ambiental e complexo produtivo da saúde tendo em comum o grande potencial para combater a pobreza, por meio da inclusão social e da proteção ao meio ambiente baseado em uma governança democrática e participativa.

Este trabalho tem como objetivo trazer os princípios da Economia Verde e suas contribuições para a promoção da equidade, erradicação da pobreza e no setor da saúde, salientando sua urgência para a mitigação dos impactos causados pelo modelo de desenvolvimento econômico atual (economia marrom), e, finalmente, destacando os desafios teórico-práticos para o desenvolvimento sustentável e a saúde, com a perspectiva de oferecer subsídios que auxiliem na criação de agendas mais sustentáveis.

Princípios da Economia verde

A pegada ecológica da humanidade dobrou desde 1966 e, em 2007, a biocapacidade utilizada do planeta foi 50% maior que sua renovação. O modo hegemônico de produção e consumo, desde a década de 1980, tem gerado uma dívida ecológica importante. Continuando com esse padrão econômico, até2030, a humanidade precisará da biocapacidade de dois planetas Terra para absorver os resíduos de CO2 e manter o consumo de recursos naturais13.

O relatório do PNUMA14 demonstra que a transição para uma economia verde de baixo carbono e alta eficiência de recursos seria possível se fossem investidos 2% do PIB global por ano em dez setores estratégicos, que seriam: construção civil; energia; pesca; silvicultura; indústria; turismo; transporte; resíduos e reciclagem; água e saneamento básico - sendo o maior investimento desse montante em energia, 30%, seguido de 16% em transporte.

O documento assume que o desenvolvimento econômico deve ser atrelado à melhoria do índice de desenvolvimento humano, reduzindo ou mantendo sua pegada ecológica baixa. Neste sentido, a economia verde preconiza pela valorização e incentivo em atividades com baixo teor de emissão de carbono, racionalização dos recursos, integração social, proteção e reforço da biodiversidade e dos serviços fornecidos pelos ecossistemas.

Na transição para essa nova economia, muitos empregos se extinguiriam, porém novos, denominados verdes, seriam criados, onde o trabalhador teria liberdade, remuneração equitativa, segurança no local de trabalho e proteção social. Para isso, os governos deveriam promover o incentivo adequado utilizando instrumentos econômicos, normas, inovação e difusão tecnológica, políticas distributivas e voluntárias e iniciativas que possam ajudar a canalizar investimentos - públicos e privados - para setores específicos e aumentar sua eficácia e equidade.

Isto implica em alterar a política fiscal, reformar e reduzir os subsídios a empreendimentos prejudiciais ao ambiente, redirecionar os investimentos para setores verdes-chave, que utilizem recursos naturais e energia em menor quantidade ou de forma eficiente e que sejam socialmente inclusivos. Isto eliminaria indústrias marrons que em grande medida existem devido a subsídios14.

As metodologias de políticas públicas para uma economia verde deverão ser diferentes em cada país, levando-se em consideração suas condições socioeconômicas e institucionais específicas, seus recursos naturais e pontos de pressão ambiental15. Teoricamente, todos os países teriam ganhos econômicos diretos ao fazer a transição para uma economia verde, por meio de maior produtividade, otimização de recursos, ampliação de empregos a partir da inovação e do surgimento de mercados e atividades verdes. Se forem alcançados esses objetivos, a pegada ecológica global sobre a taxa de biocapacidade poderia diminuir para menos de 1,2 gha até2050, reduzindo em 33% as emissões de dióxido de carbono e limitando assim o aquecimento global ao limiar de dois graus Celsius16. Os benefícios de uma economia verde resultariam em maior saúde e bem-estar com menor poluição.

Economia Verde e a Erradicação da Pobreza: agenda dos organismos internacionais para o desenvolvimento sustentável

Em todas as partes do mundo, a pobreza e as precárias condições de vida permanecem sendo uma das maiores causas das doenças. Apesar dos índices de mortalidade por doenças infecciosas terem caído, aumentou o número de doenças ligadas às formas de vida e às alterações nas dietas. A desnutrição crônica ou a fome tornam muitas pessoas vulneráveis ao adoecimento e às mortes precoces. Um exemplo disso são os índices de mortalidade infantil, que vêm declinando, mas não na mesma velocidade para todas as classes sociais17.

