Licenciada em Matemática (UEPB), pós-graduanda em Ensino de Ciências e Matemática (UAB-IFPB) Show
A Matemática é uma ciência cada vez mais discutida por meio de diferentes metodologias de ensino, devido aos desafios impostos por sua linguagem formal, abstrata e na perspectiva de novas possibilidades dentro da área da Educação. Esta pesquisa parte de uma análise interdisciplinar para refletir as possibilidades de contribuir e ressignificar abordagens da Matemática pelas inter-relações das áreas do conhecimento. Tem suma importância para o desenvolvimento de práticas interdisciplinares no âmbito escolar, tornando o processo interessante e desafiador, visto que a Matemática tem sua história, sua linguagem, sua estética e a partir disso forma um elo com as demais áreas de linguagens do currículo. As práticas interdisciplinares e a sua utilização na Matemática têm sido objeto de estudos frequentes dos pesquisadores. “A interdisciplinaridade evidencia a necessidade de identificação das múltiplas perspectivas constituintes de um fenômeno/acontecimento, ensejando maior ligação, maior vínculo, entre os saberes das distintas áreas de conhecimento” (Lima; Ramos, 2017, p. 165). A arte também é linguagem, tem história e estética, além de ser uma forma livre de expressão, que tem finalidade e pode ser retratada por meio de pinturas, esculturas, desenhos, danças e músicas, dentre outras formas. E nessa expressão estão inseridas as influências do meio externo ao qual o indivíduo pertence ou com que teve contato. Incorpora o contexto social e político, tem relação com a produção de determinado artista ou de uma vanguarda artística. Contextualizada historicamente, a Matemática visualizada nas obras de arte tem potencial para tornar a aprendizagem mais significativa, na tentativa de fazer com que possamos desmistificar as concepções e estigmas existentes em relação à Matemática socializada no espaço escolar. Dito isto, a pesquisa busca essa aproximação interdisciplinar entre a Matemática, a Arte e a História mediante o estudo da biografia e de obras do artista Pieter Cornelis Mondriaan (1872-1944), mais conhecido como Piet Mondrian. Ao investigar relações entre a Matemática e a Arte na biografia e no conjunto de obras e escritos de Mondrian, é preciso fazer algumas considerações históricas. Na época do artista, que abrange das últimas décadas do século XIX e até meados do século XX, ganham destaque movimentos artísticos como o cubismo e o neoplasticismo. As vanguardas lhe proporcionaram possibilidades de contato com variados estilos; o impressionismo presente em suas primeiras obras, com a ausência de traços bem definidos; já o cubismo o leva ao trabalho com linhas verticais e horizontais pela observação das árvores, até o neoplasticismo com a ausência de linhas diagonais que a vanguarda cubista retratava. Tivemos o avanço do capitalismo e da industrialização na Europa; episódios decisivos como a Primeira Guerra Mundial (1914-1918); o período do Entre Guerras; a Grande Depressão; e a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Já a Matemática no final do século XIX para o início do século XX passou por intensa modernização, o que levou a Geometria a uma nova fase de abstração.
Todo esse contexto histórico e material é decisivo para entender nosso objeto de estudo. Ao nos debruçarmos sobre o artista Mondrian e sua trajetória, na tentativa de desvelar o papel da Matemática na concepção de suas obras e sob quais influências foram pautadas, compreendemos algumas das vanguardas da época, que irão do impressionismo ao neoplasticismo, analisaremos a geometrização dos seus traços e quais aspectos abstratos serão decisivos nessa abordagem interdisciplinar. Em particular, o contato com o cubismo foi essencial para a representação das suas obras, que ganharam uma perspectiva mais abstrata. Somado a essa vanguarda, Mondrian teve a influência teosófica, ambos elementos decisivos para a criação do neoplasticismo, movimento artístico liderado por ele ligado à arte abstrata para expressar sua arte por meio de características mais autorais, que o distinguem do cubismo e o levam a novas abordagens até o neoplasticismo. As bases deste movimento foram criadas com a sua participação a partir da formação de um grupo, somado a outros artistas para a fundação de uma revista, a De Stijl (em tradução livre, Estilo). Nesse sentido,
