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A Historiografia da Guerra do Paraguai sofreu mudanças profundas desde o desencadeamento do conflito. Durante e após a guerra, a historiografia dos países envolvidos, para muitos, limitou-se a explicar suas causas como devida apenas à ambição expansionista e desmedida de Solano López. Entretanto, desde o início da guerra houve forte movimento apontando o conflito como responsabilidade do Império do Brasil e da da Argentina Mitrista. Nesta leitura, descaram-se intelectuais federalistas argentinos e uruguaios, como Juan Bautista Alberdi.[1] No Uruguai, destacou-se a crítica de Luis Alberto de Herrera.[2] Esta literatura foi comumente - e segue sendo - desconhecida no Brasil. No Paraguai, foi também precoce e muito forte a resposta à historiografia de cunho liberal, que retomava as teses aliancistas sobre a guerra do Paraguai. Esta literatura se inseriu em contexto revisionista mais amplo sobre a história do país, com destaque para a valorização da ação do doutor José Gaspar de Francia como fundador do Paraguai independente. Entre os principais historiadores revisionistas destacam-se Cecílio Baez (1862-1941); Manuel Domínguez (1868-1935); Blas Garay (1873-1899) e, finalmente, Juan E. Leary (1879-1969), considerado como o iniciador da historiografia "lopizta positiva", ou seja, que explicava positivamente a guerra a partir da ação verdadeiramente prometeica de Francisco Solano López.[3] Também essa literatura foi e segue sendo fortemente ignorada no Brasil. Ela jamais abraçou a tese da Inglaterra como responsável pelo conflito.[4] Nos anos 1950, na Argentina, surgiu importante literatura de influência marxista, populista e americanista revisionista sobre a guerra do Paraguai, com destaque para autores como José María Rosa; Enrique Rivera e Milcíades Peña; Adolfo Saldías, Raúl Scalabrini Ortiz, também pouco estudada e raramente referida no Brasil. Não poucos entre esses autores negaramu radicalmente a tese da culpa inglesa no conflito, responsabilizando o Império e a Argentina mitrista, como no caso de Milcíades Peña e Enrique Rivera, em seu trabalho clássico. Milcíades Peña seria explícito: "“Ni la monarquía coronada brasileña ni la oligarquía mitrista hicieron la guerra del Paraguay por encargo de Inglaterra, [...].” [5] Paradoxalmente, também essa historiografia mantém-se desconhecida no Brasil. Atualmente, há esforço de leitura do conflito que supera as mitologias o lopizmo positivo e negativo.[6] Há uma intepretação que propõe, sem conhecer a historiografia assinalada, que, a partir dos anos 1960, uma segunda corrente historiográfica, mais comprometida com a luta ideológica contemporânea desta década entre o capitalismo e o comunismo, e direita e esquerda, apresentou a versão de que o conflito bélico teria sido motivado pelos interesses do Império Britânico que buscava a qualquer custo impedir a ascensão de uma nação latino-americana poderosa militarmente e econômica. A partir dos anos 1980, novos estudos propuseram razões diferentes, revelando que as causas se deveram aos processos de construção dos Estados nacionais dos países envolvidos. Historiografia tradicional (1864-1870)[editar | editar código-fonte]A historiografia tradicional,[7] também chamada de Oficial[8] e Ufanista,[9] surgiu imediatamente após o conflito e perdurou até o final da década de 1960. Tratava-se de uma visão simplista e exagerada[10] das causas da Guerra do Paraguai que teria ocorrido graças às ambições infinitas de um supostamente megalomaníaco e sanguinário Solano López que tinha por intenção criar o "Paraguai Maior" através da conquista de territórios dos países vizinhos. A reação dos Aliados teria ocorrido então numa tentativa desesperada de fazer prevalecer a "civilização" de países constitucionais e democráticos contra a "barbárie tirânica" do Paraguai governado por López.