A Comissão Econômica para América Latina e Caribe (CEPAL) estimou que 10,3% da população latino-americana, em 2005, vivia na extrema pobreza, e que 12,7% da população era composta por indigentes, em 2007. Considera-se em extrema pobreza as pessoas que não satisfazem três ou mais necessidades básicas18.

As atuais tendências projetadas para a agricultura, caso persista o modelo atual, são menos eficientes do que as da economia verde. Por exemplo, os investimentos em agricultura verde conduziriam, ao longo do tempo, ao aumento da qualidade do solo e ao crescimento da produção global das principais culturas, representando uma produção 10% acima do projetado com as estratégias atuais de investimento. O aumento da eficiência na agricultura e nos setores industrial e urbano reduziria a demanda de água em cerca de um quinto até2050 em comparação com as tendências projetadas, reduzindo a pressão sobre o lençol freático e a água superficial, tanto a curto quanto a longo prazo, impactando positivamente eixos importantes das políticas de erradicação da fome e da miséria14.

Assim, sob um panorama de economia verde inclusiva, o crescimento econômico e a sustentabilidade ambiental não seriam incompatíveis e contribuiriam para o combate à pobreza, uma vez que os serviços ecossistêmicos são componentes das vidas de comunidades e proporcionam uma rede de segurança contra desastres naturais e disponibilidade de serviços essenciais, como por exemplo a água.

A economia verde pode estar alinhada à promoção e à defesa dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio que tem, entre outras, a meta de reduzir pela metade o número de pessoas com fome e sem acesso a água potável. O relatório "A economia dos ecossistemas e da biodiversidade"19 analisa a correlação entre os serviços ecossistêmicos e os ODM (Quadro 1).

O Quadro apresenta relação indireta entre os serviços ecossistêmicos e todos os ODM à exceção do ODM 1 - Erradicar a pobreza extrema e a fome, que apresentou "relações fortes e diretas: a intervenção precisa ser receptiva aos serviços ecossistêmicos, à biodiversidade e à resiliência dos ecossistemas cultivados". O ODM 7 - Qualidade de vida e respeito ao meio ambiente não é citado, provavelmente por ser transversal aos demais.

O mundo avança nessa direção, apesar da recessão econômica mundial, mas demonstra fragilidade nas áreas vitais, tais como a melhoria da saúde materna e acesso a um saneamento de qualidade, conforme publicado no Relatório de Acompanhamento dos ODM20 que também recomenda a criação de empregos, a promoção do crescimento econômico, a segurança alimentar, a promoção das energias limpas e o reforço das parcerias entre os países ricos e pobres, para ajudar as populações mais vulneráveis do mundo. O relatório revela que, nas duas últimas décadas, o mundo conseguiu reduzir a percentagem de pessoas que vivem na pobreza extrema, baixou de 46% em 1990, para 27%, em 2005, com previsão para atingir 15% até201520.

O Brasil tem se apoiado em políticas sociais, de alcance nacional, com o objetivo de reduzir a pobreza e as desigualdades garantindo os direitos dos cidadãos, como é o caso do conjunto de ações para o combate à fome e à pobreza, que hoje se configura no Plano Brasil sem Miséria. Somadas a outros fatores, como o crescimento da economia e a geração de empregos, elas já possibilitaram não apenas eliminar pela metade a proporção da população pobre no pais - Meta do primeiro ODM - como também cumprir a mais ousada, assumida voluntariamente em 2005, de reduzir essa proporção para um quarto da população total21.

O Plano Brasil sem Miséria é dirigido para 16 milhões de pessoas que ainda permanecem na pobreza extrema, que não conseguiram se inscrever em programas sociais como o Bolsa Família, muito menos ter acesso a serviços essenciais como água, luz, educação, saúde e moradia. A partir do Mapa da Pobreza e do Mapa Nacional de Oportunidades, o governo brasileiro desenvolveu uma estratégia, chamada "Busca Ativa", que identifica as pessoas nessas condições, realizam o seu cadastro nos programas sociais e buscam identificar os meios mais eficientes para a melhoria da sua qualidade de vida22.

