O fim do regime comunista URSS e a Perestroika Glasnost

"Mikhail Sergeevich Gorbachev morreu nesta noite após uma severa e prolongada doença", afirmou o Hospital Central de Clínicas de Moscovo, segundo a agência RIA.

Gorbachev que lutava há vários anos com uma doença, foi o último presidente da União Soviética e ficou associado ao fim da Guerra Fria, à reforma (perestroika) e à abertura (glasnost) do então regime soviético.

Na segunda metade dos anos 1980, as palavras glasnost e perestroika entraram no léxico dos países ocidentais. O responsável, do outro lado da cortina de ferro, foi Mikhail Sergeyevich Gorbachev, primeiro como secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética (PCUS) de 1985 a 1991 e por fim como (único) presidente da União Soviética, em 1990-1991. Tendo como pano de fundo uma economia disfuncional, o seu destino político ficou traçado após um golpe da ala conservadora e a reação dos reformistas pró-liberais, encabeçada por Boris Ieltsin.

Quando, em março de 1985, Gorbachev ascende a secretário-geral do PCUS e, em consequência, à liderança da União Soviética, o maior país do mundo em superfície e rival ideológico dos Estados Unidos atravessava uma crise em vários níveis. O longo reinado de Leonid Brejnev (1964-1982) deixou o país estagnado e com uma guerra em curso no Afeganistão. Os senhores que se seguiram, Yury Andropov e Konstantin Chernenko, estavam tão doentes quanto o país.

Em comparação com os antecessores, Gorbachev era bem mais jovem (54 anos) e tinha um programa. O seu principal objetivo interno era pôr de pé a economia soviética, pelo que quis instaurar uma modernização tecnológica e um aumento da produtividade dos trabalhadores, e em paralelo aligeirar a burocracia.

Sob a sua nova política de glasnost ("transparência"), as liberdades de expressão e de informação foram expandidas e a herança do totalitarismo estalinista foi repudiada pelo governo.

"Sistema insustentável"

Em abril de 1986 viu-se a braços com o desastre nuclear de Chernobyl. Em artigo escrito 20 anos depois, Gorbachev nega tê-lo ocultado à comunidade internacional, apesar de as autoridades soviéticas só terem reconhecido o acidente dois dias depois, e após pressão das autoridades suecas.

Segundo o antigo líder soviético, só um dia e meio depois é que o Kremlin tomou conhecimento, e sem pormenores, do sucedido na Ucrânia. "Mais do que o meu lançamento da perestroika, foi talvez a principal causa do colapso da União Soviética, cinco anos mais tarde. Na verdade, a catástrofe de Chernobyl foi um ponto de viragem histórico: houve a era anterior à catástrofe, e há a era muito diferente que se seguiu", escreveu. "Mais do que qualquer outra coisa, abriu a possibilidade de uma liberdade de expressão muito maior na União Soviética, ao ponto de o sistema, tal como o conhecíamos, se ter tornado insustentável. A experiência demonstrou claramente como era importante prosseguir a política da glasnost", concluiu.

Insatisfeito com a ausência de resultados, deu início em 1987 a reformas mais profundas do sistema económico e político soviético. Sob a política da perestroika ("reestruturação"), foram realizadas as primeiras tentativas para democratizar o sistema político soviético com a introdução de eleições com vários candidatos para cargos partidários e governamentais, bem como o voto secreto.

As reformas da perestroika ao nível da economia enfrentaram resistência por parte dos burocratas do PCUS e do regime, que não queriam ceder o seu controlo da atividade económica do país.

Em 1988, Gorbachev remodela os poderes legislativo e executivo do governo de modo a acabar com a exclusividade do PCUS: no novo parlamento bicamaral chamado Congresso dos Deputados do Povo da URSS alguns dos representantes passaram a ser eleitos diretamente pelo povo em eleições com vários candidatos. Em 1989, o recém-eleito Congresso dos Deputados do Povo elegeu entre as suas fileiras um novo Soviete Supremo da URSS que, ao contrário do antecessor, tinha poderes legislativos. Gorbachev foi eleito presidente do Soviete Supremo, mantendo a presidência nacional.

