Conferência de Berlim e a partilha de África pdf

 A Conferência de Berlim aconteceu entre novembro de 1884 e fevereiro de 1885 e delimitou regras e acordos durante a ocupação do continente africano pelas potências europeias. Conhecido também como partilha da África, esse evento oficializou o neocolonialismo que resultou na extensa exploração econômica de colônias africanas pelos países europeus.

Neocolonialismo e a Segunda Revolução Industrial

A Conferência de Berlim foi resultado do surto neocolonialista que surgiu a partir da segunda metade do século XIX. A Europa estava experimentando um grande desenvolvimento tecnológico conhecido como Segunda Revolução Industrial. Esse crescimento tecnológico promoveu avanços na produção de energia, na química e no desenvolvimento de meios de transporte mais eficientes etc.

À medida que o capitalismo sofria transformações a partir desse desenvolvimento tecnológico, surgiu como necessidade o impulso imperialista para dar continuidade no processo exploratório de matérias-primas e de obtenção de novos mercados consumidores. Os continentes africano e asiático apareceram, então, como alvo da ambição das potências industrializadas europeias.

O impulso neocolonialista no continente africano, segundo Valter Roberto Silvério, foi acirrado pelas ações de três países. Primeiramente, houve o interesse dos belgas, com o rei Leopoldo I, em uma região da África chamada Congo (atual República Democrática do Congo). Esse projeto do rei belga continuou com seu filho, Leopoldo II, que manteve um dos domínios imperialistas mais cruéis e que foi responsável pela morte de milhões de habitantes do Congo.

O segundo impulso foi dado por Portugal ao anexar regiões do interior de Moçambique. Posteriormente, Portugal defendeu a ideia do “mapa cor-de-rosa”, que estipulava a unificação territorial entre dois domínios portugueses (Moçambique e Angola). Por fim, a política expansionista francesa também contribuiu para que ocorresse uma corrida de ocupação do continente africano.

Os países europeus buscaram de maneira desenfreada tomar posse do máximo possível de territórios no continente africano. A falta de regulamentação dessa ocupação levou a inúmeros atritos diplomáticos entre esses países da Europa por disputas territoriais na África. Com o intuito de resolver essas questões, foi sugerida uma conferência internacional.

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Conferência de Berlim

A Conferência de Berlim foi inicialmente idealizada por Portugal, porém, os alemães realizaram-na entre novembro de 1884 e fevereiro de 1885, sob a liderança do chanceler alemão, Otto von Bismarck. Esse evento reuniu catorze potências da época com intuito de debater a ocupação da África.

Inicialmente, foi proposto por Portugal o “mapa cor-de-rosa” que sugeria a criação de um domínio que unificasse, de leste a oeste, dois territórios portugueses: Angola e Moçambique. A proposta foi prontamente rejeitada pelo Reino Unido, que pressionou Portugal a abandonar essa ideia (o que de fato aconteceu).

Além disso, foi debatida durante essas reuniões a questão do domínio de determinadas regiões do Congo ocupadas pelos belgas. A Conferência de Berlim também determinou que os rios Níger e Congo seriam de livre navegação, ou seja, estavam abertos a todos os países. Por fim, foram determinados, em parte, os territórios que seriam ocupados e divididos na África da forma que melhor agradasse as potências industrializadas.

Justificativas para a ocupação e resistência

A ocupação do continente africano foi realizada sob a justificativa de missão civilizatória que propunha acabar com a escravidão (ainda existente em partes da África). Além disso, as potências justificavam que, a partir da ocupação do continente, seria possível levar o cristianismo e também as “benesses” da civilização ocidental às populações. Naturalmente, todas essas justificativas eram utilizadas como pretexto para mascarar o real interesse: impor uma exploração econômica intensa sobre a África.

A ocupação do continente não aconteceu de maneira passiva. Houve movimentos de resistência em diferentes partes da África, no entanto, em razão da diferença de organização militar e de tecnologia, a resistência africana, em geral, teve apenas efeito de retardar o domínio europeu.