O Programa Bolsa Verde faz parte do Plano Brasil sem Miséria, que beneficia famílias da Região Norte em situação de pobreza extrema que vivem em áreas de preservação ambiental, que a cada três meses receberão a bolsa por serviços ambientais de conservação das áreas onde vivem e trabalham e qualificação em manejo florestal e educação ambiental. Até2014, o Governo Federal pretende atender 72 mil famílias de pequenos produtores e comunidades tradicionais que vivem em área de preservação e assentamentos de reforma agrária que contêm recursos florestais importantes23.

Esse contexto indica que a implementação de políticas sustentáveis tem potencial para enfrentar a pobreza, promover a equidade, melhorar a qualidade de vida e a sustentabilidade do planeta. A Rio+20 deverá enfrentar uma série de desafios nesse sentido.

Economia verde na saúde

A Avaliação Ecossistêmica do Milênio24 reconhece que o bem estar humano depende de determinantes múltiplos, sendo os serviços ecossistêmicos indispensáveis à saúde das pessoas, e preconiza como requisitos mínimos para uma boa qualidade de vida: alimento, moradia, ar limpo, acesso à água potável e resiliência ao clima.

Para a Comissão Nacional sobre os Determinantes Sociais da Saúde (CNDSS), os DSS são os fatores sociais, econômicos, culturais, étnicos/raciais, psicológicos e comportamentais que influenciam a ocorrência de problemas de saúde e seus fatores de risco na população. As condições socioeconômicas, culturais e ambientais são concebidas como fatores macro-determinantes da saúde. Assim, o processo saúde-doença reflete as alterações territoriais, geográficas, demográficas produtivas e culturais que impactam o lugar de vida25.

Juntamente com a redução dos gastos dedicados a saúde, a OPAS26 já reconhece que os efeitos das mudanças climáticas estão associados ao ressurgimento, na América Latina e no Caribe, de epidemias que estavam sob controle. A poluição ambiental pode levar a diversas complicações à saúde individual e pública, desde intoxicações químicas, cânceres, malformações congênitas, doenças neurológicas, imunológicas e respiratórias até redução ao acesso à alimentação e à água, vitais para a saúde humana.

Impactos do modelo de desenvolvimento econômico atual na saúde

A mudança do atual modelo de desenvolvimento para o sustentável é justificado, de modo imediato, pelas alterações catastróficas que aquele pode causar tanto para a economia, quanto para o ambiente e para a saúde.

O clima, p.e., é um determinante da distribuição de vetores e agentes patogênicos. O aumento da incidência-prevalência de doenças como malária, dengue, febre amarela, hantavirose, entre outras, tem sido associadas às mudanças climáticas27. As alterações extremas de temperatura também irão contribuir para o aumento da poluição do ar e da água, escassez de alimentos e elevação dos níveis de ozônio, o que agrava as doenças cardiovasculares e respiratóriasintensificando alergias a pólen e outros alergênicos28.

A elevação das temperaturas também altera os regimes de precipitação e poderá prejudicar a produção de alimentos em muitas das regiões mais pobres, o que aumentará a prevalência de desnutrição e subnutrição, que atualmente resulta em 3,5 milhões de mortes a cada ano29. Ademais, em algumas regiões do mundo numerosas populações serão deslocadas pelo aumento do nível do mar ou serão seriamente afetadas por inundações, secas e fome e diminuição de terras apropriadas para a agricultura30,31.