[9][11] Sua grande duração foi justificada pela obstinação de Pedro II de ver López derrotado por desprezá-lo ao considerá-lo mais um caudilho latino-americano[11][12] e consequentemente, seria necessário lavar a honra do Brasil. Também se alegou que a irritação do Imperador teria ocorrido após uma proposta de López para casar-se com a princesa Isabel, mas isto nunca ocorreu e trata-se de uma invenção posterior de um autor norte-americano.[13] Mais tarde, surgiria o culto oficial dos heróis da guerra tais como o Duque de Caxias, Tamandaré, Osório e Mitre.[9][12] Enquanto que no Paraguai, do fim da guerra até meados da década de 1930, López era visto também como um megalomaníaco que destruiu o país numa guerra desnecessária e fútil.[14][15] Era a opinião, por exemplo, de Gustavo Barroso:[16]
Historiografia revisionista (1968-1990)[editar | editar código-fonte]A chamada historiografia revisionista surgiu no final da década de 1960 e ganhou força durante a década de 1970-80. As origens remotas da mesma perduram do final do período monárquico do Brasil, quando os republicanos e militares insatisfeitos influenciados pelo Positivismo (como Benjamim Constant) realizaram ataques e críticas quanto a participação brasileira no conflito. Havia por detrás de tais acusações uma ideologia em comum entre os republicanos brasileiros, assim como argentinos e uruguaios, que tinham por objetivo desacreditar o regime monárquico ao considerá-lo o único culpado pelo desencadeamento da Guerra do Paraguai e das atrocidades cometidas.[15] Enquanto a partir da década de 1920, uma nova visão sobre a guerra surgiu no Paraguai graças aos esforços dos ditadores que buscavam uma legitimidade para seus governos autoritários ao apresentar um modelo anterior representados por Francia, Carlos López e Solano López.[14] O revisionismo histórico da Guerra do Paraguai recebeu impulso de fato em 1968 a publicação da obra "A Guerra do Paraguai – Grande negócio!" do escritor Leon Pomer onde alegou que a guerra ocorreu por interesse único da Grã-Bretanha[7] (posteriormente, reconheceu não ter sido a Grã-Bretanha que "desencadeou" a guerra).[9] Na obra, em tantas outras publicadas no período, o Paraguai é apresentado como um país socialista e igualitário, além de extremamente moderno, rico e poderoso. Seu governante, Solano López, seria uma espécie de líder visionário, antiimperialista e socialista que buscava tornar seu país livre das influências imperialistas estrangeiras. A Grã-Bretanha, supostamente receosa deste modelo autônomo e temendo que pudesse vir a servir de exemplo para os países vizinhos, tratou de ordenar que o Brasil, Argentina e Uruguai, simples "marionetes", destruíssem o Paraguai, exterminando praticamente toda a população paraguaia conseqüentemente.[7] [9][11][14][17][18] Defendendo a versão revisionista, discorre Júlio José Chiavenato:[19]
Em sentido semelhante, o historiador Eric Hobsbawm[20] defende que:
Tal visão, hoje considerada simplista e sem embasamento empírico, tornou-se difundida a partir da década de 1960 por diferentes escolas de historiadores, das mais diversas nacionalidades e vertentes.[21] Entre os ligados à esquerda marxista, havia o interesse em transformar o Paraguai de Solano López numa espécie de precursor do regime comunista de Cuba. Conforme o revisionismo adotado por esses historiadores, Solano López pretendia implementar no Paraguai um regime nacionalista autônomo, oposto ao grande império de sua época, no caso a Grã-Bretanha, de maneira análoga à oposição feita por Cuba aos EUA após a ascensão de Fidel Castro. Também havia a intenção, por parte desses historiadores, de prejudicar a imagem dos heróis da guerra cultuados pelos regimes ditatoriais militares de então que os perseguiam.[9][22] Entretanto, os marxistas não foram os únicos a encamparem tal interpretação. O reforço do suposto heroísmo de Solano López serviu também àqueles ligados à direita nacionalista.[21] Dentre esses últimos, destaca-se o próprio ditador Alfredo Stroessner, que chegou a patrocinar a filmagem do épico "Cerro Corá", com o objetivo de reforçar a imagem de Francisco Solano López como mártir paraguaio.