Por Daniel Neves
Graduado em História

Um novo conceito de ocupação 
No dia 15 de novembro de 1884, representantes de 14 países reuniram-se em Berlim na Conferência Internacional Africana. Sentados a uma mesma mesa, com o mapa do continente africano reproduzido em 5 metros de comprimento e afixado na parede, estes homens definiram os princípios que deveriam regular os direitos de navegação nos grandes cursos de água africanos e a partilha do continente em esferas de influência. Os novos princípios – verdadeiramente, um novo direito público colonial – privilegiavam a noção de ocupação territorial efetiva, em detrimento dos direitos históricos tradicionais.

À volta da mesa…

Estados com interesses diretos nos problemas relativos à partilha de África:

  • Reino Unido
  • França
  • Alemanha
  • Bélgica
  • “Associação Internacional do Congo”
  • Holanda

A correspondência guardada pelo Arquivo Histórico Diplomático permite ficar a saber que no dia 16 de outubro de 1884, José Vicente Barbosa du Bocage, ministro dos Negócios Estrangeiros, recebe um telegrama cifrado da legação de Portugal nos Países Baixos referindo:
“A Holanda comunicou já a Belim que aceita convite para a Conferência”

Estados relevantes com colónias mas sem interesses diretos na partilha de África:

  • Império Austro-Húngaro
  • Dinamarca
  • Itália
  • Espanha
  • Rússia
  • Suécia
  • Império Otomano
  • Estados Unidos.

A delegação Portuguesa:
António Serpa Pimentel, António José da Serra Gomes (Marquês de Penafiel) Luciano Cordeiro, Carlos Roma du Bocage (adido militar, filho de Barbosa du Bocage), José P. Ferreira (adido) e Manuel de Sousa Coutinho (segundo secretário, os três últimos como secretários.

Na ata geral redigida no final da reunião com o nome dos representantes dos países pode ler-se:

“S. M. Rei de Portugal e de Algarves etc.: Da Serra Gomes, Marquês de Penafiel, Par do Reino, seu Enviado Extraordinário e Ministro Plenipotenciário junto a S. M. Imperador da Alemanha, Rei da Prússia; e António de Serpa Pimentel, Conselheiro de Estado e Par do Reino”.

Conferência de Berlim

O convite de Paris e Berlim a Portugal
A Conferência de Berlim foi proposta pelo chanceler alemão Otto von Bismarck. A formalização do convite dos governos de Paris e Berlim a Portugal para participar na Conferência de Berlim é feito no dia 12 de outubro de 1884, em carta enviada pelo ministro da Alemanha, em Lisboa, Schmidshals, dirigida ao ministro José Vicente Barbosa du Bocage.

A ordem de trabalhos para um acordo

“Liberdade de comercio na bacia e nas embocaduras do Congo;

Aplicação ao Congo e ao Níger dos princípios adotados pelo congresso de Viena, no intuito de consagrar a liberdade de navegação em vários rios internacionais, princípios aplicados mais tarde ao Danúbio; 

E definição das formalidades a observar para que as novas ocupações nas costas d’Africa sejam consideradas efetivas”.

A resposta portuguesa ao convite é transmitida no dia 15 de outubro pelo ministro dos Negócios Externos. Nessa carta, Portugal aceita os termos do convite formulado e aproveita para esclarecer, caso dúvidas houvesse, que Portugal já havia manifestado a intenção de admitir o princípio da liberdade de comércio e navegação na bacia e embocaduras do Zaire, quando estabelecesse uma administração regular nos territórios compreendidos na costa ocidental de África, entre o 5º grau e 12 minutos e o 8º grau de latitude meridional e por conseguinte aos territórios de Molembo, Cabinda e Ambriz.  Aliás, esta pretensão constava de um documento elaborado pelo Visconde de Santarém, em 1885, sobre os direitos que a Coroa tem aqueles territórios e que se se encontra disponível da Biblioteca Nacional da Torre do Tombo.