Outros impactos ambientais do desenvolvimento econômico afetam indiretamente a saúde. Modificações do habitat, conversão de terras e desmatamento para criação de estradas e agricultura, alteram as condições ecológicas e podem levar à extinção de espécies. A perda da biodiversidade afeta os serviços do ecossistema, como a captura eficiente da energia da luz solar, a filtragem e a depuração de poluentes entre outros. A diversidade de espécies também é importante na ecologia das doenças infecciosas, particularmente zoonoses transmitidas por vetores. A alta diversidade de espécies de hospedeiros vertebrados pode desempenhar um papel benéfico por impedir o domínio de determinadas espécies que atuam como reservatórios principais do patógeno, e, portanto, podem diminuir e/ou "diluir" o risco da doença32.

A construção de usinas hidrelétricas e barragens em geral, gera modificações ambientais criando condições propícias ao estabelecimento de vetores, como os que transmitem a esquistossomose, a malária e a febre amarela - doenças endêmicas mundialmente importantes, associadas a ambientes impactados33,34. Ainda assim, a realização desses empreendimentos ocorre sem planos consistentes de mitigação daquelas doenças, ou até mesmo um incremento no serviço de saúde local para atendimento das mesmas.

A falta de tratamento adequado de efluentes domésticos e industriais e a lixiviação de áreas agrícolas permitem o lançamento de parasitos, bactérias, vírus e de substâncias tóxicas, genotóxicas, teratogênicas e carcinogênicas nos corpos hídricos. A água insalubre e a falta de condições de saneamento básico e higiene foram responsáveis por 1,9 milhões de mortes em 200435. Os tratamentos de água convencionais são incapazes de retirar certas substâncias (disruptores endócrinos, antibióticos e cianotoxinas) da água para consumo humano. Muitas destas substâncias são persistentes no meio ambiente, acumulando-se no solo e no sedimento de rios sendo facilmente transportadas a longas distâncias. Depositam-se ao longo da cadeia trófica, representando um sério risco à segurança alimentar e nutricional. Os disruptores endócrinos causam também declínio da função do sistema imunológico, aumentando a propensão às doenças infecciosas36 e alterando o funcionamento dos órgãos reprodutores com consequências para a fertilidade37,38.

Outro ponto fundamental é o modelo de produção agrícola, baseado no agronegócio de monocultura em larga escala, dependente do uso de agrotóxicos, com seus impactos extremamente danosos à saúde e ao meio ambiente, levando à contaminação do ar, da água e do solo, e às enfermidades e mortes. Isto requer legislações que possam exercer um controle mais rigoroso durante todo ciclo de vida da produção e da utilização de agrotóxicos e de todos seus resíduos, comprometendo o conjunto dos atores sociais, desde a indústria química e suas revendas até os produtores e trabalhadores rurais com uma gestão integrada e ambientalmente mais segura e saudável.

Nesta perspectiva, os governos dos países da América do Norte e Europa Ocidental estão promovendo a regulamentação para a redução do nível de utilização destes produtos químicos utilizados na agricultura, estimulando a chamada agricultura biológica, método que se caracteriza pela rotação de cultura, usos restritos de pesticidas e fertilizantes, entre outras39. Paradoxalmente, em 2008, o Brasil assumiu o posto de maior consumidor de agrotóxicos do mundo, superando os Estados Unidos. Agrotóxicos proibidos na União Europeia, Estados Unidos, Canadá, Japão e China continuam sendo utilizados no Brasil40.

O Ministério da Saúde instituiu Grupo de Trabalho41 em caráter permanente, para elaborar e acompanhar a implementação do Plano Integrado de ações de vigilância em saúde relacionada a riscos e agravos provocados por agrotóxicos, tendo sido elaborado um modelo de Vigilância e Atenção Integral à população Exposta aos Agrotóxicos.

Impactos do complexo produtivo da saúde sobre o ambiente

Outra dimensão da saúde na economia verde diz respeito ao impacto de suas cadeias produtivas no ambiente, seja na produção de resíduos, nas formas de organização do trabalho ou na eficácia da atenção e vigilância em saúde. O setor saúde, especialmente quando adota um modelo universal, desempenha importante papel como indutor do crescimento econômico e da competitividade. No Brasil, é responsável por boa parte dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento, apresentando forte impacto sobre o estágio de desenvolvimento nacional. Porém, os interesses predominantes se movem pela lógica econômica do lucro e não para o atendimento das necessidades da saúde42.

