Qual o papel das inovações na produção capitalista?

A inovação tecnológica não tem sido suficiente para aumentar a capacidade de o capitalismo do século 21 produzir mais riqueza. O que se tem percebido é o estancamento geral do padrão de vida nos países ricos, quando não a regressão socioeconômica

Marcio Pochmann | Publicado originalmente no site Brasil Debate 

O sistema capitalista se mostrou, em geral, uma máquina fantástica de crescimento, geralmente associado ao impulso proporcionado por ondas de inovação tecnológica.

Originalmente, a primeira Revolução Industrial e Tecnológica surgida na segunda metade do século 18 permitiu que um país com menos de 20 milhões de habitantes, como a Inglaterra na época, se tornasse a oficina do mundo, desbancado regiões que eram até então o centro produtivo do planeta, como China e Índia, com quase 600 milhões de habitantes.

Basta dizer que até 1820, a maior parte da produção do mundo resultava da somatória das atividades econômicas desenvolvidas na China e Índia. O deslocamento do velho centro produtivo da economia mundial para a Europa possibilitou a Inglaterra exercer, como nunca, a função hegemônica por cerca de cem anos.

Na sequência, a segunda Revolução Industrial e Tecnológica no último quartel do século 19 permitiu emergir novas potências quase prontas para superar a Inglaterra, como os Estados Unidos e a Alemanha.

Somente duas guerras de dimensão mundial na primeira metade do século 20 resolveram e evidenciaram pela violência e barbárie a supremacia dos Estados Unidos como o condutor do novo centro do mundo capitalista.

Dentro desta mesma perspectiva analítica, ganhou importante expressão a identificação de que o capitalismo viveria uma terceira Revolução Industrial e Tecnológica desde os anos de 1960, sobretudo nas tecnologias de comunicação e informação.

É claro que se observam inegáveis avanços representados pelos novos materiais, como ligas metálicas, eletrônica, biotecnologia, engenharia genética, conquista espacial, entre outras áreas, porém insuficientes – até o momento – para acrescentar blocos de investimentos e produção nova e adicional à estrutura produtiva existente e conformada desde o final do século 19.

Tanto assim, que os países que mais contribuíram para propulsionar a marcha das inovações tecnológicas recentes, como Japão e Estados Unidos, não expressam ritmo de elevação da produção superior às demais nações.

Pelo contrário, especialmente desde a crise de 2008, estes mesmos dois países, adicionados pelas economias da União Europeia, convivem com baixo dinamismo da produção e o emprego de sua força de trabalho.

Acontece que as mudanças tecnológicas e informacionais, que modificam rápida e decididamente a linha da produção e o quotidiano das condições de vida em sociedade, acrescem ou complementam-se aos complexos produtivos constituídos tanto pela primeira como pela segunda revolução Industrial e tecnológica.

Ao mesmo tempo, os esforços de investimentos, determinantes para o salto tecnológico, parecem ter baixo poder de arrasto para o conjunto das economias.

Diante disso é que termina sobressaindo o questionamento acerca da capacidade de o capitalismo do início do século 21 produzir riqueza mais acentuada em função dos ganhos da inovação tecnológica.

O que se tem percebido, de maneira geral, tem sido o estancamento geral do padrão de vida nos países ricos durante os últimos trinta anos, quando não a regressão socioeconômica observada nos Estados Unidos e na União Europeia.

Ademais, cabe duvidar se o crescimento econômico poderá vir novamente dos países que constituem atualmente o centro do capitalismo mundial. Se a inovação tecnológica poderia estar pouco apoiando a sustentação de uma nova economia, o que se poderia dizer do acúmulo de velhos problemas, como os representados pela economia de alto carbono e seus efeitos ambientais, dos próprios custos da globalização neoliberal.

Atualmente eles se apresentam como verdadeiros obstáculos ao crescimento econômico e pelos quais as políticas neoliberais em predomínio no mundo praticamente não têm o que dizer.

Salvo a constatação de que a população não cabe na sua totalidade no modelo econômico projetado pelas políticas governamentais de corte neoliberal.

Mesmo que pouco se saiba a respeito do futuro do capitalismo, não se pode deixar de ressaltar que o seu êxito já esteja escrito. Pelo contrário, o que se nota, são sinais inegáveis de uma pane tecnológica envolvida aos velhos e novos problemas de produção e reprodução do capitalismo.

* – Marcio Pochmann é professor do Instituto de Economia e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas

Novas formas de exploração do trabalho e de apropriação das mais-valia no processo de acumulação capitalista: transformação tecnológica e centralidade do trabalho

A vocação histórica do capitalismo, a sua grande justificação histórica, é o aumento da produtividade social do trabalho humano. Expandir esta produtividade sem contemplações, nas palavras do próprio Marx. A introdução e o emprego generalizado das máquinas, que o tornou possível a uma escala sem precedentes, foi um dos grandes triunfos do capitalismo.