Otto von Bismarck

O encontro de que se falava…
A reunião foi o resultado de uma complexa negociação de bastidores e de muita diplomacia. A correspondência entre as embaixadas portuguesas atesta isso mesmo. Apesar da oficialização do encontro ter sido feita em outubro, já em julho, através da troca de correspondência do ministério dos Exteriores é possível verificar que há muito se considerava a possibilidade de fazer a Conferência. Uma carta enviada pelo embaixador português, em França, ao ministro dos Negócios Estrangeiros, Barbosa du Bocage revela isso mesmo.

A ação diplomática Portugal/França
Nesta carta, o embaixador português em França informa ter feito sentir o seu lamento pela Inglaterra ter abandonado o Tratado do Zaire e chama a atenção para os “inconvenientes do estado anárquico em que se  acham as regiões do Baixo Congo, inconvenientes que se podiam evitar entregando a Portugal aquelas regiões a que tinham antigos direitos e cuja soberania há muitos anos reclamava”. Acrescentava o embaixador ter encontrado da parte do governo francês alguma simpatia pela causa portuguesa, mediantes eventuais contrapartidas.

A ação diplomática Portugal/Inglaterra

  • No dia 12 de julho, Miguel José Dantas, embaixador de Portugal em Londres, seguindo instruções de Lisboa informa ter pedido esclarecimentos a Lord Granville sobre se o governo inglês tinha sido consultado e o que tinha respondido à proposta feita pela Alemanha à França de realizar uma conferência sobre negócios no Congo. O governo francês teria respondido que concordava desde que a conferência se ocupasse exclusivamente da navegação do rio. Nessa mesma carta, o representante de Portugal em Londres já adiantava ter-se encontrado informalmente com o subsecretario de Estado e que este tinha garantido que o governo inglês não tinha recebido nenhuma comunicação.
  • Dez dias depois, Dantas volta a escrever a Lisboa para informar que não tem sido possível encontrar-se com Granville mas que imagina que ele também não queira pronunciar-se sobre a realização da conferência sem saber o que pensam Alemanha e França.

Portugal insiste…

  • A 22 de julho, Portugal pergunta à Inglaterra se pretende continuar a Associação Internacional Africana. Em concreto, Portugal pretende ser informado sobre os atos levados a efeito contra os chefes de Boma e a utilização de trabalho escravo.
  • A 31 de julho, faz novamente a mesma pergunta. Numa extensa carta Barbosa du Bocage pede a Miguel José Dantas para explicar mais uma vez ao governo inglês as “tentativas da Associação Internacional para adquirir por intimidação e fraude direitos de soberania em territórios de que temos sempre reclamado o domínio incontestável”.

Outras frentes diplomáticas
Documentos do Arquivo Histórico Diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros dão conta de uma verdadeira “tormenta” diplomática de contactos, cartas e telegramas trocados na altura entre o ministério dos Negócios Externos liderado por José Vicente Barbosa du Bocage e as legações portuguesas.

Por exemplo, a 24 de outubro de 1884, a legação de Bruxelas escrevia referindo que o plenipotenciário belga, Barão Lambermont estava a apressar os preparativos “receando muito que se chegar decisão telegráfica da América, Bismark exija convocação imediata da conferência”. Na mesma missiva o responsável da legação refere ainda que o Barão lhe confessou “o quanto o amedronta ir afrontar o colosso Bismark”.

E de acordo com carta enviada a 9 de novembro de 1884, pela legação de Bruxelas ao governo português, acusando a informação transmitida por Lisboa sobre a realização da conferência em Berlim, “nem mesmo o anúncio de tal conferência fez parar as movimentações do rei Leopoldo”.

As decisões da Conferência de Berlim 
A conferência terminou no dia 26 de Fevereiro de 1885, com os 19 representantes plenipotenciários dos 14 países presentes à Conferência a assinarem o seu Ato Geral, composto de 4 declarações, 2 atos de navegação, 7 capítulos e 38 artigos.