A indústria bioquímica e farmacêutica gera efluentes com composição e quantidade muito variadas devido ao grande número de fármacos existentes, mais a introdução de novos e a sazonalidade das produções. Os riscos ambientais decorrentes de resíduos químico-farmacêuticos estão relacionados com os despejos industriais ou laboratoriais inadequados, assim como com o descarte aleatório de medicamentos vencidos ou sobras, feito por grande parte das pessoas no lixo comum ou na rede pública de esgoto. Estes resíduos podem trazer como consequências a contaminação da água, do solo e de animais, além do risco direto à saúde de pessoas que possam reutilizá-los por acidente ou mesmo intencionalmente, levando ao surgimento de reações adversas graves, intoxicações, entre outros problemas.

Os efluentes líquidos dos serviços de saúde também possuem características peculiares que merecem atenção diferencial. O uso de antibióticos promove a seleção de bactérias multirresistentes e de genes de resistência a antibióticos. As estações de tratamento de efluente líquido de serviços de saúde são inexistentes na maioria das vezes.

Em termos de tecnologias de tratamentos de água e esgoto, a utilizaçao de carvão ativado granular, a ozonização e processos de oxidação são eficientes para remoção de até80% desses contaminantes. No entanto, são tecnologias ainda caras e pouco usuais no Brasil. Incentivos nessa área tecnológica seriam importantes a fim de desenvolver métodos com boa relação-custo benefício e que protegesse a população e o ambiente contra a exposição contínua desses contaminantes.

Os resíduos dos serviços de saúde (RSS) representam um potencial de risco em duas situações: para a saúde ocupacional de quem manipula esse tipo de resíduo; e, para o meio ambiente e a população, como decorrência da destinação inadequada de qualquer tipo de resíduo, alterando as características do meio43.

Os RSS também podem favorecer o transporte de organismos multirresistentes dos estabelecimentos de saúde para o ambiente44. Os rejeitos radioativos ou contaminados com radionuclídeos provenientes de laboratórios de análises clínicas, serviços de medicina nuclear e radioterapia, devem seguir as normas da Comissão Nacional de Energia Nuclear45. No Brasil, cerca de 56% dos municípios brasileiros dispõem de forma inadequada seus resíduos sólidos hospitalares, sendo que 30% deste total correspondem aos lixões. O restante os deposita em aterros controlados, sanitários e aterros especiais43. A disposição desses resíduos em locais inadequados permite que o chorume e todos os agentes patogênicos se infiltrem no solo, contaminando-o e comprometendo os lençóis freáticos, além de ampliar os riscos aos catadores. Também há o risco de contaminação do ar, dada quando os resíduos são tratados pelo processo de incineração descontrolado43.

Com relação às formas de tratamento adotadas pelos municípios, cerca de 20% dos municípios realizam a queima a céu aberto (cerca de 20%), 11% incineram e 22% não tratam de forma alguma seus resíduos43.

Existem regras para o descarte dos Resíduos de Serviços de Saúde, as quais estão dispostas na Resolução nº306 de dezembro de 2004, da Anvisa. Entre elas, uma estabelece que a segregação, o tratamento, o acondicionamento e o transporte adequado dos resíduos são de responsabilidade de cada unidade de saúde onde foram gerados, compromisso este que é sacramentado pela elaboração obrigatória do Plano de Gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde (PGRSS) por parte dos estabelecimentos geradores. A Lei nº12.305/10, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), regulamenta a eliminação de lixões e a consequente disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos até2014.

Um dos entraves atuais para o gerenciamento adequado destes resíduos está na fiscalização. Dentro do estabelecimento de saúde os responsáveis pela fiscalização são os órgãos de Vigilância Sanitária e, após sua saída (transporte e disposição final) é de responsabilidade do órgão ambiental. A falta de integração entre esses dois órgãos torna a fiscalização deficiente. Dessa forma, é necessário que se implemente uma política nacional para gerenciamento dos RSS, integrada entre o MS e MMA, assim como ações de logística e infraestrutura local para coleta, transporte e tratamento dos mesmos. Seu tratamento protege a saúde da população e consequentemente otimiza o processo de reciclagem. Deve-se investir também em infraestrutura e serviços, como empresas de transporte adequado, empresas para tratamento, reciclagem e reaproveitamento de metais e outros materiais, sistema de logística reversa, entre outros.