Repare-se que se são maiores as quantidades produzidas pelos trabalhadores, maiores poderiam ser os seus consumos, os seus meios de vida, o seu bem-estar. O aumento da produtividade cria as condições para o aumento real dos salários e para uma vida melhor, mas essa potencialidade é permanentemente posta em causa na sociedade capitalista em prol da defesa e aumento dos lucros.

Na concorrência entre capitalistas, cada um procura sempre cortar custos, para baixar preços e ganhar quota de mercado aos seus concorrentes, aumentando os seus lucros. A redução de custos pode ser feita genericamente pela redução dos salários, pelo aumento da intensidade ou da duração do tempo de trabalho – ambas com limites naturais e sociais impostos pelas necessidades biológicas de conservação da própria força de trabalho e, acima de tudo, pela resistência dos trabalhadores – ou ainda pelo progresso técnico. Esta última via torna-se central no longo prazo. Necessária para a empresa sobreviver e ainda mais para crescer.

A ciência é cada vez mais solicitada a actuar como “força produtiva directa”, entendendo-se por isso a sua instrumentalização para a actividade produtiva, necessariamente mediada por determinadas aplicações tecnológicas. As tecnologias mais avançadas, as ditas “de ponta”, são principalmente desenvolvidas sob a alçada ou a influência dos grandes monopólios, mesmo quando resultam de investigações levadas a cabo em universidades, institutos ou organismos públicos, como é frequentemente o caso.

As inovações técnicas são avaliadas em função do que permitem abater nos custos, para estabelecerem preços competitivos. Mas a nova técnica que aumenta o produto por trabalhador e diminui os custos necessita em geral de maiores investimentos em máquinas, em equipamentos, em instalações (mais capital fixo), aumenta a escala de produção, processa uma maior quantidade de matéria-prima, utiliza maior quantidade de energia e materiais auxiliares. O aumento do capital constante adiantado e da escala da produção é o meio de reduzir os custos na batalha de concorrência.

Ou seja, o desenvolvimento tecnológico aumenta a produtividade do trabalho, aumenta o produto por trabalhador, substitui força de trabalho por máquinas, diminui os custos laborais por unidade de produto, mas aumenta o capital constante em relação ao custo do produto. O capital variável (a força de trabalho) diminui em relação ao capital adiantado e ao valor produzido. A massa de mais-valia, criada pela força de trabalho, ainda que geralmente crescente, diminui também em relação ao capital investido. Resultado: a taxa de lucro diminui ou, mais rigorosamente, tende a diminuir.

As novas tecnologias, o revolucionamento científico e técnico da produção, sempre com o fito em cada empresa de aumentar a produtividade, cortar custos, baixar preços, ganhar quota de mercado, vencer a concorrência, aumentar os lucros, quando se generalizam, exactamente por força da própria competição capitalista, tendem a baixar a lucratividade de todas.

Daí o esforço de procurar tirar sempre mais, de extrair o máximo, de cada trabalhador, com a intensificação ou extensão do trabalho, e a tentativa de diminuir os encargos directos e indirectos, com a degradação dos salários, das contribuições sociais e das condições de trabalho.

A utilização capitalista das novas tecnologias pressiona a elevação dos ritmos de trabalho e a extensão dos tempos de trabalho, embaratece os bens e serviços produzidos, nomeadamente os meios de subsistência dos trabalhadores e com isso o valor dos seus salários reais, o valor da sua força de trabalho. Diminui a parte da jornada de trabalho em que os operários produzem o equivalente aos seus salários, aumenta a parte em que produzem o excedente (a mais-valia) que fica com o patronato. Aumenta o grau de exploração.

O conjunto notável e efervescente dos produtos e das tecnologias mais recentes, nomeadamente nas áreas das tecnologias de informação e comunicação, da automatização e da robótica, da informatização e da inteligência artificial, da eletrónica e da nanotecnologia, da engenharia genética e da biologia, entre outras, configuram um panorama de profundas alterações tecnológicas, eventualmente merecedor da designação de revolução científica e técnica, susceptível de modificar profundamente os tecidos produtivos, com profundas implicações na produção e na distribuição da riqueza, no emprego e na qualidade do emprego, na acção colectiva e na luta dos trabalhadores.