Ainda em sua fase cubista, já se notava um diferencial em relação aos outros artistas da mesma vanguarda: mudança das cores e planificação de suas obras; isto é, atingiu um momento em que esse movimento artístico não comportou os ideais, as estruturas e as expressões artísticas exclusivas do artista que estavam pautadas na abstração, daí a necessidade da vanguarda do neoplasticismo. Em meio à transição, ele contou com a influência do teósofo e matemático Dr. Schoenmakers (1875-1944). Teósofo, filósofo e matemático, o holandês Mathieu Hubertus Josephus Schoenmaekers estudou Teologia e Filosofia e foi influenciado pelo professor de Ciências Bíblicas E. Gismondi. Recebeu seu PhD em filosofia em 1899, ano em que também ocorreu sua ordenação. Seu doutorado em Teologia ocorreu em 1900, depois disso voltou para a Holanda. Logo, como objeto de estudo teremos a produção artística de Mondrian, cuja análise permitirá melhor percepção da Matemática, do abstracionismo. Para tanto, faz-se necessário entender o conceito de dualismo e outros que permearam a sua intencionalidade matemática, levando em consideração os aspectos históricos. Em consequência, no processo de ensino-aprendizagem a Matemática tem potencial para tornar a aprendizagem interdisciplinar, por meio de uma proposta de projeto de ensino relacionada a Mondrian, um caminho para despertar no aluno o interesse por conteúdos matemáticos que desconhece. Ao entender a História, a Arte e a Matemática em Mondrian, poderemos contribuir na linha de práticas interdisciplinares. Referencial teóricoPieter Cornelis Mondriaan, posteriormente conhecido como Piet Mondrian, nasceu em 7 de março de 1872, em Amersfoort, Holanda.
Começou a pintar com seu tio, o artista Frits Mondriaan, em 1886. Com gosto e vocação para o meio artístico, Mondrian ingressou em 1892 na Academia de Belas Artes, em Amsterdã.
Ele demonstrava em suas primeiras pinturas o estilo impressionista de fins do XIX, já que cresceu durante o final dessa vanguarda, cujo nome remete à expressão de emoções; marcada pela forma de utilização da cor e ausência de contornos bem definidos, como vemos nas Figuras 1 e 2, pela composição dos elementos e luz. Teve contato com obras de Cézanne (1839-1906) e Van Gogh (1853-1890), dois representantes do impressionismo e do pós-impressionismo. Figura 1: Piet Mondrian – Molen; Molen bij zonlicht, 1908. A pintura expressa o estilo da vanguarda impressionista Fonte: Gemeentemuseum, Haia. Figura 2: Piet Mondrian – Duin I, 1909. Vemos a utilização da ausência de contornos que evidencia o impressionismo Fonte: Gemeentemuseum, Haia. A partir dos estudos, suas pinturas foram mudando gradativamente na procura da essência da forma e das relações definidas entre cores e linhas, como detalharemos adiante. Em 1900, ainda na cidade de Amsterdã, seu contato com a Teosofia influencia nessa perspectiva; viaja para Brabante, cidade holandesa, em 1903, onde passa a morar; depois retorna em 1905 a Amsterdã, onde permanece até 1911; em 1912, “já reconhecido como um dos melhores pintores de paisagens da Holanda, Mondrian se muda para Paris, onde reside e trabalha na Rue du Départ. Passa a se aventurar no cubismo. A partir de então, assina suas obras como P. Mondrian” (Tjabbes, 2015, p. 17). À medida que entrava em contato com as vanguardas artísticas, desenvolvia a tendência à abstração, o que gerou a produção de uma série de pinturas. Segundo Zaleski (2009), foi na representação de árvores que ele encontrou material para extremos de simplificação, perseguindo uma árvore arquétipo, abstrata, geométrica. Observa-se nas figuras a seguir a transição dessa representação; as duas primeiras pinturas expressam o elemento da natureza árvore, enquanto a terceira expressa a simplificação dele.
As Figuras 3, 4 e 5 apresentam o processo descrito acima. Figura 3: Piet Mondrian – The Red Tree (1908-1910). Representa a pintura figurativa Fonte: Gemeentemuseum, Haia. Figura 4: Piet Mondrian – The grey tree (1911). Representa a transição entre a pintura figurativa e sua simplificação Fonte: Gemeentemuseum, Haia. Figura 5: Piet Mondrian – Blossoming apple tree (1912). Representa a simplificação de sua pintura figurativa em formas retilíneas, horizontais e verticais, definidas e simples Fonte: Gemeentemuseum, Haia. Mondrian e a TeosofiaA Teosofia teve papel importante e esteve presente nas obras do artista; foi a partir dela que Mondrian explorou a natureza e trouxe a questão da dualidade. Em Amsterdã, por volta de 1900, começou a estudar sobre ela; dentre as suas referências nesse estudo encontram-se: madame Helena Petrovna Blavatsky (1831-1891), escritora mais conhecida como Helena Blavatsky ou madame Blavatsky, foi uma das fundadoras da Sociedade Teosófica; e Rudolf Steiner (1861-1925), filósofo que entre os anos de 1902 e 1912 foi líder da Sociedade Teosófica na Alemanha. Em 25 de maio de 1909, filiou-se à Sociedade Teosófica da Holanda, organização internacional que visava expandir os ensinamentos da Teosofia.
