1.Desconsideração da Personalidade Jurídica na Falência. Show
1.1.Requisitos da Desconsideração da Personalidade Jurídica. Antes de adentrar no debate sobre a aplicação da desconsideração da personalidade na falência, torna-se necessário abordar sobre os requisitos da desconsideração da personalidade jurídica, levando em consideração, inclusive, os aspectos processuais e modo de sua aplicação. O instrumento da desconsideração da personalidade jurídica é utilizado para coibir fraudes a terceiros. Segundo FÁBIO ULHOA COELHO: "O objetivo da teoria da desconsideração da personalidade jurídica é exatamente possibilitar a coibição de fraude, sem comprometer o próprio instituto da pessoa jurídica, isto é, sem questionar a regra da separação de sua personalidade e patrimônio em relação a seus membros. Em outros termos, a teoria tem o intuito de preservar a pessoa jurídica e sua autonomia [....], sem deixar ao desabrigo terceiros vítimas de fraude". Ou seja, a desconsideração da personalidade jurídica não pode ser vista em oposição ao princípio da autonomia da separação patrimonial da pessoa jurídica, ao contrário disso, ela deve ser vista como o instrumento jurídico que serve para fortalecer o princípio da autonomia, mesmo porque o seu objetivo é evitar o abuso do direito e coibir fraude a terceiros de boa-fé. O requisito para a desconsideração da personalidade jurídica é o abuso da personalidade jurídica da empresa que acarrete a confusão patrimonial e o desvio da finalidade da sociedade empresária, isto é, se há confusão patrimonial que impossibilite a distinção e/ou a separação patrimonial tornar-se inviável a manutenção do princípio da autonomia da personalidade jurídico, posto que não faz mais sentido a separação patrimonial da pessoa jurídica, se ela na prática tornou-se inexistente. Para FABIO KONDER COMPARATO, o principal critério para a desconsideração da personalidade jurídica é "a confusão patrimonial entre o controlador e a sociedade controlada", isto porque, "em matéria empresarial, a pessoa jurídica nada mais é do que uma técnica de separação patrimonial". A teoria da desconsideração da personalidade jurídica permite que o Juiz não mais considere os efeitos da personificação ou da autonomia jurídica da sociedade para atingir e vincular a responsabilidade dos sócios, com o intuito de impedir a consumação de fraudes e abusos do direito cometidos por meio da personalidade jurídica que causem prejuízos ou danos a terceiros. Um ponto relevante sobre o tema envolvendo a desconsideração da personalidade jurídica, que não pode deixar de ser observado, consiste nas disposições relativas aos princípios constitucionais do devido processo legal, contraditório e da ampla defesa, isto significa dizer que, apesar de ser possível a desconsideração da personalidade jurídica de forma incidental, o sócio que será atingido com a medida judicial deve o direito ao contraditório e a ampla defesa. Enfim, uma vez presentes os requisitos autorizadores da desconsideração da personalidade jurídica (Art. 50 CC), diante da comprovação da confusão patrimonial ou desvio da finalidade e, desde que sejam respeitados os princípios constitucionais do devedor, a desconsideração da personalidade jurídica pode ser declarada de forma incidente ao processo. 1.2.A Aplicação da Desconsideração da Personalidade Jurídica na Falência. Os tribunais pátrios têm admitido amplamente a desconsideração da personalidade jurídica nos processos falimentares. Seguem abaixo alguns julgados:
(Voto No. 14.933 do ilustre Professor e Desembargador, Manoel Pereira Calças, no Agravo de Instrumento No. 563.612.4/4-00)
Verifica-se que a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica é admitida, a fim de permitir a arrecadação de determinados bens desviados de forma fraudulenta da sociedade falida, bem como, nos casos em que a confusão patrimonial não permite a distinção dos bens particulares dos sócios com os bens da sociedade falida, em função da promiscuidade das relações jurídicas havidas entre os sócios e a sociedade falida. Segundo DIVA CARVALHO DE AQUINO [01]: "A desconsideração da personalidade jurídica não deverá ser utilizada para apuração de responsabilidade dos sócios para o que há previsão expressa na lei falimentar" (Arts. 81 e 82 da LRF). Por ora, vislumbra-se que a desconsideração da personalidade jurídica é admissível no processo falimentar, uma vez preenchidos os requisitos legais (art. 50 do CC), podendo tal ato ser deferido de forma incidental no processo de falência, desde que sejam respeitados os princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório. E ainda, a ação de responsabilidade do art. 82 da LRF não pode ser confundida com a desconsideração da personalidade, isto porque, com a devida vênia a entendimentos contrários, na primeira hipótese não seria correto dizer que há extensão dos efeitos da falência, posto que, na verdade, ocorre apenas o dever de indenização, com o ressarcimento do prejuízo causado à massa falida, enquanto, na segunda hipótese (desconsideração da personalidade jurídica), há a extensão dos efeitos da falência para atingir os bens dos sócios. Nessa esteira, o jurista Carlos Henrique Abrão [02] entende que:
Adiante será feita relação entre a desconsideração da personalidade jurídica e a extensão dos efeitos da falência. 2.Extensão dos Efeitos da Falência. A Câmara Especial de Falências e Recuperações Judiciais do Tribunal de Justiça de São Paulo perfilha o entendimento de que, quando presentes os requisitos do artigo 50, do Código Civil, a declaração da desconsideração da personalidade jurídica de sociedade empresária falida tem como objetivo a extensão dos efeitos da falência às sociedades integrantes do mesmo grupo econômico, notadamente quando constituída pelos mesmos sócios, especialmente se ligados por laços familiares. Por outro lado, o Professor Paulo Fernando Campos Salles de Toledo [03] entende não ser possível a extensão dos efeitos da falência, em função dos seguintes motivos:
Ad Argumentandum, não há como concordar com a posição do ilustre professor Fernando Campos Salles de Toledo, diante da presença de sociedades empresárias distintas pertencentes ao mesmo grupo econômico, mas que, na verdade, constituem-se uma única pessoa jurídica, não sendo possível, na prática, saber onde termina o patrimônio de uma sociedade e começa o da outra. Nesta situação, se faz necessário a extensão dos efeitos da falência, proporcionando a arrecadação de todo o patrimônio do grupo econômico, especialmente, em vista da confusão patrimonial. Seguem adiante decisões do Superior Tribunal de Justiça, admitindo a extensão dos efeitos da falência a outras sociedades pertencentes ao mesmo grupo econômico, diante da presença da confusão patrimonial:
Isto posto, nos traz bastante simpatia a posição de DIVA CARVALHO DE AQUINO [04], no sentido de que: "há de se fazer distinção entre a desconsideração da personalidade jurídica, extensão dos efeitos da falência e a responsabilização por ato próprio.". Segue a referida autora dizendo ainda:
Observa-se que haverá situações em que a utilização de outros instrumentos jurídicos que não acarretem a extensão dos efeitos da falência (tais como, a ação de responsabilidade e a ação integralização) será suficiente para atingir os objetivos perseguidos pelos credores e recompor o patrimônio social da sociedade falida; porém, por vezes, a desconsideração da personalidade jurídica com a extensão dos efeitos da falência a outras sociedades será imprescindível, especialmente, quando a sociedade falida pertencer a grupo econômico de fato e/ou de direito que inviabilize a identificação do patrimônio de cada uma das sociedades, isto é, quando existir confusão patrimonial, decorrente do abuso da personalidade jurídica, necessariamente, deverá ser realizada a arrecadação de todos os bens das sociedades pertencentes do grupo econômico. 3.Conclusão Diante dos efeitos nefastos que a decretação da falência de uma sociedade empresária acarreta aos seus credores e a toda coletividade de uma maneira mais ampla, a desconsideração da personalidade jurídica, a fim de estender os efeitos da falência a outras sociedades deve ser aplicada com cautela, posto que, a falência não atinge apenas o devedor, mas a sociedade como um todo, razão pela qual ela deverá ser sempre precedida do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa [05]. BIBLIOGRAFIA - BEZERRA FILHO, Manoel Justino – Lei de Recuperação de Empresas e Falências Comentada. 6ª Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2009. - CAMPINHO, Sérgio. Falência e Recuperação de Empresas, Ed. Renovar, 2a edição, Rio de Janeiro. - COELHO, Fábio Ulhoa – Comentários à Lei de Falências e de Recuperação de Empresas. 7ª Ed. – São Paulo: Saraiva. 2010. - COELHO, Fábio Ulhoa – Curso de Direito Comercial. Vol. 3. 11ª Edição. São Paulo: Saraiva. 2010. - DINIZ, Maria Helena – Curso de Direito Civil Brasileiro, Vol 8 – 2ª Ed – São Paulo: Saraiva, 2009. - Enciclopédia Ibero-Americana. O Direito e a Justiça. Edição de Ernesto Garzon Valdez e Francisco J. Laporta. Editorial Trota. Pág. 154. - LUCCA, Newton de. Comentários à Nova Lei de Recuperação de Empresas e de Falências, Ed. Quartier Latin, São Paulo, 2005. _ PAIVA, Luiz Fernando Valente de (Coord). Direito Falimentar e a nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas – São Paulo: Quartier Latin, 2005.. - Revista da AASP No. 105. Setembro/2009. Ano XXIX. Notas
Qual o efeito da desconsideração da personalidade jurídica da sociedade?A desconsideração da personalidade jurídica é um instituto importante no Direito. As pessoas que criam uma sociedade não respondem pelas obrigações desta, geralmente. Isso ocorre porque essa pessoa jurídica possui personalidade distinta da de seus fundadores. Em outras palavras, há uma separação patrimonial.
Quais os efeitos da desconsideração da personalidade jurídica para a empresa?A consequência principal da despersonalização de pessoa jurídica é atingir o patrimônio dos sócios. Ainda que a dívida seja da empresa, eles serão responsáveis por satisfazê-la com seus recursos particulares.
Qual o efeito no processo principal do incidente de desconsideração da personalidade jurídica?Após a instauração do Incidente de desconsideração da personalidade jurídica, suspende-se o processo principal, com a devida citação do terceiro, seja ele o sócio ou a Pessoa Jurídica, que deverá se manifestar em 15 dias e requerer as provas cabíveis, obedecendo ao Princípio do contraditório e ampla defesa.
O que acontece quando a desconsideração da pessoa jurídica?A desconsideração da pessoa jurídica consiste na possibilidade de se ignorar a personalidade jurídica autônoma da entidade moral para chamar à responsabilidade seus sócios ou administradores, quando utilizam-na com objetivos fraudulentos ou diversos daqueles para os quais foi constituída.
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