Novas formas de actividade, aparentemente muito modernas, como as plataformas digitais, por onde se busca e oferece trabalho, ou como certos trabalhos em rede, à distância, pela net, gabados porque feitos a partir de casa, frequentemente mais não fazem que reproduzir, no século XXI, desapiedadas e vergonhosas formas de exploração conhecidas do século XIX. Com a diminuição da resistência dos trabalhadores pela sua dispersão, a concorrência exacerbada entre eles, a intermediação rapace de empreiteiros de mão-de-obra, a irregularidade de ocupação, os encargos materiais a cargo dos próprios, a competição desleal com empresas providas de outros meios técnicos. Algumas destas formas de trabalho, face às praças de jorna de outrora, têm a agravante dos trabalhadores contactarem menos entre si, ficando mais desprotegidos.

A apropriação capitalista das novas tecnologias, com a substituição de trabalhadores por máquinas, a competição entre trabalhadores e máquinas, a pressão para a rentabilização dos capitais, impulsiona a exploração, reedita velhas formas de organização do trabalho e constitui um fortíssimo estímulo de precarização das relações laborais, com a generalização do trabalho irregular, a tempo parcial, a prazo, sem horários, sem condições, sem direitos, tantas vezes sem contrato.

Ao nível de cada empresa, o crescimento da produtividade representa sempre uma diminuição relativa do trabalho: consegue-se aumentar o produto sem aumentar o trabalho. Da mesma forma, à escala social, se a produtividade do trabalho crescer mais rápido que o aumento da produção, o emprego diminui e o desemprego aumenta. Não há semana em que não se divulguem na imprensa estudos, análises, opiniões, com previsões catastrofistas sobre as implicações das novas tecnologias no aumento do desemprego.

No quadro social capitalista em que se desenvolvem, as descobertas científicas e as inovações tecnológicas impulsionam, por um lado, a acumulação e centralização do capital, mas, por outro lado, frequentemente também uma desconcentração do trabalho, nomeadamente o desmantelamento de grandes concentrações operárias. Geram-se tensões e criam-se fracturas sociais, que também agravam os desequilíbrios regionais. As disrupções provocadas tanto no emprego como na acumulação de capital, seja com o desemprego sobretudo dos trabalhadores menos qualificados, a desvalorização da força de trabalho e o agravamento da exploração, seja com a expulsão de capitais mais fracos, a perda de rentabilidades e o agravamento da concorrência, induzem movimentos migratórios mais ou menos forçados de trabalhadores e de capitais, para países ou locais onde consigam sobreviver.

O crescimento da produtividade alimenta o exército de reserva do capital e contribui, por essa via, para a redução do custo da mão-de-obra. Cria desempregados por um lado e sobrecarrega o trabalho dos empregados por outro. Sob o capitalismo, as inovações técnicas suprimem directamente empregos, reduzem o valor da força de trabalho, degradam as relações laborais, atacam a coesão e a acção colectiva dos trabalhadores, eliminando barreiras ao agravamento da sua exploração.

Mas a dita revolução científica e técnica, ainda mais levada às últimas consequências dos seus arautos, não é o sonho dourado do capital.

A desconcentração do trabalho pode prejudicar a formação da consciência de classe mas não significa o desaparecimento do trabalho colectivo. As forças de trabalho continuam a estar em cooperação, em interdependência, em concertação, tendencialmente até crescentes. Alarga-se a socialização da produção. Alarga-se o campo de relacionamento dos trabalhadores uns com uns os outros. Antes dispersos por firmas diferentes passam a integrar firmas sob alçada de uma mesma estrutura societária. Negócios antes independentes passam a estar inseridos em processos produtivos coordenados por um mesmo capital. O desenvolvimento de um sofisticado software pode exigir o trabalho coordenado de milhares de trabalhadores. As tecnologias que permitem que trabalhadores em sítios diferentes trabalhem coordenamente, permitem também que, em alguma medida, contactem uns com os outros. Factor não dispiciendo para a dinamização da acção colectiva, a mobilização e a luta dos trabalhadores.

Leve-se também em conta que o capitalismo se defronta com várias dificuldades em incorporar o salto qualitativo das novas tecnologias. Um exemplo visível é o da reprodutibilidade informática sem custos ou com custos desprezáveis, proporcionando a apropriação gratuita de determinados produtos, mesmo que ilegal, por consumidores e fabricantes concorrentes. Produtos cujo desenvolvimento exigiu pesados investimentos e cuja remuneração fica assim posta em causa. Estamos perante um choque entre a potencial gratuitidade de amplos produtos e serviços e a mercantilização de tudo o que seja possível pelo capitalismo, a contradição entre as potencialidades tecnológicas de difusão gratuita e as relações de produção capitalistas, com os seus imperativos de rentabilização de capitais privados.