A Teosofia esteve presente nas expressões artísticas de Mondrian (Zaleski, 2013, p. 83):
Figura 6: Piet Mondrian – Devotie (Devoção) (1908). Jovem meditando sobre uma flor Fonte: Gemeentemuseum, Haia. Figura 7: Piet Mondrian – Bosch Bos bij Oele (1908). Representando o conceito da Teosofia sobre opostos Fonte: Gemeentemuseum, Haia. Todavia, as ideias que tinha a respeito da Arte geraram conflito na relação com a Sociedade Teosófica, pois seu pensamento divergia do pensamento dos artistas holandeses ligados à Teosofia, que, em sua maioria, restringiam a arte teosófica ao simbolismo, vanguarda artística voltada ao resgate dos símbolos por meio da exploração dos elementos da natureza, a oposição ao materialismo e o uso cores sombrias, fatos que fizeram com que os trabalhos produzidos por Mondrian não fossem bem aceitos por essa Sociedade. Na cidade de Laren (Holanda), entre 1915 e 1916, Mondrian conhece o teósofo, filósofo e matemático holandês Mathieu Hubertus Josephus Schoenmaekers (1875-1944), que escreveu nesse mesmo período suas obras Het neiuwe Wereldbeeld (A nova imagem do mundo) e Beeeldende Wiskunde (Princípios de Matemática Plástica), sendo influência para Mondrian e o desenvolvimento da revista De Stijl.
No outono de 1913, sem dúvida com o apoio da teoria de Schoenmaekers, Mondrian elaborou um princípio que manteve ao longo de sua vida:
A pintura possui um meio de expressão matemática e está esteticamente associada às cores e linhas de tal maneira a aparecer como plana e com retângulos em suas composições. Mondrian e o cubismoMondrian participou em 1911 da exposição em Amsterdã que contou com pinturas cubistas de Georges Braque (1882-1963), pintor e escultor francês criador do cubismo juntamente com Pablo Picasso (1881-1973), pintor, escultor e ceramista espanhol que morou boa parte da vida na França. Na preparação da mostra,
Nessa perspectiva o contato com o cubismo forneceu a Mondrian a base para que seu estilo se evidenciasse e se voltasse à abstração. Dessa vanguarda, em Realidad natural y realidad abstracta, Mondrian escreve que
Para o artista, a arte é uma expressão de estilo individual (aparência temporária) ou universal (conteúdo atemporal); quando esse estilo de conteúdo universal aparece mais definido plasticamente será um estilo mais puro, dando ênfase ao absoluto que se expressa na natureza, que estava oculto ou velado pela cor e pela forma naturais.