Ato Geral foi publicado em março, juntamente com a Convenção de Reconhecimento dos Limites de Ação da Associação Internacional Africana e o Livro das Propostas e Projetos, discutidos durante o encontro.

Os países presentes acordaram o seguinte:

  • A liberdade de comércio em toda a bacia do Congo e os seus afluentes
  • A aplicação dos princípios do Congresso de Viena quanto à navegação nos rios internacionais, entre outros o Níger e o Congo
  • A definição de regras uniformes nas relações internacionais relativamente às ocupações que poderão realizar-se no futuro nas costas do continente africano
  • Proibição do tráfico de escravos e a neutralidade dos territórios compreendidos na bacia convencional do Congo.

A questão mais relevante para Portugal foi a que constou do capítulo VI do Acto Geral de Berlim com dois artigos e que definiu as condições essenciais para que as novas ocupações na costa do continente africano fossem consideradas efetivas.

No artigo 34º referia-se o seguinte:

“A potência que de agora em diante tomar posse de um território nas costas do continente africano situado fora das suas possessões atuais, ou que, não os tendo tido até então, vier a adquirir algum, e no mesmo caso a Potência que aí assumir um protectorado, fará acompanhar a Ata respectiva de uma notificação dirigida às outras Potências signatárias da presente Ata, a fim de lhes dar os meios de fazer valer, se for oportuno, suas reclamações.”

No artigo 35º acrescentava-se o seguinte:

“As Potências signatárias da presente Ata reconhecem a obrigação de assegurar, nos territórios ocupados por elas, nas costas do Continente africano, a existência de única autoridade capaz de fazer respeitar os direitos adquiridos e, eventualmente, a liberdade do comércio e do trânsito nas condições em que for estipulada”.

Um acordo favorável a Portugal?

  • Na Conferência nada ficou definido sobre as antigas ocupações, nem tão pouco sobre os territórios do interior (estratégia de expansão que Portugal seguiu a partir de 1877 com as expedições de Serpa Pinto, Hermenegildo Capelo e Roberto Ivens). O artigo 34º estipulou apenas para o futuro e referiu-se unicamente aos territórios nas costas do continente africano.
  • Por outro lado, o novo conceito de direito internacional colonial baseado não no direito histórico da descoberta mas sim na ocupação de facto prejudicou Portugal que em muitos casos apenas dominava feitorias costeiras.
  • Na lógica de separação que vingou, Portugal foi obrigado a aceitar o direito de livre navegação nos rios (internacionais) Congo, Zambeze e Rovuma, deixou de ter o controlo da foz do Congo e ficou apenas com o enclave de Cabinda.

No pós Conferência de Berlim esta situação deu origem a várias discórdias, muitas delas envolvendo Portugal.

O que foi a Conferência de Berlim e a Partilha da África?

Encontro que levou a partilha da África A conferência de Berlim, realizada entre novembro de 1884 e fevereiro de 1885, foi convocada com o objetivo de organizar os projetos de exploração e ocupação do continente africano pelas grandes potências europeias.

Qual foi o objetivo principal da Conferência de Berlim?

O principal objetivo da conferência era o de coordenar os diversos projetos de exploração e ocupação do continente africano, prevenindo conflitos ou tensões entre as várias potências.

Quem dividiu a África na Conferência de Berlim?

Representantes de 13 países da Europa, dos Estados Unidos da América e do Império Otomano deslocaram-se a Berlim a convite do chanceler alemão Otto von Bismarck para dividirem África entre si, "em conformidade com o direito internacional". Os africanos não foram convidados para a reunião.

Quais foram as consequências da Conferência de Berlim para a África?

As consequências da Conferência de Berlim A principal consequência, obviamente, foi a divisão do território africano entre os países integrantes. A liberdade comercial na bacia do congo e no rio Níger foi conquistada, bem assim a proibição da escravidão e do tráfico de pessoas.

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