Mas outros problemas ainda mais graves para a reprodução capitalista são tendencialmente levantados. Se as novas tecnologias criam massivamente desemprego, se diminuem substancialmente o poder de compra dos trabalhadores, então agravam-se as dificuldades de realização da mais-valia (da sua conversão em dinheiro, que fornece os lucros dos empresários), visto que se restringem os mercados para a venda dos produtos. Se, no limite, substituíssem todo o trabalho humano vivo pelo “trabalho” das máquinas (elas próprias fabricadas por máquinas), caberia então perguntar, como num célebre diálogo entre um sindicalista e um patrão, como os capitalistas realizariam os seus lucros visto que as máquinas não compram nada.

Mas o problema vai ainda mais fundo, não apenas na realização, mas na própria produção de mais-valia. A substituição do trabalho por máquinas encolhe a fonte dos lucros dos capitalistas, que provém da diferença entre o valor criado pelos operários e o valor que recebem nos salários. No limite de uma completa substituição do trabalho humano por máquinas, a taxa de lucro seria zero e o capitalismo não seria possível.

A completa automatização é incompatível com a economia de mercado, com os lucros, com o capital, com a acumulação capitalista, com a sociedade capitalista. Se a eventual revolução científica e técnica permanecer subordinada à acumulação capitalista, à busca do lucro individualmente por cada empresa, então as próprias dificuldades de produção e de realização da mais-valia, para além das chagas sociais abertas, imporão limites incontornáveis ao seu desenvolvimento.

Sob o capitalismo, as novas tecnologias são instrumentalizadas pelo capital para agravar a exploração e dominar os trabalhadores. Tornam-se um instrumento de exploração, de opressão e de dominação, um instrumento do patronato na luta de classes. Essa, do ponto de vista capitalista, é a sua maior justificação social, quaisquer que sejam os panegíricos com que venha embrulhada.

Mas as novas tecnologias, em vez de tirarem o trabalho a uns e intensificarem e degradarem o trabalho de outros, poderiam, inversamente, ser desde logo utilizadas para uma significativa redução, sem perda de rendimentos, do tempo de trabalho de todos os trabalhadores, que reduzisse ritmos de trabalho, que disponibilizasse tempo de lazer sem retirar meios para o usufruir, que contribuísse seriamente para reduzir o actual desemprego. Uma redução do tempo de trabalho sem redução do salário nem das prestações sociais, que repartisse a carga de trabalho existente pelo conjunto dos trabalhadores.

Claro que esta seria uma lógica diferente, oposta à lógica capitalista, do aumento dos lucros. Uma lógica que colide com os interesses e com os rendimentos do grande capital, e cuja efectivação exigiria rupturas desde logo com a dominação monopolista.

Rupturas que passam por arrancar das mãos do capital monopolista empresas e sectores estratégicos, pelo seu controlo público, como prelúdio de um regime em que os grandes meios de produção, controlados e dirigidos pelos trabalhadores em vez dos capitalistas, aproveitassem plenamente as potencialidades das inovações tecnológicas para acabar com o desemprego, a miséria e as chagas sociais do capitalismo. Vale a pena realçar, a propósito, o importante papel que as empresas públicas nacionalizadas tiveram no desenvolvimento tecnológico em Portugal.

Noutro tipo de sociedade, organizada e orientada para a satisfação das necessidades e das aspirações dos trabalhadores e das populações em vez do lucro e da acumulação dos grandes capitalistas, numa sociedade socialista em lugar de uma sociedade capitalista, não há limite para o aproveitamento das potencialidades da ciência e da técnica. As descobertas científicas e as aplicações tecnológicas, em lugar de fornecerem condições e instrumentos de exploração e de opressão, de degradação e desqualificação do trabalho humano, serão factores fundamentais do aproveitamento e do usufruto mais completos das capacidades individuais e colectivas, um instrumento decisivo de emancipação humana.

Qual a principal inovação do capitalismo?

As características centrais do capitalismo são a propriedade privada e a acumulação de capital. O sistema capitalista tem como vantagens importantes a liberdade econômica, a inovação tecnológica e a livre concorrência.

Como as inovações tecnológicas atuaram no capitalismo?

Sob o capitalismo, os capitalistas individuais introduzem tecnologia e melhoram a produtividade para aumentar seu próprio lucro individual, sem qualquer consideração pelos padrões de vida dos trabalhadores ou pelas necessidades da sociedade.

Qual o papel fundamental do consumo das tecnologias no sistema capitalista?

Nesse sentido, tem-se a tecnologia como um fator imprescindível para a análise do contexto socioeconômico e, sobretudo, da posição do trabalhador em relação ao sistema de produção. difundir, enquanto a ordem econômica e social influencia a direção assumida pelo desenvolvimento tecnológico”.

Qual o papel das inovações tecnológicas?

A inovação tecnológica consiste em um dos fenômenos mais importantes no mundo contemporâneo, sendo responsável pela mudança no modo de viver das pessoas e pela prosperidade econômica de empresas e países.