Sua plástica mais pura diz respeito à dualidade, remetendo à Teosofia, com uma estética voltada aos opostos na representação da arte, o vertical e o horizontal, que vem substituir toda a composição clássica por esses dois tipos de linhas. O que diferenciava o trabalho cubista de Mondrian, além de uma maior abstração, era a composição, ou seja, a disposição em que se encontram, de que forma e em que proporções são distribuídos os elementos visuais em suas obras. No cubismo percebe-se que a representação dos elementos na tela é feita por meio de figuras geométricas; como o próprio nome sugere, são expostas principalmente as cúbicas, mas utilizam-se outras formas geométricas, como as cilíndricas, além de linhas retas horizontais, verticais e diagonais que remetem à ideia de volume. As primeiras pinturas cubistas de Mondrian possuem cores semelhantes à da vanguarda, monocromáticas e opacas; seus traços contêm linhas verticais e horizontais e remetem ao cubismo analítico (1910-1912), que é a fase mais abstrata da arte cubista e se caracterizava pela análise das formas e sua fragmentação em um modo plano; ele teve contato com essa fase ao observar as obras de Georges Braque e Pablo Picasso, já que ela surgiu da junção do trabalho desses artistas e tem influência do pintor Paul Cézanne (1839-1906), o precursor do movimento cubista. Como está na Figura 8, Jennifer Blessing descreve esta obra no Museu Guggenheim como Disponível em: https://www.kunstmuseum.nl/nl/collectie/tableau-no-4-schilderij-no-4-composition-noviii-compositie- 3?origin=gm. Acesso em: 19 nov. 2020
Figura 8: Piet Mondrian – Tableau nº 2/Composition nº VII (1912). Essa pintura representa a vanguarda cubista Fonte: Museu Solomon R. Guggenheim. Ao serem evitadas as sugestões de volume, o artista começa a transitar para um novo estilo de pintura, desencadeando uma nova vanguarda que será liderada por ele. Mondrian e o neoplasticismoComo resultado de sua relutância na utilização de diagonais e quaisquer traços que remetessem à ideia de volume, Mondrian deixa o cubismo. Ainda durante a Primeira Guerra Mundial surgiu o De Stijl (1917-1931), onde ele se destacou, juntamente com o artista plástico, arquiteto, e pintor holandês de arte abstrata Theo Van Doesburg (1883-1931) e o arquiteto Gerrit Rietvel (1888-1964), que projetou a Residência Schröder, localizada em Utrecht, inscrita no Património Mundial pela Unesco, um marco na arquitetura moderna que representa as ideias e conceitos da De Stijl; sua composição também contou com artistas plásticos, arquitetos e poeta. Esse movimento foi fundado a partir do grupo da revista de mesmo nome, a qual foi a base para o surgimento da vanguarda liderada por Mondrian, o neoplasticismo, que é uma vanguarda artística vinculada à arte abstrata, com características próprias que incluem uma estética mais pura, ou seja, sem a utilização de figuras geométricas espaciais e com objetos menos identificáveis. Diferentemente do cubismo, em que a paleta de cores abrangia o cinza, o marrom, o ocre, o verde e o preto, nota-se que no neoplasticismo a representação da paleta de cores é voltada para as cores primárias.
Exemplificamos com as figuras 9 e 10, que correspondem respectivamente às fases do cubismo e do neoplasticismo do artista; ressaltam-se as diferenças nas composições. É notória na Figura 9 a presença da diagonal, que remete à característica visual espacial da vanguarda, além dos tons em ocre e cinza. As fortes linhas pretas verticais e horizontais ganham destaque na Figura 10, onde compõem a estética mais pura da obra voltada às cores primárias, levando ao abstracionismo que, segundo o próprio Mondrian, “enquanto a relação equilibrada se expressa no natural pela posição, dimensão e valor das formas e cores naturais, na representação ‘abstrata’ ela se expressa pela posição, dimensão e valor da linha reta e da superfície (de cor) retangular” (Mondrian, 1917, p. 31). Figura 9: Piet Mondrian – Composition in Oval with Color Planes 1 (1914). Representação do cubismo Fonte: The Museum of Modern Art (MoMA). Figura 10: Piet Mondrian – Composition with red, blue, black, yellow and grey (1921). Representação do neoplasticismo Fonte: The Museum of Modern Art (MoMA). Antes do início da Primeira Guerra Mundial, Mondrian voltou à Holanda para visitar o seu pai, que estava doente, permaneceu ali até 1919 e continuou desenvolvendo seus trabalhos. Essa fase foi importante para o neoplasticismo; acerca disso, ele escreve:
A revista De Stijl permitiu a publicação dos ideais que o artista e seus companheiros de vanguarda tinham; Mondrian se destacou desde o início até o seu rompimento, em 1931. Também se rompeu o seu relacionamento com Theo Van Doesburg, pois o arquiteto tinha interesse nas linhas diagonais, em trabalhar com elas; assim, suas ideias não mais eram compatíveis com as do artista, que excluiu essas linhas diagonais e tudo que remetesse a volume no Neoplasticismo.