Como dito anteriormente, o complexo produtivo da saúde tem papel decisivo, pois constitui um campo em que inovação tecnológica e acumulação de capital geram oportunidades de investimento, trabalho e renda, além de produzir avanços importantes para melhorar o estado de saúde das pessoas46. Entretanto, o seu modelo de organização é hegemonicamente o da economia marrom, tornando-se necessário projetar estratégias de mudança para uma economia sustentável. Um ambiente equilibrado promove a saúde, bem fundamental para o desenvolvimento econômico de um país. Essa é uma das justificativas para mudança do modelo econômico para uma economia verde.

Por exemplo, estratégias de construção de serviços de saúde "verdes" são uma oportunidade de engajamento do setor no processo de transição para a economia sustentável. Abrangem cinco áreas principais: planejamento do local, consumo de energia, de água e de materiais e a qualidade do ambiente interno. O projeto deve garantir a sustentabilidade destes fatores e a sua interação. Um edifício "verde" permite a redução de custos entre 15% e 25% de energia e água, de 70% da emissão de óxido nitroso, de 50% da emissão de gás carbônico e de 20% de combustível para o aquecimento de água, o que torna o investimento neste tipo de construção importante não apenas do ponto de vista da sustentabilidade ecológica como da eficiência econômica47.

Lógica produtiva tradicional versus novas racionalidades

A principal crítica à Economia Verde é a sua aplicabilidade concreta. Com efeito, de modo antagônico aos organismos internacionais e "major groups", atores distintos sustentam que o conceito e suas práticas significam um aggiornamento do capitalismo, sustentado pelo interesse dos conglomerados econômicos transnacionais, das grandes corporações e de seus aliados nos governos, focalizando sua argumentação na utilização de tecnologias de ponta como solução para os efeitos da economia marrom, evitando discutir sua raiz, representada pelas formas de organização social e econômica capitalistas.

Com efeito, é inegável que o que está em disputa são projetos alternativos de sociedade, defendidos por atores ideologicamente distintos e em muitos casos radicalmente antagônicos. A forma como o modo de produção capitalista se reproduziu, passou a ameaçar a própria possibilidade de sua reprodução, tanto pelo consumo dos serviços ecossistêmicos, quanto pela perda de legitimidade social do sistema, contexto semelhante ao que ocorreu no período inicial da revolução industrial, quando as péssimas condições laborais da classe operária passaram a dizimar sua força de trabalho.

A resposta naquele momento foi a ampliação dos direitos trabalhistas e sociais nos países desenvolvidos, seguida pela progressiva descentralização dos processos produtivos mais penosos e/ou degradadores do meio ambiente para colônias, países pobres e em desenvolvimento, onde a capacidade de organização dos trabalhadores era menor, assim como os custos de produção.

Ainda que atualizando o modo de produção capitalista, este momento abriu a possibilidade de construção dos estados de Bem-estar Social e a ampliação dos direitos políticos, rompendo com a perspectiva liberal então dominante do Estado mínimo, permitindo a regulação do mercado por meio de políticas públicas. Isso não foi suficiente, entretanto, para reverter o quadro de assimetria e de dominação social, cuja legitimidade se deslocou da esfera da interação para a da técnica.

Este enfrentamento entre projetos é inerente à história da humanidade e, em estados disnômicos do sistema, demandam respostas para um novo equilíbrio que pode se dar tanto pela atualização do projeto do capital quanto por iniciativas mais emancipatórias e solidárias. Nesse espaço são necessárias proposições mais afirmativas dos atores que defendem uma sociedade mais autônoma e com justiça socioambiental, não devendo se limitar a protestos numa cúpula oposta. É preciso "traçar uma estratégia de mudança, com perspectivas claras e fortes, organizadas em volta de um reduzido número de grandes mudanças que tenham sido identificadas coletivamente"48.