[23] Essa visão revisionista, que ainda é ensinada na maior parte das escolas dos países latino-americanos, carece de qualquer tipo de provas concretas, dados ou evidências empíricas.[9][11][14][17][18] Contudo, os efeitos da visão historiográfica revisionista do conflito foram impactantes, pois diversas gerações de latino-americanos (principalmente brasileiros, argentinos e uruguaios) vieram a observar seu passado de uma forma pessimista e a desprezarem os vultos históricos de seus países.[7] Tais efeitos foram sentidos sobretudo no Paraguai, onde, conforme anteriormente ressaltado, a versão revisionista foi assumida como doutrina oficial de Estado, ainda mais depois da transformação de Solano López em herói sem defeitos.[9][14] O historiador Francisco Doratioto esclarece o tema:[24]
Historiografia moderna (1990-)[editar | editar código-fonte]Disputas territoriais na região platina (1864). Em 1990, o historiador Ricardo Salles publicou a obra Guerra do Paraguai: Escravidão e Cidadania na Formação do Exército onde apresentou uma análise sobre a historiografia tradicional e revisionista: "Se os estudos tradicionais sobre a guerra pecam por um excesso de oficialismo e factualismo, por sua vez, as versões revisionistas da história do conflito tendem a simplificações nem sempre embasadas em investigações mais profundas".[25] Esta obra foi uma das primeiras de uma nova geração de historiadores que buscavam analisar a Guerra do Paraguai.[26][27] Os estudos realizados por estes profissionais revelaram que as causas do conflito não foram em razão de influência externa ou por uma pura e simples ambição de um único homem. Mas sim, uma série de fatores relacionados a formação como Estados-nações dos países participantes e dos processos geopolíticos e econômicos da região, resultante de heranças históricas, políticas e geográficas de duas culturas diferentes: portuguesa e espanhola.[11][28][29][30][31] O historiador Francisco Doratioto apresenta de maneira concisa esta nova visão sobre as causas do conflito:
Esta última corrente historiográfica é a que está sendo levada em conta pelos livros e obras mais recentes que tratam do assunto. Tal fato é proveniente do fato de que ao contrário das duas correntes anteriores não se trata de um estudo baseado somente em ideologias ou patriotismo, mas de um trabalho científico. Bibliografia[editar | editar código-fonte]Historiografia tradicional[editar | editar código-fonte]
Historiografia revisionista[editar | editar código-fonte]
Historiografia moderna[editar | editar código-fonte]
Notas
Quais são as diferentes visões dos historiadores sobre o acontecimento da Guerra do Paraguai?A guerra era vista por diferentes ópticas: para Solano López era a oportunidade de colocar seu país como potência regional e ter acesso ao mar pelo porto de Montevidéu, graças a aliança com os blancos uruguaios e os federalistas argentinos, representados por Urquiza; para Bartolomeu Mitre era a forma de consolidar o ...
Quais foram as causas que levaram ao conflito Guerra do Paraguai?Maior conflito da América do Sul, a Guerra do Paraguai (1864-1870) teve como causas desavenças políticas, econômicas e territoriais entre as nações da bacia platina. A Guerra do Paraguai foi o maior confronto da história da América do Sul e foi travado desde finais de 1864 até 1870.
Como os historiadores avaliam a participação do Brasil na Guerra do Paraguai?1 Em 1864, o Brasil invade o Uruguai para afastar do poder o setor blanco radical. Esse grupo convence o Paraguai de que os brasileiros iriam voltar-se contra sua soberania. 2 O exército paraguaio invade o Mato Grosso, em 1864, e a província argentina de Corrientes, em 1865, iniciando a guerra.
Quais foram as causas que levaram a Guerra do Paraguai Brainly?A principal causa da guerra está relacionada às tentativas do governo do ditador paraguaio, Francisco Solano López, de colocar em prática uma política expansionista, com o objetivo de ampliar o território do seu país, apossando-se de terras dos países vizinhos, e ter acesso ao mar pelo porto de Montevideu.
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