Em setembro de 1938, mudou-se de Paris para Londres para escapar da ameaça de uma invasão alemã; ali produziu a obra Trafalgar Square, a primeira de uma série de pinturas com o título de locais que lhe foram refúgio durante a Segunda Guerra Mundial. Figura 11: Piet Mondrian – Trafalgar Square, 1939-1943. Representação do neoplasticismo por planos pequenos e sutilmente texturizados por cores primárias Fonte: The Museum of Modern Art (MoMA). Figura 12: Piet Mondrian – Broadway Boogie Woogie, 1942-1943. Representação da última obra finalizada de Mondrian Fonte: The Museum of Modern Art (MoMA). Sua última obra finalizada, Broadway Boogie Woogie 1942-1943 é resultado de sua ida a Nova York em 1940, ainda devido à Segunda Guerra Mundial. Tal nome para a pintura veio em decorrência de ter gostado da cidade e do estilo de música boogie-woogie. Dos aspectos observados na Figura 12 temos a omissão da cor preta e a quebra das barras de cores em segmentos multicoloridos. Piet Mondrian faleceu em Manhattan, Nova York, no dia 1 de janeiro de 1944, por causa de uma pneumonia. MetodologiaA metodologia utilizada neste trabalho descreve-se como qualitativa e tem como objeto de estudo o pintor Piet Mondrian, as influências matemáticas que o cercam, seu pensamento abstrato, sua intencionalidade matemática e a geometrização por trás das suas obras. Acerca dos procedimentos metodológicos dispostos para a análise da formação dos elementos de suas obras, suas concepções matemáticas e contexto histórico, foi utilizada a pesquisa bibliográfica e documental, incluindo a de caráter biográfico, que fornece suporte para a construção do desenvolvimento teórico, com enfoque na interdisciplinaridade entre Matemática, História e Arte. Foram leituras de trabalhos acadêmicos científicos pesquisados através de palavras-chave como Mondrian, neoplasticismo etc. no portal de Periódicos da Capes, além de escritos do próprio Mondrian traduzidos por João Carlos Pijnappel. Trata-se de sete escritos reunidos em um único arquivo, intitulado Neoplasticismo na pintura e na arquitetura (2008) e o texto La nueva imagen en la pintura (1983), este último organizado por Alice Pells; eles são essenciais para o entendimento da composição, da dualidade e da abstração. Consultou-se também o livro sobre as vanguardas intitulado Conceitos da Arte Moderna (1983), de Nikos Stangos, descrito como uma coletânea de ensaios críticos por alguns dos mais importantes e renomados historiadores e críticos de arte da Inglaterra e dos Estados Unidos. No acervo bibliográfico, também contamos com acesso virtual aos museus que concentram as principais obras de suas diversas fases, obras de outros artistas das vanguardas cubista e neoplástica, o que possibilitou a análise comparativa de linhas geométricas, composição, influências e transições entres as fases, fomentando a análise e a obtenção de resultados da pesquisa. Abstracionismo e MondrianMondrian tornou-se um pintor singular; nas suas obras o abstracionismo está presente nas vanguardas artísticas representadas pelo cubismo e o neoplasticismo. De todo o levantamento bibliográfico, incluindo os escritos de Mondrian, evidenciamos a intencionalidade matemática na sua arte. No cubismo é notório que o artista vai extinguindo as linhas curvas e os ângulos obtusos de suas composições, restando as linhas verticais, horizontais e algumas diagonais que desaparecerão de sua obra posteriormente. Há uma relação teórica e conceitual entre a ausência das linhas curvas, ângulos obtusos e das diagonais com a perda do volume e da profundidade das suas composições. Mondrian, em 29 de janeiro de 1914, em carta endereçada ao professor e crítico de arte H. P. Bremmer, escreve:
Figura 13: Piet Mondrian – Tableau nº 4/Composition nº VIII (1913). Representa o movimento cubista com tema menos reconhecível Fonte: Gemeentemuseum, Haia. Figura 14: Georges Braque – Natureza morta com uma garrafa (1911). Representa o movimento cubista com tema mais reconhecível Fonte: Museu Pablo Picasso. Analisando as obras retratadas nas Figuras 8 e 13 e comparando-as com a de Georges Braque (Figura 14), é notório como as telas de Mondrian apresentam maior nível de abstração, pois os elementos que as compõem trazem objetos menos identificáveis, há maior planificação devido à resistência na utilização de linhas curvas e formas geométricas espaciais; na Figura 14 há a identificação do objeto garrafa, estão bem expressas as formas geométricas