Do kolkhoz para o Politburo

Filho de camponeses, Mikhail Gorbachev nasceu em 2 de março de 1931 na aldeia de Privolnoye, na região de Stavropol, no Cáucaso do Norte. Com 15 anos aderiu à Komsomol (Juventude Comunista) e durante os quatro anos seguintes conduziu uma ceifeira-debulhadora num kolkhoz (quinta coletiva) em Stavropol.

Em 1952 entrou na Faculdade de Direito em Moscovo e tornou-se membro do Partido Comunista. Depois de se ter formado na universidade, em 1955, passou a ocupar vários cargos na Komsomol e em organizações partidárias em Stavropol, tornando-se primeiro secretário do comité do partido em 1970. Ou seja, desde esse ano e até 1978 dirigiu essa região do sul da Rússia.

Nomeado membro do Comité Central do Partido Comunista da União Soviética em 1971, foi nomeado secretário do partido para a agricultura em 1978. Dois anos depois tornou-se o membro mais novo do Politburo.

Desde o início das suas funções enquanto secretário-geral do PCUS que Gorbachev quis marcar a diferença também na política externa, ao cultivar boas relações com Margaret Thatcher, Ronald Reagan ou Helmut Kohl. Em janeiro de 1986 fez uma declaração em que propôs a redução dos armamentos e o fim das armas nucleares até ao ano 2000. Meses depois dá-se um encontro histórico com o presidente dos Estados Unidos Ronald Reagan, em Reiquejavique, que será culminado, em dezembro de 1987, com a assinatura de um acordo para a destruição dos arsenais de mísseis de médio alcance com ogivas nucleares.

A partir de 1988 reconhece que a guerra no Afeganistão não tem solução militar e inicia a retirada das tropas soviéticas, o que se concretiza no ano seguinte.

Europa de Leste liberta-se

O degelo provocado pela perestroika repercutiu-se numa série de eventos na viragem da década. Em 1989, expressou apoio aos comunistas reformistas nos países do bloco soviético. À medida que as revoluções decorreram nos países de Leste, Gorbachev concordou com a retirada das tropas soviéticas, bem como com a reunificação da Alemanha. Em consequência, em 1990 Gorbachev recebeu o Prémio Nobel da Paz.

Mas paz foi coisa que não houve em várias repúblicas soviéticas, casos do conflito entre o Azerbaijão e a Arménia, na Geórgia, no Usbequistão, entre a Inguchétia e a Ossétia do Norte e a repressão das tropas soviéticas após a declaração da independência da Lituânia.

Em março de 1990, Gorbachev foi eleito pelo Congresso dos Deputados do Povo para o novo cargo de presidente da URSS, e em simultâneo abriu o caminho para a legalização de outros partidos políticos.

Mas a abertura política, além de dar combustível aos nacionalismos das várias repúblicas, não foi acompanhada de um plano alternativo no que respeita à economia estatal planificada, com esta a entrar em colapso, o que amplificou o descontentamento generalizado.

Em agosto de 1991, já com os três estados bálticos e a Geórgia em secessão, os comunistas de linha dura mantiveram Gorbachev e a sua família em prisão domiciliar, na Crimeia, enquanto em Moscovo se dá uma tentativa de golpe militar. Face às divisões entre as forças de segurança e os apoios das repúblicas, acaba por ser o presidente da Rússia, Boris Ieltsin, quem personifica a resistência ao putsch, ao subir para um tanque e condenar o plano.

Ultrapassado por Ieltsin

O destino de Gorbachev e da URSS ficaram traçados. O plano de Gorbachev de reformular a União Soviética através de um tratado de estados soberanos - ligados por um presidente, um exército e uma política externa - redundou em fracasso, com Ieltsin e a Rússia a assumirem o controlo e a liderarem a Comunidade de Estados Independentes, com o apoio da Bielorrússia e da Ucrânia. "O pior erro estratégico", lamentou, mas que aceitou para não transformar a crise numa guerra, explicou anos depois. Em 25 de dezembro de 1991, Gorbachev renunciou à presidência da União Soviética, que deixou de existir nesse mesmo dia.