Aqueles que defendem a tese do "esverdeamento do capitalismo" argumentam que a economia verde não enfrenta a questão do modelo de desenvolvimento, apenas propõe adequações ao existente para torná-lo "sustentável", sem mudanças estruturais. As tecnologias verdes seriam controladas pelas corporações internacionais com a perspectiva de obtenção de lucro, por meio do seu comércio, caso venham a ser adotadas como solução para redução das emissões.

Para aqueles que advogam essa análise, isto "simboliza certa submissão dos Estados nacionais ao capital do setor privado, movimento iniciado justamente a partir dos Objetivos do Milênio, no início dos anos 2000, quando a ONU se dobrou ao poder do capital e passou a atuar a partir de diretrizes ditadas pelos interesses dos países mais ricos e das instituições do sistema financeiro e do comércio mundial"2.

Outros avaliam que a ausência de uma definição consensual de 'economia verde' no processo da Rio+20 é um artifício para a atualização do projeto do capital. Na ausência de fortes políticas sociais e de novas estruturas de governança, as mesmas companhias [...] transnacionais que controlam a nossa economia atual irão permanecer no controle de qualquer economia que possa haver no nosso futuro - seja qual for a sua cor49.

No momento atual, as tecnologias estão sendo apontadas como uma alternativa para sanar os problemas climáticos e resolver, consequentemente, as questões sociais, especialmente em relação à fome e à distribuição de alimentos. Dentre elas, destacam-se a nanotecnologia, a Geoengenharia, a Robótica, a Biotecnologia, entre outras50. Dessa forma, a fome pode ser saciada com a biotecnologia, a geoengenharia é a solução para o aquecimento global, a biologia sintética para a substituição do petróleo e a transformação da biomassa. "Meio século depois do nascimento do movimento ambiental moderno, todos os problemas sociais parecem exigir não políticas, mas sim soluções tecnológicas"49.

Entretanto, não se pode atribuir a elas a solução para problemas que são resultados do modelo politicamente definido de desenvolvimento econômico. O modo de produção capitalista e o processo de desenvolvimento econômico pós-industrial, ainda que baseiem sua legitimidade no desenvolvimento da técnica e da ciência, conseguiu legitimar-se principalmente pelas formas de organização social que produziu e que de modo geral não permitiu a expansão da autonomia agravando as iniquidades, as assimetrias sociais e os processos de exploração.

Desafios da Agenda da Sustentabilidade e Saúde

A saúde é histórica e socialmente construída, o que caracteriza sua determinação social. O objeto da saúde é a vida. A vida está ameaçada pelo atual modo de produção e consumo. A sustentabilidade é a ponte dialógica entre a saúde, o ambiente e a economia, representada pela possibilidade do desenvolvimento sustentável.

Ainda que se aponte para a inviabilidade da vida no planeta se houver a continuidade do modelo hegemônico de produção, este continua a reproduzir-se e a exponenciar suas consequências. Por outro lado, experiências de organização econômica e social mais solidárias e eficientes se ampliam, gerando aprendizados e alternativas5,10,14,51.

Tanto as propostas de políticas, programas e projetos, quanto a literatura especializada destacam o território como categoria central. Com efeito, toda investigação ou formulação parte de um território vivo, de uma territorialidade, entendida como o conjunto de valores e de práticas referidos a determinado espaço e em determinado tempo e que caracterizam a sua produção social, que se dá a partir e sobre uma realidade particular onde os vetores da racionalidade dominante entram em embate com a emergência de outras formas de vida, o que exige projetos e ações que sejam capazes de compreender e - consequentemente - de transformar as práticas sociais referidas a territórios, produzindo autonomia individual e coletiva52-57.

Ora, não existe "intervenção no mundo" anistórica, isolada de um determinado contexto, determinado espaço e tempo, determinados sujeitos. Portanto, a possibilidade teórico-prática do sustentável e do saudável só existe referida aos territórios e territorialidades específicas.