cúbicas e cilíndricas, remetendo à ideia de volume característica da vanguarda. A princípio, a paleta de cores do cubismo abrangia o cinza, o marrom, o ocre, o verde e o preto, mas no processo de transição para a vanguarda neoplasticista foram acrescidas as cores rosa, azul, amarelo e vermelho, para assim reduzi-la às cores primárias. A cor está diretamente relacionada à perda do volume e da profundidade. É possível observar como Mondrian relaciona a escolha das cores com um aspecto geométrico: “a cor natural no neoplasticismo não se intensificou apenas porque foi reduzida à cor primária, mas também porque ela aparece como plana” (Mondrian, 1917, p. 49). Nesse movimento artístico os elementos da composição tornam-se não identificáveis; “a pintura encontrou esse neoplasticismo ao reduzir, na imagem, a corporeidade das coisas a uma composição de planos que dão a ilusão de repousarem sobre um único plano” (Mondrian, 1917, p. 50); daí a simplificação em extremos opostos (linhas verticais e horizontais) que criam uma relação em posição equilibrada, a relação perpendicular, em que essa perpendicularidade ocorre entre linhas ou delimita-se por planos de cor, evidenciando retângulos em suas composições, como o artista cita em seus escritos, mostrando consciência matemática nas suas produções. Logo, fica claro que Mondrian estudava e conhecia diversos conceitos geométricos e abstratos da Matemática e que eles foram determinantes em sua produção artística. Interdisciplinaridade no ensino da MatemáticaContextualizados pela História, temos que a Matemática visualizada nas composições de Mondrian tem potencial interdisciplinar na aprendizagem; todo levantamento bibliográfico serve de base para uma proposta de projeto de ensino, um caminho para despertar no aluno o interesse por conteúdos matemáticos que desconhece. Com base no pensamento analógico, utilizando o conhecimento que temos sobre uma disciplina específica, podemos entender melhor uma outra, fazendo representações abstratas. “Ao permitir acesso e (re)construção de significados por meio de caminhos distintos e fornecendo um significado mais amplo para as ideias de conhecimento e inteligência, o pensamento analógico fornece mais condições para sentir o conhecimento” (Abdounur, 2010, p. 1). Dos estudos, ao entender a História e a Arte, confirmamos a consciência matemática de Mondrian em suas composições; como contribuição nesta pesquisa, na linha de práticas interdisciplinares e pensamento analógico, propõe-se um projeto de ensino de nível Ensino Médio voltado para o desenvolvimento de um trabalho investigativo, interdisciplinar e colaborativo.
Desenvolvimento:Parte 1:
Parte 2:
Exemplos de obras para utilização no desenvolvimento do projeto. Disponível em: https://www.moma.org/collection/works/78441?artist_id=4057&page=1&sov_referrer=artist. Acesso em: 09 fev. 2021. Exemplo de esboço feito pelo próprio Mondrian. Disponível em: https://www.kunstmuseum.nl/nl/topstukken/afgebroken-gebouw-schetsboek-ii-folio-21?origin=gm. Acesso em: 26 jan. 2021. Parte 3:
Esse processo de contextualização serve para melhor orientar os alunos a desenvolver habilidades e potencialidades para construção de significados inerentes na produção de conhecimento interdisciplinar voltados aos estudos de História, Arte e Matemática.
E mais: a “interdisciplinaridade é uma nova atitude diante da questão do conhecimento, de abertura à compreensão de aspectos ocultos do ato de aprender e dos aparentemente expressos, colocando-os em questão” (Fazenda, 2002, p. 11). Considerações finaisEste estudo teve como objetivo investigar a intencionalidade matemática nas obras de Piet Mondrian, por intermédio de uma pesquisa bibliográfica, que comprovou a existência da consciência matemática do artista, que estudava e conhecia diversos conceitos geométricos, abstratos e cuja aplicação foi analisada e confirmada em sua produção. Foram explorados os fatores teosófico, abstrato e geométrico nas construções matemáticas dos trabalhos do pintor, desde as que remeteram ao abandono de linhas diagonais, impactando a perda de profundidade espacial, até a ênfase no trabalho com as linhas verticais e horizontais associado às cores para ressaltar o plano, culminando em sua fase final com composições tinham estrutura voltada ao equilíbrio, com poucos elementos, expresso pela posição, dimensão, cor e valor da linha reta e dos retângulos formados. Concluímos na retrospectiva histórica da