Esta é a grande mágoa deste homem filho de pai russo, mãe ucraniana e que foi casado com uma ucraniana, Raisa. "Lutei o melhor que pude para manter a União, mas falhei", disse em entrevista à RT quando fez 80 anos.

Em 1996, com a memória ainda fresca da penúria e do colapso económico dos anos do fim da URSS, os eleitores escolheram Ieltsin e ignoraram Gorbachev nas eleições presidenciais da Rússia, ao atribuírem-lhe menos de 1% dos votos - embora o ex-líder soviético considerasse ter recebido mais votos e que as únicas eleições justas e livres decorreram entre 1989 e 1991.

Através dos seus livros, da sua fundação ou a convite de think tanks, Gorbachev continuou a ser ouvido, embora num estado de saúde cada vez mais fragilizado e que o levaram a várias hospitalizações depois de ter dobrado os 80 anos.

Pela Crimeia russa, contra a corrida ao armamento

Crítico do papel da NATO, concordou com Donald Trump quando este disse que a Aliança Atlântica é obsoleta. Ressentido com a promessa quebrada do secretário de Estado norte-americano James Baker de que a NATO não expandiria "nem mais um centímetro" para leste depois da reunificação alemã, contra a intervenção militar no Kosovo sem mandato da ONU, Gorbachev acabou por aplaudir a anexação da Crimeia, em 2014, por Vladimir Putin.

O líder russo foi também alvo, várias vezes, dos seus reparos. Um deles é o papel de Putin no estabelecimento de uma nova guerra fria e de uma nova corrida aos armamentos, e em particular ao nuclear. Em outubro de 2019 puxou dos galões na sequência de os EUA terem acusado Moscovo de desrespeitar o Tratado das Forças Nucleares de Alcance Intermédio e retirado do acordo. "Há tendências perigosas - estão à vista de todos. Gostaria de destacar duas: o desrespeito pelo direito internacional e a militarização da política mundial. Acontece que este tratado era o pilar mais importante da estabilidade estratégica. Precisamos de conversações para que a sua destruição não agrave a ameaça de guerra", escreveu Gorbachev.

O homem que nos anos finais da vida se definiu como social-democrata mostrou-se um admirador dos escritos tardios de Lenine, reformista em vez de revolucionário, e afirmou no livro The New Russia que os soviéticos nunca conheceram o socialismo. "Os valores que enformam o socialismo são tão relevantes hoje como ontem."

Como irá ser conhecido o homem que implodiu um império? "No final, a história fará o justo julgamento. Acredito firmemente que o meu trabalho e os meus esforços não foram em vão", disse em entrevista à Der Spiegel.

O que foi a Perestroika e Glasnost que ocorreu na antiga URSS?

Perestroika e Glasnost: as reformas da URSS que iniciaram uma nova ordem mundial. Perestroika significa reconstrução e consistia na tentativa de recuperação soviética; enquanto que Glasnost significa transparência e visava à liberdade de expressão da sociedade.

O que a Glasnost tem a ver com o fim da URSS?

A Glasnost contribuiu em grande parte para a intensificação do clima de instabilidade causado por agitações nacionalistas, conflitos étnicos e regionais e insatisfação econômica, fatores que levaram ao colapso da URSS.

Como ocorreu o fim do comunismo?

As Revoluções de 1989, Outono das Nações, colapso do comunismo, Revoluções do Leste Europeu ou queda do comunismo foram uma onda revolucionária que varreu a Europa Central e Oriental no final de 1989, terminando na derrubada do modelo soviético dos Estados comunistas no espaço de poucos meses.

Quais motivos foram determinantes para o fim da URSS?

O autoritarismo, com a censura à imprensa e as mais diversas formas de manifestações populares; Controle da Igreja e demais religiões; Enfraquecimento da disciplina do Partido Comunista devido à divisão ideológica; Guerra Fria e a pressão do Ocidente.