Porém, para além disto, a definição mesmo do que é sustentável e saudável também só é possível "em situação", a partir do diálogo entre sujeitos, suas experiências e interesses, da "ecologia de saberes" como propõe Santos57.

Para a Agenda do desenvolvimento sustentável, portanto, intervir sobre as distintas dimensões da determinação social da saúde, articulando diferentes escalas e integrando-se às agendas de economia solidária, gestão e uso do território, agroecologia, segurança alimentar, resgate e atualização cultural, entre outras, é fundamental para que se torne promotora de equidade e sustentabilidade. Seus focos de ação devem ser intersetoriais, e suas estratégias devem dar "preferência às formas de conhecimento que garantam a maior participação dos grupos sociais envolvidos na concepção, na execução, no controle e na fruição da intervenção"57.

Novos olhares sobre a saúde e a doença significam: "compartir da certeza de que a humanidade vive em um período de responsabilidade planetária, que coloca a luta pela vida como preocupação central" e "subverter radicalmente a concepção hegemônica sobre o conceito de saúde no âmbito da saúde coletiva"58.

Isto não significa, entretanto, que as alternativas propostas para sua atualização, em especial as oriundas das instituições tradicionais escapem à lógica hegemônica do conhecimento científico ocidental, conformando-se muitas vezes como conservadoras, ou "abissais" na expressão de Santos57.

O conceito, portanto, mais que apontar para uma situação-objetivo, precisa se pautar pelo empoderamento e produção de autonomia, equidade e sustentabilidade, buscando construir cartografias epistemológicas contra-hegemônicas derivadas do cotidiano reinventado criticamente59.

Territórios sustentáveis são a configuração do Cotidiano da História após sua apropriação crítica pelos sujeitos a partir da ecologia de saberes e por meio de uma pedagogia da autonomia, resultando em governança local solidária, produção sustentável e políticas efetivas de cidadania53,57,59,60.

A Rio+20 abre a possibilidade de se definir o conceito de economia verde e uma agenda de implantação de um novo modelo de produção e organização social que promova a justiça socioambiental, incentivando a participação social e as formas de governança, permitindo a ausculta dos movimentos sociais, comunidades tradicionais, governos, empresários, organizações sociais e cientistas na definição de uma agenda concreta de implementação de ODS e de mecanismos de governança capazes de implementá-los, especialmente em nível local.

Colaboradores

E Gallo trabalhou na concepção teórica, elaboração e redação final do texto; AFF Setti e DP Magalhães trabalharam no levantamento bibliográfico, elaboração e redação final do texto; DF Buss, FA Franco Netto e JMH Machado realizaram a revisão crítica do trabalho e a elaboração do texto; PM Buss realizou a coordenação do grupo, a concepção teórica, a revisão crítica do trabalho e aprovou a versão final do texto para publicação.

Artigo aprovado em 01/04/2012

Apresentado em 21/04/2012

Versão final apresentada em 04/04/2012

O que é desenvolvimento sustentável e economia verde?

A noção de economia verde é mais recente que o conceito de desenvolvimento sustentável. Pode-se definir economia verde como aquela que "resulta em melhoria do bem-estar humano e equidade social, ao mesmo tempo em que reduz significativamente os riscos ambientais e a escassez ecológica" (United Nations..., 2011, p.

Por que a economia verde pode ajudar as pessoas de países pobres?

O principal objetivo da Economia Verde é levar ao desenvolvimento econômico buscando também a igualdade social, procurando a erradicação da pobreza e melhoria do bem-estar dos seres humanos, diminuindo os impactos ambientais e a escassez ecológica.

Qual a relação da pobreza e a sustentabilidade ambiental?

A pobreza é um importante agente de destruição ambiental, pelo que seria irracional propor um programa de preservação sem considerar os pobres, que têm na exploração dos recursos naturais sua única opção para sobreviver.

Qual é o principal objetivo da economia verde?

Economia verde é um modelo de economia que resulta em melhoria do bem-estar da humanidade e igualdade social, ao mesmo tempo em que reduz os riscos ambientais e a escassez ecológica.