Arte vinculada à Matemática que, como contribuições, o presente artigo traz a análise da produção artística de Mondrian e um comparativo com uma obra cubista de Georges Braque. Também na linha de práticas interdisciplinares e analogias, essa aproximação entre História, Arte e Matemática subsidiou a construção da proposta de um projeto de ensino interdisciplinar bem delimitado, contextualizado, seguindo os preceitos de Fazenda (2002), que destaca a interdisciplinaridade como uma atitude diante do conhecimento expressa por diversas experiências e pensamentos. Uma vez que agrega o pensamento analógico, a pesquisa feita contribui criando mais condições para sentir e estabelecer relações entre formas de conhecimento, auxiliando na construção de significados, conforme Abdounur (2010). ReferênciasABDOUNUR, Oscar João. Analogias e construção de significados: as relações entre a Matemática e a Música. Com Ciência - Revista Eletrônica de Jornalismo Científico, São Paulo, v. 116, 2010. ALVES, Maira Leandra. Muito além do olhar: um enlace da Matemática com a Arte. 2007. Dissertação (Mestrado em Educação em Ciências e Matemática) – Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências de Matemática, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2007. BOIS, Yves-Alain; RUDENSTINE, Angelica Zander; JOOSTEN Joop; JANSSEN Hans. Piet Mondrian: 1872-1944. Boston:Little, Brown & Co, 1994. FAZENDA, Ivani Catarina Arantes. Dicionário em construção: interdisciplinaridade.2ª ed. São Paulo: Cortez, 2002. JOOSTEN, Joop; WELSH, Robert. Piet Mondrian: catalogue raisonné. Nova York: New York Abrams, 1998. LIMA, Valderez Marina do Rosário; RAMOS, Maurivan Güntzel. Percepções de interdisciplinaridade de professores de Ciências e Matemática: um exercício de análise textual discursiva. Revista Lusófona de Educação, Campo Grande, v. 36, nº 36, p. 1-15, 2017. MONDRIAN, Piet. La nueva imagen en la pintura: Alice Pells. Colección de Arquilectura, 9. Madrid: Colegio Oficial del Aparejadores Técnicos de Madrid, 1983. ______. Neoplasticismo na pintura e na arquitetura: Piet Mondrian. Organização de Carlos A. Ferreira Martins. Prefácio de Carlos Leite Brandão. Trad. João Carlos Pijnappel. São Paulo: Cosac Naify, 2008. STANGOS, Nikos. Conceitos de Arte Moderna.Trad. Álvaro Cabral. 2ª ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1991. TJABBES, Pieter. Catálogo da exposição "Mondrian e o movimento De Stijl". Organização: Art Unlimited. São Paulo, Brasília, Belo Horizonte, Rio de Janeiro: Centro Cultural Banco do Brasil, 2015. Disponível em: https://www.bb.com.br/docs/portal/ccbb/CCBBEducativoMondrianeoMovimentodeStijl.pdf. Acesso em: 19 nov. 2020. ZALESKI FILHO, Dirceu. Matemática e Arte. Belo Horizonte: Autêntica, 2013. Coleção Tendências em Educação Matemática. ______. Arte e Matemática em Mondrian. 2009. Este artigo e os seus comentários não refletem necessariamente a opinião da revista Educação Pública ou da Fundação Cecierj. Quem foi Piet Mondrian e qual a importância do seu trabalho para a arte?Piet Mondrian (1872-1944) foi um artista holandês de destaque no movimento modernista europeu no início do século XX. Responsável por um trabalho no qual buscava refletir as leis matemáticas universais, seu nome está relacionado à corrente da arte denominada neoplasticismo.
Como Piet Mondrian influenciou o mundo da arte?O estilo peculiar de Mondrian em utilizar figuras geométricas abstratas coloridas, influenciou o desenvolvimento do Modernismo e do Minimalismo na arte. Ele também teve uma influência substancial muito além do mundo da arte. Em 1965, Yves Saint Laurent criou vestidos ao estilo Mondrian para sua coleção de outono.
Qual é o papel do artista para Mondrian?Segundo Mondrian, cada coisa, seja uma casa, seja uma árvore ou uma paisagem, possui uma essência que está por trás de sua aparência. E as coisas, em sua essência, estão em harmonia no universo. O papel do artista, para ele, seria revelar essa essência oculta e essa harmonia universal.
Quais as principais características das obras de Mondrian e quais suas inspirações?No inicio suas obras retratavam paisagens sombrias, com ênfase nas cores acinzentadas, mais tarde começou a experimentar cores brilhantes e logo adotou o cubismo como forma de representação, porém esse ainda não era o estilo que o artista se consolidaria, algum tempo depois, começou a vislumbrar o estilo abstrato e foi ...
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